Título: Leilões externos do BC funcionam
Autor: Lucchesi, Cristiane Perini
Fonte: Valor Econômico, 28/11/2008, Finanças, p. C1
Os quatro leilões de linhas externas em dólar realizados pelo Banco Central em um total de US$ 5,5 bilhões desde o dia 20 de outubro ajudaram a irrigar o mercado de crédito. O exportador pôde aproveitar a cotação mais alta da moeda americana na semana passada para vender, contribuindo para trazer o dólar de volta aos níveis de R$ 2,2810. No dia 21, o dólar foi a R$ 2,458, seu maior valor no ano, uma alta de 58% na comparação com o nível mínimo de R$ 1,559 de 1º de agosto.
Agora, os bancos já repassaram grande parte das linhas e esperam novos leilões. "A demanda represada por crédito dos exportadores foi atendida pelas linhas do Banco Central", diz José Guilherme Lembi de Faria, diretor-executivo do Bradesco. "Mas a oferta de crédito externo ainda está longe da normalidade e a atuação da autoridade monetária continua fundamental", afirma. Segundo ele, a demanda das empresas é por linhas de vencimento em um ano, pois o exportador não tem mais performance para entregar em linhas de vencimento mais curtas.
Lembi de Faria afirma que o Bradesco tem conseguido rolar cerca de 50% das suas linhas de crédito ao comércio exterior bilaterais no mercado, mas com prazos mais curtos e juros mais altos. O banco paga cerca de 150 pontos básicos por uma linha de vencimento em seis meses no mercado, o dobro do que pagava antes de 15 de setembro, quando a concordata da Lehman Brothers congelou o mercado de crédito em dólares. Uma empresa brasileira de primeira linha paga não menos do que 300 pontos básicos de prêmio.
Segundo ele, mesmo os bancos europeus com mais disponibilidade de recursos não querem emprestar em dólar, pois captam em euro. "O risco de contraparte nas transações de swap de dólar para euro no mercado internacional está muito elevado, tornando essas transações inviáveis", diz o executivo.
Diretor de banco que preferiu não se identificar confirma que as taxas de rolagens do crédito à exportação em sua instituição também não são superiores a 50% e com prazos nunca maiores do que 180 dias. Por isso, concorda ele, o BC deveria continuar a vender linhas de vencimento em um ano com garantias nos Adiantamentos de Contrato de Câmbio (ACCs). Esse diretor afirma que espera que o BC venda mais US$ 4 bilhões em linhas externas ainda em 2008, por causa do aperto maior tradicional de fim de ano, quando as instituições financeiras querem reduzir sua exposição ao risco para melhorar seus balanços.
Os bancos preferem esses leilões inovadores já em dólar com garantias em ACCs, como os três últimos realizados pelo BC, do que as antigas vendas de dólar com compromisso de recompra, por meio das quais o BC vendeu outros US$ 5,2 bilhões na estimativa dos bancos. Segundo Lembi de Faria, as vendas com compromisso de recompra do BC comprometem o caixa em reais dos bancos, que compram dólar do BC e vendem no mercado futuro, de forma a fugir do risco cambial.
Segundo Lembi de Faria, o Bradesco ganhou participação no mercado neste ano. No acumulado até o final de outubro, o banco fez US$ 10,7 bilhões em Adiantamentos de Contrato de Câmbio (ACCs) e Adiantamentos sobre Cambiais Entregues (ACEs), linhas de vencimento em até um ano. No mesmo período de 2007, havia feito US$ 9,95 bilhões. O aumento foi de 7,5% enquanto o mercado encolheu. No acumulado até o dia 25 de novembro, foram US$ 11,447 bilhões, na comparação com os US$ 12,874 bilhões de todo o ano de 2007.
Os números do fluxo cambial do BC mostram o aumento no volume de ACCs contratados no mercado em geral na terceira semana de novembro, justamente quando o dólar atingiu seu pico. Apesar do feriado da Consciência Negra no dia 20, a média diária de ACCs contratados entre os dias 17 e 21 de novembro foi a US$ 228,4 milhões, 17% a mais do que os US$ 195,4 milhões da semana anterior e 236% a mais do que os US$ 68 milhões da primeira semana deste mês. Com esse impulso, o total de câmbio contratado para a exportação totalizou US$ 3,355 bilhões na semana passada, quase igual aos US$ 3,372 bilhões efetivamente exportados no período. Com os juros externos baixos, a atratividade de aplicações no exterior é pequena.
Segundo Lembi de Faria, a crise nos mercados internacionais vai durar ainda um bom tempo e o mercado de crédito não deverá se normalizar pelo menos até o final do primeiro semestre. "É uma séria crise de confiança e confiança não se recupera de uma hora para outra", afirma o executivo. "O BC terá de continuar a oferecer linhas até lá", acredita ele. Ele lembra que o BC, "felizmente", tem cacife suficiente para fornecer esse crédito, dadas as reservas internacionais de cerca de US$ 200 bilhões.