Título: Políticas de estímulo à economia exigem cautela
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 08/12/2008, Opinião, p. A10
Depois de agir para sustentar a oferta agregada da economia, o governo inicia agora a batalha das expectativas, com o intuito de evitar a queda da demanda. Entre as medidas cogitadas estão o corte dos impostos e a ampliação do seguro desemprego. O objetivo é evitar que a desaceleração da economia, já em curso, se transforme em recessão em 2009.
Embora seja saudável a preocupação em manter os níveis de confiança das famílias e empresas, não se deve cair na tentação de manter um nível artificial de crescimento. Serão inevitáveis alguns ajustes na absorção doméstica, curvando-se ao fato de que a economia se tornou mais pobre em função da piora dos termos de troca.
A contração do consumo privado nos períodos de crises é um dilema econômico clássico. Do ponto de vista individual, faz sentido os agentes econômicos cortarem consumo e investimentos para enfrentar dias piores. Para a economia como um todo, porém, esse é o pior dos mundos, pois a retração da demanda leva a recessões mais acentuadas.
Crises como a atual produziram o renascimento das políticas keynesianas, que foram aplicadas pela primeira vez após o "crash" de 1929 e haviam saído de moda, diante do avanço das políticas de cunho liberal. Não causa estranheza, portanto, que as autoridades brasileiras também preparem seu arsenal de medidas para, se for o caso, agir na hora certa.
A prudência manda, porém, que o remédio seja administrado com moderação para que surta os efeitos desejados. Entre as medidas em estudo pelo governo está o corte de 10% nas alíquotas de Imposto de Renda. Assim, quem hoje se encaixa na alíquota de 27,5% passaria a ser taxado com 24,75%; e quem paga 15% teria a tributação reduzida para 13,5%.
Há intenso debate dentro do governo sobre a conveniência desse tipo de medida. A razão parece estar com os economistas oficiais que advertem que cortes de impostos dessa natureza beneficiariam sobretudo a classe média - que, em tempos de crise, tende a cortar gastos. Haveria mais poupança privada, sem efeitos sobre consumo.
Da lista de propostas em estudo está também o corte do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) incidente nas operações de crédito. Esta seria uma medida, sem dúvida, justa, pois o governo simplesmente devolveria aos clientes bancários o aumento de tributação feito em janeiro, quando, a pretexto de compensar a perda de arrecadação com o fim da CPMF, elevou de 1,5% para 3,38% a alíquota de IOF incidente sobre empréstimos.
Como comprovam os impressionantes aumentos de arrecadação deste ano, era desnecessário o governo criar novos impostos para compensar a perda da CPMF. Deve-se reconhecer, porém, que, embora meritório, o corte do IOF teria efeito limitado para restabelecer a confiança de famílias e empresas.
Dentro do receituário de políticas keynesianas, a que teria efeitos concretos para estimular a economia é o aumento do gasto público, por meio preferencialmente de investimentos em obras. Em outros países, porém, a eficácia de políticas fiscais expansionistas dessa natureza tem sido colocada em xeque, pela demora natural dos governos em implementá-las. O Brasil não é exceção, e prova disso é a demora em concretizar os investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). O risco maior é a expansão fiscal chegar à economia tarde demais, quando a atividade já estiver em recuperação, exigindo que o setor privado reduza consumo e investimento para que o governo um pouco maior caiba no Produto Interno Bruto (PIB).
Políticas fiscais expansionistas também criam desequilíbrios, daí a preocupação em usá-las com parcimônia. Governos dos Estados Unidos, Europa e China estão hoje produzindo estímulos monumentais nas suas economia, que, mais adiante, vão aumentar as necessidades de financiamento. Espera-se, portanto, um período de juros mais altos no mundo todo, assim que as economias se recuperarem.
No Brasil, o cenário mais provável, por enquanto, é de uma desaceleração, não de queda, do PIB. A economia empobreceu com a crise, e deve sofrer ajustes. A desvalorização das "commodities" traz perda de receitas em dólares, e a absorção doméstica deverá encolher, sob pena de serem recriados desequilíbrios nas contas externas.