Título: Três meses que implodiram o governo
Autor: Tahan, Lilian ; Campos, Ana Maria
Fonte: Correio Braziliense, 28/02/2010, Cidades, p. 29

A revelação, em 27 de novembro, de suposto esquema de corrupção envolvendo o GDF e a base aliada na Câmara Legislativa causou uma crise política sem precedentes na capital do país

22 de janeiro de 2007: o esqueleto do Brasília Palace Hotel foi o primeiro prédio demolido por ordem da nova gestão no Buriti

Governador afastado, Arruda cumpre prisão preventiva desde 11 de fevereiro

Adauto Cruz/CB/D.A Press -13/2/10 Paulo Octávio, que também é investigado, assumiu o GDF, mas renunciou na última terça-feira

O governo de José Roberto Arruda termina como começou, com a marca da implosão. Uma das imagens mais marcantes da administração dos democratas na capital do país foi a detonação de explosivos (1)que tombaram esqueletos de prédios. Com a prisão do governador e cinco aliados próximos, a renúncia do vice-governador Paulo Octávio e do presidente da Câmara Legislativa eleito em 2009, Leonardo Prudente, o afastamento do conselheiro Domingos Lamoglia do Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF), a iminência de cassação de distritais e a demissão de todo o primeiro escalão, a comparação é inevitável. Em três meses de investigação da Operação Caixa de Pandora, a gestão Arruda virou pó.

As denúncias feitas pelo ex-secretário de Relações Institucionais Durval Barbosa envolveram dezenas de autoridades. Além das duas figuras mais importantes do Executivo, Arruda e Paulo Octávio, a investigação envolveu diretamente 12 dos 24 integrantes do primeiro escalão, um terço da Câmara Legislativa e o único representante do TCDF nomeado por Arruda. A operação colocou sob suspeita contratos que somam R$ 500 milhões. O escândalo causou ainda desconfiança sobre o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios, com a abertura de investigações (2)no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) contra o procurador-geral de Justiça do DF, Leonardo Bandarra, e a promotora Débora Guerner.

Em 90 dias, o escândalo no DF produziu feitos inéditos que mobilizaram todas as instâncias da Justiça com decisões inusitadas, como a que convocou suplentes para apreciar os pedidos de impeachment de Arruda no lugar dos titulares sob suspeição pelo envolvimento nas denúncias. Desde 27 de novembro, houve três operações de busca e apreensão, uma delas em pleno sábado de carnaval, e um flagrante de tentativa de suborno, quando o ex-conselheiro do Metrô-DF Antônio Bento entregava uma sacola com R$ 200 mil ao jornalista Edson Sombra. A negociação foi totalmente monitorada pela Polícia Federal (PF) e culminou num feito inédito: a prisão de um governador no exercício do cargo.

Vitrine

Até outubro do ano passado, Arruda era um governador poderoso. Negociava acordos bilionários com organismos internacionais. Transitava em extremos. Era a vitrine do DEM e cotado para compor como vice numa chapa presidencial. Caso não alçasse esse voo, tinha a reeleição praticamente certa. Mantinha uma relação cordial com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Mas o vídeo em que aparece recebendo R$ 50 mil das mãos de Durval Barbosa (feito durante a campanha eleitoral de 2006) alterou a imagem do governador que tentava fixar a marca de legalidade como seu slogan de governo. As gravações entregues por Durval ao Ministério Público revelaram ainda personagens que só atuavam nos bastidores, como o policial aposentado Marcelo Toledo e o empresário Renato Malcotti, apontados como operadores dos supostos esquemas de corrupção do Executivo.

Outra marca da Operação Caixa de Pandora é o pedido de intervenção federal na capital do país, protocolado no Supremo Tribunal Federal (STF) pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel. Desde que a capital conquistou a autonomia política, 20 anos atrás, o tema nunca foi cogitado. Se os ministros do STF acatarem o pedido, será o primeiro caso, entre os 129 pedidos que tramitam na Justiça.

Impeachment

Com tantos comprometimentos, Arruda agora tem como meta principal encontrar um caminho para se livrar da prisão, mesmo que isso signifique não voltar ao comando do Governo do Distrito Federal. Na verdade, essa não é uma escolha de Arruda. Caminha com celeridade o julgamento de pedidos de impeachment contra o governador do DF na Câmara Legislativa. O relatório de abertura do processo por crime de responsabilidade teve o apoio unânime na Comissão Especial criada para tratar do assunto. Até o deputado Paulo Roriz (DEM), considerado um dos mais leais a Arruda, votou a favor da cassação do mandato do amigo.

A tendência é de que o posicionamento da Comissão Especial seja confirmado na próxima terça-feira quando o relatório do deputado Chico Leite (PT) será votado em plenário. Arruda também não tem mais perspectivas de poder em médio prazo. Sem partido, não poderá concorrer nas próximas eleições. Enrolado em denúncias de corrupção, pagamento de propina, desvios de recursos, suposto suborno e falsidade ideológica, o governador ¿ que nas últimas eleições venceu no primeiro turno ¿ não será aceito em nenhum palanque de candidatos. Neste momento, está liquidado politicamente.

1 - Ao chão No primeiro mês após assumir o governo, Arruda promoveu uma série de demolições de prédios inacabados pela capital. Foram ao chão o edifício de garagens atrás do Venâncio 2000, a carcaça do Brasília Palace Hotel (às margens do Lago Paranoá) e a estrutura do que viria a ser o Shopping do Lago Norte.

2 - Acusações Em depoimentos prestados à Polícia Federal e ao Ministério Público, Durval Barbosa afirmou que o procurador-geral de Justiça do DF, Leonardo Bandarra, e a promotora Débora Guerner receberam dinheiro para interceder em favor do governo Arruda. Os dois dizem que a denúncia é uma vingança de Durval. Mas o Conselho Nacional do MP abriu investigação para apurar o caso.