Título: "Fui parar lá por causa da cegonha"
Autor: Cynthia Malta
Fonte: Valor Econômico, 25/02/2005, Especial, p. A46

O sociólogo José de Souza Martins, professor aposentado da Universidade de São Paulo (USP), nasceu em São Caetano do Sul em 1938 e deixou a cidade em 1963. Mas sua ligação com o município ainda é forte. Grande parte da família ainda mora ali, inclusive sua mãe, de 91 anos. "Fui parar lá porque a cegonha me deixou lá. Sou do tempo em que as pessoas não nasciam, eram trazidas pela cegonha", diz, bem-humorado, o professor, que pesquisou a região do ABC e escreveu vários livros sobre São Caetano do Sul, onde cresceu, trabalhou e estudou. "Saí de lá quando já estava no terceiro ano da universidade, em 1963", conta Martins, que hoje mora em São Paulo. O professor lembra que até os anos 30, São Caetano transformou-se, de antigo núcleo colonial de imigrantes italianos, que começaram a chegar em 1877, em um subúrbio industrial. As primeiras fábricas foram estabelecidas na década de 1880. Agricultura e indústria conviveram até 1930. A partir dessa data, converteu-se em região de grandes indústrias, atraindo os migrantes provenientes, sobretudo, do interior de São Paulo, liberados pela crise do café. No fim dos anos 40, observa Martins, começou a grande imigração do Nordeste e de Minas Gerais, que ganhou corpo na década de 50 com a indústria automobilística em São Bernardo do Campo. Em 1949, São Caetano do Sul, então um distrito de Santo André, ganhou "status" de município. Durante os anos 60 e 70 a ocupação do solo foi saturada, não sobrando mais espaço. "Esta situação começou a ficar evidente quando casas para filhos ou para aluguel começaram a ser construídas nos grande quintais que ainda havia", diz o sociólogo. Com a saída de grandes indústrias, como o complexo Matarazzo e a Cerâmica São Caetano, a cidade passou a abrigar estabelecimentos médios, voltando-se para o setor de serviços. "Essas mudanças, no meu modo de ver, explicam o fato de que parte da população foi embora, acompanhando seus empregos. Os jovens também se foram, à procura do primeiro emprego. Praticamente cessou a atração massiva de migrantes internos que houve até o começo dos anos 70. A população envelheceu", explica Martins. Outro fator que contribuiu, na opinião do professor, foi a mudança na mentalidade quanto ao tamanho da família. "Os jovens preferem ter menos filhos do que seus pais tiveram e no geral estão tendo filhos mais tarde do que seus pais tiveram. A educação sexual das novas gerações tem tido eficácia em São Caetano, contribuindo para evitar a gravidez precoce". (CM)