Título: Tanque na reserva
Autor: Ragazzi , Ana Paula
Fonte: Valor Econômico, 28/11/2008, EU& Investimentos, p. D1

Ninguém tem dúvidas, no mercado, sobre a solidez da capacidade de pagamentos da Petrobras, mas soou estranho para os investidores o fato de a empresa ter ficado com um aperto de caixa para pagar impostos e ter recorrido à Caixa Econômica Federal (CEF) para obter um empréstimo de R$ 2 bilhões. A informação, alardeada na quarta-feira pelo senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), aumentou as preocupações em relação ao tamanho das dificuldades de obtenção de crédito pelas empresas e também o mal-estar em relação à grande interferência política que existe sob a petrolífera.

Jereissati criticou o fato de recursos da Caixa terem ido para a estatal e não para empresas de menor porte neste momento de restrição de recursos. Também lembrou o perfil do banco, de financiamento imobiliário.

No mesmo dia em que o empréstimo com a Caixa foi concedido, 31 de outubro, o governo mudou as regras para permitir à Petrobras tomar até R$ 8 bilhões de crédito no Brasil. E, anteontem, retirou também esse limite para financiamentos em bancos domésticos. A Petrobras divulgou nas notas explicativas do terceiro trimestre os dados sobre o empréstimo com a Caixa, por meio de uma cédula de crédito bancário (CCB), de 180 dias, a 104% CDI - prazo e taxa muito atrativos para a petrolífera no cenário atual instalado pela crise financeira, de crédito escasso e caro.

"O fato da captação neste volume, pela Petrobras, ser de curto prazo mostra o tamanho da restrição de crédito enfrentado pelo setor industrial", afirmou a Fator Corretora em comentário distribuído a clientes. Rodney Otero Melhados, analista da Planner Corretora, observa que não tem dúvidas de que a petrolífera teria condições de conseguir os recursos em qualquer outro banco, nacional ou estrangeiro, mas talvez a taxas mais elevadas.

"O grande problema desse evento não está relacionado com a saúde financeira da empresa, mas com o fato de aumentar ainda mais o viés de companhia mal administrada e com forte ingerência política", afirma.

Rodrigo Lopes, diretor da Banif Nitor, lembra que a quantia levantada pela Petrobras com a Caixa não é relevante se levado em consideração o porte da petrolífera. "O que não se sabe é por que a empresa recorreu à Caixa, uma vez que sem dúvidas conseguiria recursos em outros bancos."

Ricardo Carvalho, diretor sênior de avaliação de empresas da Fitch Ratings, critica as afirmações do senador Jereissati de que a empresa sofre de sério problema de caixa. "O comentário não tem qualquer cunho técnico. Parece claro que questões políticas estão-se sobrepondo a análises técnicas", afirma Carvalho. "Esse tipo de declaração é ainda mais prejudicial em um momento de crise, como o atual", afirma.

Carvalho minimiza o fato de o empréstimo ter sido contraído com a Caixa. "Se o ambiente é difícil, as empresas têm de buscar recursos onde encontrarem", diz.

Ele ressalta que não há nenhuma dificuldade na capacidade de pagamento da petrolífera. Lembra que a companhia tem um plano de investimento agressivo, da ordem de US$ 20 bilhões anuais, e necessário, por conta de suas recentes descobertas no pré-sal e precisa buscar recursos.

"Mas empresa tem capacidade de geração de caixa de cerca de R$ 40 bilhões, dívidas de curto prazo de R$ 12 bilhões e um perfil de baixa alavancagem", diz.

Na avaliação da equipe da análise da Socopa, as operações da Petrobras com a Caixa e o Banco do Brasil acontecem com qualquer empresa que tenha algum descasamento pontual no seu fluxo de caixa, o que não significa um problema de geração de caixa. "É fato que não se trata de operações corriqueiras, mas não é motivo para tanto barulho."

O Fator destaca que a dívida líquida da Petrobras, no fim do terceiro trimestre era de R$ 37,7 bilhões e a relação dívida líquida/lajida de apenas 0,6. A pressão de caixa, avalia, pode vir do cronograma de investimentos, que inclusive estão em revisão diante do cenário conturbado, e da necessidade de capital de giro, "que deve ter evolução positiva no quarto trimestre em função da queda do preço do petróleo, que implica em menor volume financeiro de contas a receber e de estoques.