Título: Medidas para tentar evitar tragédias como a de SC
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 02/12/2008, Opinião, p. A12

As marcas da tragédia dos últimos dias em Santa Catarina, em que já morreram 114 pessoas, ficarão por muitos anos na memória dos brasileiros e exigirão esforços dantescos dos moradores do Estado e a liberação de milhões de reais para que sua economia volte à normalidade. Mas desde já estão sendo levantadas questões importantes - a serem debatidas por toda a sociedade - sobre as políticas públicas de meio ambiente e urbanização que, ao que tudo indica, acabaram, infelizmente, piorando os estragos causados pelas chuvas torrenciais.

Segundo a Federação das Indústrias do Estado de Santa Catarina (Fiesc), os municípios do Vale do Itajaí deixaram de gerar R$ 358,3 milhões durante a semana em que as economias das cidades ficaram praticamente paradas por conta das enchentes. O valor leva em conta o Produto Interno Bruto da região, que representa 21,8% do total do PIB do Estado. A estimativa foi baseada em dados oficiais do PIB de 2005, calculado pelo IBGE, e não inclui os prejuízos à infra-estrutura, às residências ou a parques fabris. O valor tende a ser maior porque o cálculo não leva em conta o fato de o impacto não ter se limitado à região do Vale do Itajaí: empresas no oeste e sul do Estado não conseguem exportar mais pelo Porto de Itajaí e estão tendo que buscar outros locais para escoamento, mais distantes, fora os problemas na logística de matérias-primas por conta do fechamento de estradas.

Em entrevista ao Valor, o professor de pós-graduação em geografia econômica da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e da Universidade de São Paulo (USP), Armen Mamigonian, lembrou que o Vale do Itajaí é uma das regiões mais dinâmicas de Santa Catarina e um dos pólos industriais mais relevantes. Embora seja reconhecido pelo setor têxtil, hoje essa região abriga também metalúrgicas. Em qualquer município pequeno daquela área, que no passado eram cidades agrícolas, hoje há indústrias e algumas são de grande porte.

Em 1983, após a enchente que afetou muitos parques fabris em Blumenau, as empresas se reergueram de forma rápida. Para Mamigonian, a atual catástrofe deverá representar perdas maiores porque atingiu muito mais a infra-estrutura, que leva mais tempo para ser reconstruída. O porto de Itajaí, que em 1983 já existia, não tinha sofrido tanto impacto em qualquer outro momento como agora - a reconstrução é estimada em R$ 320 milhões.

Na avaliação de especialistas, é preciso rever projetos antigos de construção de barragens ao longo do rio Itajaí-Açu. Após enchente ainda nos anos 60, o governo federal construiu algumas barragens, mas deixou a obra incompleta, especialmente na região de municípios no norte do Vale do Itajaí, que foram também duramente afetados agora. O Vale do Itajaí sofre de forma recorrente com enchentes. Mamigonian destaca que a área onde está Blumenau é onde se inicia o médio vale do rio Itajaí-Açu e pelas próprias características naturais, de estar nessa região do curso do rio, tem mais riscos de enchentes. "As enchentes são cíclicas nesta área. Vão sempre ocorrer. Claro que os problemas ambientais contribuem, mas as cheias são características daquela área", diz ele. Desde a enchente de 1983, são estudadas obras que poderiam ter minimizados os efeitos das cheias deste ano, como a retificação da calha do rio Itajaí-Açu, a construção de diques nas cidades mais vulneráveis, como Blumenau e a construção de um canal saindo de Itajaí e indo até a praia dos Navegantes, que desviaria parte do fluxo do rio.

De acordo com o diretor de orçamento da secretaria de Planejamento, Romualdo Goulart, ainda não é possível prever um valor a ser investido na área para sua reconstrução. O orçamento de 2009 foi feito entre junho e julho de 2008, em um cenário mais otimista. Naquela ocasião, os investimentos foram previstos em R$ 1,3 bilhão, com o foco para a construção de rodovias de acesso a municípios do interior do Estado, que ainda hoje são de estrada de terra. "Esse valor poderá agora vir a ser destinado para a reconstrução", disse ele, destacando que por enquanto é "prematuro realizar projeção de perdas e do prazo necessário para a reconstrução da infra-estrutura.

Segundo a Fazenda de SC, a redução mensal de arrecadação por conta da tragédia deverá durar até março de 2009. Em números absolutos, as perdas em todos os municípios atingidos podem chegar a cerca de R$ 100 milhões por mês nas receitas do Estado.