Título: Projeto cria órgão de defesa comercial
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 08/12/2008, Brasil, p. A3

Está tramitando no Senado Federal, com chances de aprovação rápida, um projeto de lei que acelera a adoção de medidas antidumping e salvaguardas. Ao invés de serem avaliadas pela Câmara de Comércio Exterior (Camex), as medidas seriam aprovadas pelo Conselho de Defesa Comercial, um novo órgão composto por técnicos do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior e da sociedade civil. Na prática, o projeto de lei retira poder dos ministérios da Fazenda, Relações Exteriores e Agricultura nas discussões do comércio exterior.

Uma iniciativa do senador Francisco Dornelles (PP-RJ), o projeto de lei foi aprovado na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) no fim de novembro, com relatoria do senador Aloísio Mercadante. (PT-SP). A expectativa é que seja avaliado pelo plenário do Senado até o fim do ano, seguindo depois para a Câmara dos Deputados.

"A crise internacional exige uma atuação imediata do governo federal ", disse Dornelles, justificando a urgência em aprovar o projeto. Ele acredita que a China vai direcionar os excedentes de exportação para o Brasil. Entre os setores que poderiam se beneficiar estão siderurgia, têxteis, calçados, brinquedos e produtos eletrônicos.

Conforme o projeto de lei, o conselho de defesa comercial seria composto por sete membros: quatro técnicos do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (Mdic) e três representantes da sociedade civil, indicados por Confederação Nacional da Indústria (CNI), Confederação Nacional da Agricultura (CNA) e Confederação Nacional do Comércio (CNC). As entidades apresentariam uma lista tríplice ao ministério, que escolheria os representantes.

No texto de justificativa do projeto apresentado aos senadores, Dornelles disse que a Camex "sofre a influência" de representantes de outros ministérios, que "priorizam as políticas das pastas que representam" e não as regras do comércio internacional. Ao citar exemplos desse comportamento, o senador diz que a entrada de alguns produtos subsidiados interessam o Ministério da Fazenda, porque ajudam a controlar a inflação, e que o Itamaraty veta algumas medidas de defesa comercial por temer as reações diplomáticas dos países. Procurados pelo Valor, Fazenda, Itamaraty, Agricultura e Desenvolvimento não se manifestaram.

Uma resolução da Camex sobre as importações brasileiras de nitrato de amônio (matéria-prima para fertilizantes) seria um exemplo de interferência política. Na mesma circular, que foi publicada no início do mês passado, a Camex reconhece a existência de dumping, aplica sobretaxas que variam de 2,4% a 36,3%, mas ao mesmo tempo suspende esses direitos.

A justificativa é a necessidade de "considerar o interesse do país em preservar a estabilidade dos preços do produto e a sua importância para as culturas agrícolas". Segundo uma fonte do governo, a suspensão atendeu a pedido do Ministério da Agricultura.

A iniciativa do Senado preocupa os especialistas em comércio exterior. Segundo o advogado Francisco Ribeiro Todorov, sócio do escritório Trench, Rossi e Watanabe, o novo conselho garantiria uma aprovação quase automática das medidas de defesa comercial. Ele afirma que alguns pedidos são feitos por empresas monopolistas, que querem apenas ampliar sua proteção interna.

"Nesses casos, a sobretaxa tem efeitos danosos à concorrência, prejudicando o consumidor", disse Todorov. Ele acredita que o número de "vozes" do governo que atuam na Camex deveria ser ampliado e não reduzido.

No parecer de aprovação do projeto na Comissão de Assuntos Econômicos, o senador Aloizio Mercadante diz que "o sistema de defesa comercial brasileiro atua com lentidão e é hesitante na aplicação de direitos provisórios". Segundo ele, o país aplicou apenas 41 medidas antidumping provisórias das 267 investigações abertas entre 1988 e 2006. Esse mecanismo consiste na adoção de sobretaxa temporária, enquanto a investigação antidumping, que dura em média nove meses, está em curso.

Para Mercadante, o projeto é "oportuno" e "demanda pronta aprovação" por conta da crise global. O senador petista fez apenas duas emendas. Ele transformou o projeto de "impositivo" em "autorizativo", o que significa que cabe ao Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, efetivamente criar o conselho. Além disso, o presidente também poderá reverter uma decisão do Conselho de Defesa Comercial. (RL)