Título: BC entra no debate da política fiscal
Autor: Alex Ribeiro
Fonte: Valor Econômico, 25/02/2005, Finanças, p. C1
O Banco Central entra pela primeira vez, na ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) divulgada ontem, no debate sobre os efeitos da política fiscal na inflação, ao afirmar que uma política de contenção de gastos públicos poderia ajudar a segurar a demanda, reduzindo a carga de juros para fazer os índices de preços convergirem para a meta. "É inegável que reduções nos gastos públicos reforçam a ação da política monetária no controle da inflação e que o aprofundamento no processo de melhora nas contas públicas abre ainda mais espaço para uma redução das taxas reais de juros", diz a ata do Copom. No documento, o BC afirma que trabalha com a meta de superávit primário de 4,25% do PIB em 2005, abaixo dos 4,61% do PIB realizados em 2004. Com o programa de investimentos negociado com o Fundo Monetário Internacional (FMI), anunciado nesta semana, a meta cairia para 4,1%. Analistas econômicos vêm insistindo que essa redução de 0,5 ponto percentual no superávit representa, na prática, expansão do gasto do governo, com repercussões na elevação da demanda e inflação. O BC evita fazer considerações na ata se a política fiscal atual é mais expansionista ou não - sempre se refere a "desenvolvimentos recentes" na área fiscal ou à "atual postura de política fiscal". Há alguns meses, o Copom entrou em choque com a Petrobras ao advogar uma elevação nos preços dos combustíveis. O principal objetivo do Copom ao abordar o assunto na ata é esclarecer que, em tese, uma política fiscal expansionista tira parte da eficiência da política monetária (exigindo uma dose maior de juros), mas não elimina sua eficácia (ou seja, o remédio, quando bem administrado, não deixa de reduzir a inflação). O secretário do Tesouro Nacional, Joaquim Levy, afirma que é natural entre as autoridades monetárias dos Estados Unidos e Europa fazer considerações sobre a política fiscal. "A política fiscal não traz obstáculos ao controle da inflação", disse, acrescentando que o resultado do Tesouro divulgado ontem corrobora com essa avaliação. O diretor de administração do BC, João Antônio Fleury, que tem assento no Copom, disse que a ata não contém nenhuma crítica à política fiscal. Desde janeiro, economistas debatem se está havendo perda de efetividade da política monetária em virtude de mudanças estruturais no crédito e na política fiscal. O interesse pelo assunto foi levantado pelo próprio Copom na ata de janeiro, ao afirmar que no atual estágio de crescimento da economia - ligado à expansão do emprego e renda - poderia estar tornando a inflação mais resistente à queda. Na ata divulgada ontem, o BC diz que essa resistência inflacionária é apenas um fator de risco - que desde então foi reduzido -, que não pode ser entendido com evidências de uma perda de efetividade da política monetária. "No que diz respeito ao crescimento do crédito, trata-se de um avanço estrutural importante que, além de contribuir para uma maior eficiência da intermediação financeira, deverá aumentar a efetividade da política monetária no médio prazo", afirma a ata do Copom. O ponto debatido entre analistas é se a expansão do crédito poderia trazer prejuízos à política monetária. O BC deixa claro que essa hipótese não preocupa: "Não há evidências que a política monetária não conseguirá assegurar a convergência da inflação para a trajetória de metas durante o período necessário para que essa mudança estrutural se consolide", diz a ata do Copom.