Título: Atraso nas garantias deixa leilões do governo em xeque
Autor: Goulart, Josette
Fonte: Valor Econômico, 03/12/2008, Empresas, p. B9

Uma só empresa, a Cibe Participações, que pertence aos grupos Bertin e Equipav, se comprometeu a produzir 63% da energia contratada nos dois últimos leilões do governo federal, ou 2.671 MW, e essa concentração começa a mostrar os riscos a que está exposto o governo federal para fechar o balanço de oferta e demanda do insumo nos próximos anos. A empresa não depositou as garantias devidas, na última sexta-feira, para levar adiante o projeto de construção de seis usinas termelétricas vendidas no leilão de A-3, em que a energia é entregue a partir de 2011. Com isso, o risco é de agora a empresa também não ter como garantir as obras de outras 15 usinas que vendeu no leilão de A-5, realizado em setembro, em que a energia é entregue a partir de 2013.

A empresa informou por meio de nota que não havia condições de mercado para obter uma apólice de seguro que garantisse o pagamento de 5% do investimento total de R$ 1,5 bilhão que fará nas usinas. Sem essa garantia, que é executada caso a empresa não concretize os projetos, a Aneel não pode homologar o resultado do leilão. Por isso, a Cibe pediu uma prorrogação de 90 dias para fazer o aporte das garantias e a decisão está agora nas mãos da Aneel.

O superintendente de concessões e autorizações de geração da Aneel, Hélvio Guerra, disse que é a primeira vez que um pedido como esse chega à Aneel. Ele conta que já houve um caso em que o depósito de garantias não foi feito e o direito de construir a usina foi diretamente revogado, pois a empresa não pediu prorrogação de prazos. Agora a diretoria da Aneel terá de resolver se concede o prazo pedido pela Cibe, mas terá de analisar, por exemplo, se as condições de mercado podem ser consideradas um fato relevante que justifique a alteração do edital. O prazo, encerrado sexta-feira, já estava previsto em edital. A prorrogação pode abrir um precedente ou até mesmo levar outros empreendedores à Justiça para anular o leilão, requerendo condições de igualdade.

Guerra disse que a empresa pode fazer o depósito das garantias enquanto não há uma análise do processo administrativo que foi instaurado, mas pode estar sujeita a alguma pena pelo não cumprimento de prazos, como a própria execução das garantias dadas para a participação dos leilões. Os empreendedores que desejam vender projetos de usinas nos leilões do governo precisam prestar dois tipos de garantias. A primeira é financeira, que representa 1% do investimento, para ter direito a dar seus lances. Se sagrar-se vencedor é preciso prestar uma nova garantia, de fiel cumprimento do projeto, que corresponde a 5% do total a ser investido.

O prazo para a prestação da garantia de fiel cumprimento do leilão de A-5, realizado no fim de setembro, termina dia 26 de dezembro. A Cibe, por meio de uma sociedade de propósito específico chamada MC2, vendeu a energia a ser produzida por 15 usinas termelétricas movidas a óleo diesel e gás natural regaseificado. O investimento pode chegar a R$ 5 bilhões e a energia vendida vai lhe render por ano, a partir de 2013, cerca de R$ 1,5 bilhão, se a empresa depositar as garantias e construir as usinas.

A Cibe Participações tem hoje cinco projetos de termelétricas movidas a óleo, em fase de implantação. Duas delas, em sociedade com a Petrobras. A térmica Pólo de Apoio I, que fica no município de Camaçari, na Bahia, tem previsão de entrar em operação em janeiro de 2009 e a outra, que fica em Suape, em Pernambuco, está prevista para começar a operar em 2012. No total, as cinco termelétricas em construção terão capacidade de gerar 913 MW.

Só em 2008, a empresa se comprometeu a construir usinas com capacidade de 2.671 MW. Mais de 2.000 MW foram vendidos no leilão de A-5, que foi o maior leilão de energia nova desde a entrada em vigor das novas regras do setor, em 2004. Ao todo, foram vendidas 24 usinas, sendo 15 da Cibe. No leilão A-3, a Cibe vendeu 611 MW de energia com o compromisso de entrega em 2011. Ou seja, um prazo já apertado para a construção das térmicas e que pode ser afetado por uma eventual prorrogação.

Caso a Aneel não conceda a prorrogação, a Cibe perde o direito de construir as usinas e as distribuidoras que compraram a energia ficarão expostas. No balanço energético do governo, o ano de 2011 tem um superávit de 1.600 MW, caso não haja nenhum atraso de entrega de usinas. Mas para 2012, esse superávit é de apenas 100 MW.