Título: Reunião da ONU sobre clima chega à fase ministerial
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Fonte: Valor Econômico, 08/12/2008, Especial, p. A12

A 14ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, que acontece em Poznan, na Polônia, entra na sua semana decisiva, quando chegam os ministros dos 190 países presentes para uma reunião de alto nível na quinta e sexta-feira, os últimos dias do encontro. Mas nenhum acordo importante deve ser assinado. O principal documento que sairá de Poznan já existe, foi feito por um brasileiro e tem o resumo de todas as propostas que foram sugeridas pelos países ao longo deste ano.

Luiz Alberto Figueiredo Machado é o chefe dos negociadores brasileiros e presidente da rodada de negociação do processo de longo prazo até o fim da CoP-14, o nome da conferência. É dele o documento de 84 páginas que condensa as centenas de propostas feitas pelos países e que serve de base às discussões. Este pode ser o documento mais importante da reunião, que indicará o rumo do processo.

Ontem, a maioria dos negociadores já presentes foi pega de surpresa e teve um feriado forçado, o que ilustra a Babel caótica que domina o debate da mudança climática. De um lado, em eventos paralelos, ONGs e cientistas pressionam por decisões urgentes e esforços muito maiores dos países. Repetem que é preciso fazer algo e rápido. Mas, dentro das salas oficiais, negociadores passam horas falando no jargão dos diplomatas, uma língua onde metas e compromissos de redução de emissões não significam a mesma coisa.

Nos eventos que ocorrem paralelamente à reunião oficial (uma agenda intensa de palestras promovidas por ONGs, institutos de pesquisa, agências da ONU, entidades empresariais etc) já se fala que é preciso um esforço global maior de corte de emissões a níveis que não permitam um aquecimento superior a 1,5°C na temperatura da Terra na metade do século, e que os cenários ruins apresentados pelo IPCC, o braço científico da ONU, em 2007, estão subestimados.

No espaço das negociações oficiais, várias reuniões ocorrem ao mesmo tempo, sob diversos assuntos, em discursos cifrados para quem não é iniciado. O senso comum espera que saia algo de concreto desta megaconferência, que começou dia 1º de dezembro e vai até o dia 12, mas isto é muito improvável.

Os ministros talvez acertem alguns detalhes e sinalizem a continuidade do processo. Desde o início, sabe-se que a CoP-14, a sigla para o encontro dos países que assinaram a convenção de mudança climática da ONU, é uma "CoP do meio". Está na metade do caminho entre a reunião de Bali, no ano passado, e a de Copenhague, no ano que vem - este sim o encontro de onde se espera que saia um acordo mundial para enfrentar as mudanças climáticas.

Uma das hipóteses é que ali se firme o Protocolo de Copenhague, uma espécie de Protocolo de Kyoto atualizado, muito mais rígido nos cortes de emissões de gases-estufa pelos países ricos e com bem mais contribuição dos países em desenvolvimento. Mas o novo acordo, uma espécie de Protocolo de Kyoto+, tem que ter um novo nome. Kyoto provoca rejeição no Congresso americano.

No processo de negociação em Poznan, os países em desenvolvimento têm apresentado muitas propostas. A Índia, por exemplo, sugeriu uma rede mundial de centros de tecnologia limpa com contribuições de todos os interessados - uma postura diferente do país que costuma cobrar a conta sempre das nações mais ricas e mais poluidoras.

O Brasil, em outro ponto do debate, defende que os países em desenvolvimento "implementem ações" que reduzam as emissões de gases-estufa, apoiadas financeira e tecnologicamente pelas nações desenvolvidas e que ajudem os emergentes a sair da curva ascendente de mais e mais emissões. "O cenário 'business as usual' não é possível", diz Machado. "O esforço tem que ser equitativo e tem que se agir já, não esperar 2012", continua.

As tensões da semana continuaram sendo as reclamações dos países do G-77 mais a China de que as nações desenvolvidas não estão avançando na discussão de novas metas de corte de emissões para o segundo período do Protocolo de Kyoto, depois de 2012. E que os países ricos têm escamoteado o debate tentando jogar a bola de maiores contribuições para os países em desenvolvimento. A União Européia tem uma proposta de corte mais avançada, que reduziria as emissões em 20% em 2020. Mas os países em desenvolvimento dizem que é pouco e que os cortes devem ser de pelo menos 45%. Há quem fale em 80%.

Não houve ainda avanços importantes no principal ponto do novo acordo - o financiamento e a transferência de tecnologia dos ricos para os demais. O Brasil e o G-77 querem que o fluxo de financiamento seja muito ampliado. "Tem que haver uma nova solidariedade internacional, tanto para a mitigação dos gases do efeito-estufa como para a adaptação aos impactos", continua. "E isso passa pela transferência de tecnologia, pelo financiamento e pela capacitação."