Título: Brasil acredita em acordo entre sócios do Mercosul
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 01/12/2008, Brasil, p. A2

Os representantes do governo brasileiro, mobilizados pela retomada das negociações da Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC), interpretaram como "blefe" de seus colegas argentinos a recente ameaça de crise no Mercosul se for tolerada maior redução das tarifas de importação sobre bens industriais. A avaliação que prevalece para justificar essa tranqüilidade, apesar das duras palavras que estão sendo usadas, considera a enorme dificuldade política que a presidente Cristina Kirchner enfrenta. Seu governo é praticamente refém dos industriais porque afastou-se dos produtores rurais. Essa situação levou o "lobby" protecionista da Unión Industrial Argentina (UIA) diretamente às negociações multilaterais, mas para o governo brasileiro, o governo argentino tem consciência dos limites desta posição. Ruy Baron/Valor

Barral, do Mdic: esforço para convencer a Argentina dos ganhos da Rodada

Uma fonte que participa diretamente das conversas disse que os dois principais negociadores argentinos - Nestor Stancanelli e Alfredo Chiaradia - são muito duros e vão manter essa postura até o fim. O objetivo deles é obter o máximo de proteção e exceções à liberalização comercial que voltou a fazer parte da agenda global depois da grave crise financeira mundial que tornou-se mais aguda a partir de 15 de setembro. "Depois que a Argentina quebrou, a indústria vem se recuperando, mas ainda não pode ser chamada de competitiva em nível mundial", comentou um negociador brasileiro.

Na quinta-feira passada, a imprensa argentina publicou o seguinte recado de uma alta fonte do governo: "Se o Brasil propicia uma fórmula [de redução tarifária] inaceitável para a Argentina, vamos ter uma crise no Mercosul".

O Valor ouviu o secretário de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Welber Barral, que não endossa a tese do blefe dos negociadores argentinos. Ele prefere apostar nos grandes interesses comuns que aproximam os dois maiores sócios do Mercosul. "Sabemos das dificuldades da Argentina nas negociações, mas procuramos convencê-los que um avanço na Rodada Doha tem compensações importantes para os exportadores agrícolas. Além disso, as exceções propostas são suficientes para atender às sensibilidades da indústria argentina", disse.

Barral revelou que, recentemente, encontrou-se com representantes da União Européia e conseguiu convencê-los que o Brasil não está seguindo uma postura protecionista. Explicou que, nas negociações bilaterais com a Argentina, as propostas de elevação da Tarifa Externa Comum (TEC) endossadas envolvem 0,2% do comércio exterior brasileiro. "Eles sabem que o Brasil trabalha para uniformizar a TEC, acabar com suas perfurações e abandonar a lista de exceções ."

Para o secretário, o desfecho da reunião bilateral realizada em 17 de novembro, em Buenos Aires, foi mal explicado à imprensa pelas autoridades argentinas. Na sua versão, a proposta de aumento da TEC para vinhos e lácteos nada mais é que manter as tarifas praticadas no Brasil porque ambos os produtos estão na lista de exceções que, atualmente, tem 99 produtos. Há uma norma no Mercosul que prevê o fim da lista de exceções à TEC até 2011.

No caso do pêssego, Barral disse que a tarifa deverá cair dos atuais 55% para 35%. Na reunião do G-20 Financeiro, realizada recentemente em Washington, o Brasil comprometeu-se a lutar contra a elevação das tarifas de importação para não agravar a crise econômica.