Título: Devassa federal no GDF
Autor: Luiz, Edson
Fonte: Correio Braziliense, 27/02/2010, Cidades, p. 36

Controladoria-Geral da União investiga 15 órgãos distritais para saber o destino de R$ 26 bilhões repassados aos cofres locais. Há indícios de superfaturamento em obras

Obras na Epia, em 2008: segundo resultados preliminares da auditoria da CGU, a obra dessa rodovia teria ficado R$ 6,5 milhões mais cara

A União está fazendo uma devassa em 15 órgãos do Governo do Distrito Federal, que nos últimos quatro anos receberam R$ 26 bilhões de recursos públicos. O pente-fino, determinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva à Controladoria-Geral da União (CGU), atinge verbas destinadas às áreas de educação, saúde e segurança pública. Segundo o ministro-chefe da CGU, Jorge Hage, o trabalho é independente e não envolve apenas dinheiro repassado para contratos do GDF com empresas envolvidas na suposta rede de pagamento de propina investigada pela Operação Caixa de Pandora. Em maio de 2009, a controladoria fez uma auditoria no DF e detectou 76 irregularidades, incluindo obras do Metrô e em rodovias.

De acordo com Hage, há auditores distribuídos em secretarias e outros órgãos do GDF analisando os contratos assinados com a União. ¿Inicialmente, eu havia mandado auditar se havia recursos federais envolvidos nos contratos com aquelas empresas citadas no inquérito policial, nas gravações e na imprensa. Esse trabalho já estava em curso, quando o presidente Lula determinou que a CGU fizesse uma varredura completa em todas os recursos federais transferidos ao DF e é isso que estamos fazendo agora¿, afirmou Hage ao Correio.

Os resultados preliminares das investigações revelaram que o novo trecho do metrô, que contou com R$ 40 milhões do Ministério dos Transportes, teria custado 125% a mais do que o preço de mercado. O superfaturamento teria atingido também as obras das rodovias BR-020 (Brasília-Fortaleza), BR-060 (Brasília-Goiânia) e BR-450 (Epia) ¿ esta teria ficado R$ 6,5 milhões mais cara.

Entre 2006 e 2010, o GDF recebeu R$ 26 bilhões, sendo que a maioria é do Fundo Constitucional ¿ R$ 24 bilhões para investimentos em saúde, educação e segurança pública. O R$ 2 bilhões restantes foram repassados para outros órgãos do DF. ¿Quero salientar, porém, que o que estamos auditando são apenas as verbas federais, pois não podemos entrar na análise dos recursos próprios do DF, por conta da sua autonomia¿, comentou Hage.

Problemas Na auditoria da CGU feita no DF em maio passado, foram detectadas diversas irregularidades, principalmente nas obras de rodovias e do metrô. Segundo Hage, o governo local se comprometeu a sanar os problemas.

¿O Dnit tem cobrado do DER-DF as justificativas para os apontamentos da CGU. Em alguns casos o DER-DF procurou justificar as diferenças de preço. Em outros casos, já reconheceu e comprometeu-se a estornar as diferenças de valores, e estamos agora aguardando a comprovação documental de várias dessas providências corretivas¿, afirmou o ministro. ¿Se elas não vierem, os valores serão glosados nas prestações de contas dos convênios e eles terão que ressarcir a União¿.

O ministro informou que, no caso do Metrô-DF, o governo tentou argumentar que os parâmetros de preços utilizados pela CGU eram inaplicáveis, por ser a obra do metrô muito diferente das obras civis. ¿Nós recusamos essa justificativa, pois se tratava basicamente da construção das estações do metrô, e isso em nada difere de outras obras civis de engenharia, o que havia de específico era quase nada¿, observou Jorge Hage.

Sobram condenações

Guilherme Goulart Valério Ayres/Esp. CB/D.A Press - 23/2/10 Benedito expediu alvarás ilegais para concessionárias no Pistão Sul

Ex-secretários e ex-administrador dos governos José Roberto Arruda (sem partido) e Joaquim Roriz (PSC) foram condenados pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDF) por improbidade administrativa. Nos últimos dois dias, diferentes ações encaminhadas pelo Ministério Público do Distrito Federal (MPDF) terminaram em punições inclusive a nomes do então primeiro escalão de cada administração pública. Os réus terão de pagar multas ou restituir aos cofres do governo. Cabem recursos em todos os casos.

Aparecem entre os principais condenados o deputado distrital Benedito Domingos (PP), ex-administrador de Taguatinga, o ex-secretário de Fazenda do DF, Valdivino José de Oliveira, e os ex-secretários de Gestão Roriz Benjamim Roriz e Bauer Ferreira Barbosa. Domingos, por exemplo, acabou condenado pela 6ª Vara de Fazenda Pública por celebrar Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) de forma irregular e de expedir alvarás ilegais de funcionamento a concessionárias de veículos do Pistão Sul, em Taguatinga. O servidor público Jeovâncio Monteiro está envolvido na mesma ação.

A decisão judicial determinou a suspensão dos direitos políticos dos acusados por quatro anos e o pagamento de multa correspondente a 50 vezes o valor da maior remuneração recebida enquanto ocuparam cargos na Administração Regional de Taguatinga. A denúncia encaminhada pela Promotoria de Defesa da Ordem Urbanística (Prourb) revelou que Domingos e Monteiro autorizaram, em 1997, o funcionamento de concessionárias de automóveis no Pistão Sul sem alvará.

A 4ª Vara de Fazenda Pública do DF determinou a perda do cargo público, a proibição de contratar com órgãos públicos e a suspensão dos direitos políticos por cinco anos de Valdivino Oliveira, ex-secretário de Fazenda dos governos Arruda e Roriz. Ele é acusado de concessão de benefício fiscal para uma empresa de alimentos. A ação civil pública foi proposta pela Promotoria de Defesa da Ordem Tributária. O réu terá de pagar multa de R$ 441 mil.

A 6ª Turma Cível manteve a condenação, por unanimidade, do ex-secretário de Governo Benjamim Roriz e o ex-subsecretário de Apoio Operacional Bauer Barbosa a restituir aos cofres públicos em cerca de R$ 7 milhões. A Promotoria de Defesa do Patrimônio Público e Social apontou a simulação de contrato de gestão firmado para a terceirização da locação de veículos pelo Instituto Candango de Solidariedade (ICS), o que é ilegal.

Surge um novo vídeo

Adriana Bernardes IG/Reprodução Beserra, em conversa com Durval: licitação supostamente combinada

A principal forma de arrecadação de dinheiro no suposto esquema de corrupção no Executivo e Legislativo locais ocorria por meio dos contratos de informática, segundo a Polícia Federal e o Ministério Público. Vídeo gravado em 6 de novembro passado pelo então secretário de Relações Institucionais do GDF, Durval Barbosa, reforça a tese dos investigadores e revela como licitação públicas eram manipuladas para beneficiar determinadas empresas. O dinheiro, conforme a cena registrada, vinha de adição aos contratos.

Na gravação divulgada ontem pelo portal IG, Barbosa conversa com Agenor Damasceno Beserra, apontado como representante de empresas de informática. Eles falam sobre a licitação para prestação de serviço de informática para a Secretaria de Desenvolvimento Social e Transferência de Renda (Sedest). Beserra diz que a Sofhar Gestão e Tecnologia, segunda colocada na licitação da Sedest, ganharia a o certame iniciado em 2008.

No diálogo, Beserra lembra que havia um acerto de aditivo de contrato no valor de R$ 4 milhões. O dinheiro seria usado supostamente para pagar uma pesquisa com as famílias beneficiadas pelo programa de transferência de renda da Sedest. Ele aponta Fábio Simão, o ex-chefe de gabinete do governador afastado e preso preventivamente, José Roberto Arruda (sem partido), como a pessoa que queria a liberação do contrato e do aditivo (leia a transcrição do diálogo). Em 10 de novembro, quatro dias após a gravação do vídeo, a primeira colocada na licitação, a Fundação Israel Pinheiro acabou desclassificada.

O processo de licitação discutido no vídeo teve início em dezembro de 2008. Seis meses depois, a Fundação Israel Pinheiro foi declarada vencedora, com uma proposta de R$ 18,5 milhões. Após aproximadamente 30 dias, o então secretário de Planejamento do DF, Ricardo Penna, pediu a anulação do pregão alegando que tinha parentesco com gestores da Fundação Israel Pinheiro. A exclusão da entidade do processo ocorreu em 10 de novembro, depois de Beserra e Durval supostamente acertarem que a segunda colocada levaria a licitação. Em 8 de dezembro, a Sofhar venceu o pregão. Vinte dias depois, foi lavrada a ata que a declarou vencedora da licitação, com uma proposta de R$ 17,8 milhões.

Justiça Por meio de nota, a Sofhar nega conhecer Agenor Damasceno Beserra e anuncia que vai interpelá-lo judicialmente ¿por usar indevidamente, e sem autorização, o nome da empresa¿. Informa ainda que o contrato entre a Sofhar e a Sedest não foi assinado e que os valores máximos da licitação também estão indefinidos. De acordo com o texto, o processo licitatório foi aprovado pelo Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF).

A Sofhar argumenta ainda que ¿desde agosto de 2009, era de conhecimento público a desclassificação da Fundação Israel Pinheiro. E que a partir daquela data, a Sofhar ¿ classificada em segundo lugar no certame inicial ¿ seria convocada como primeira colocada para a continuação do processo licitatório¿. A concorrência foi revogada em 4 de fevereiro passado. Sete dias depois, Arruda acabou preso.

A reportagem localizou Agenor Beserra em Goiânia. Ele aparece como representante de outra empresa de informática. A telefonista confirmou que ele trabalhava lá, mas estava fora da empresa. Ela não passou o telefone celular de Beserra. Ao ser informada sobre o teor da reportagem, comprometeu-se a localizá-lo e pedir que entrasse em contato com a redação, o que não ocorreu até o fechamento desta edição. A assessoria de imprensa do GDF foi procurada, mas não retornou as ligações.