Título: Incertezas eleitorais
Autor: Campos, Ana Maria ; Tahan, Lilian
Fonte: Correio Braziliense, 28/02/2010, Cidades, p. 30

Diante de denúncias ainda sem perspectiva de acabar, forças políticas se rearrumam para o próximo embate nas urnas. Mesmo tendo representantes investigados, partidos abandonam o governo na tentativa de se descolar do escândalo

Na corrida ao Palácio do Buriti em 2002, Joaquim Roriz ganhou de Geraldo Magela. Os mesmos nomes emergem no cenário eleitoral de agora

Kleber Lima/CB/D.A Press - 9/2/10 O candidato do PT não está definido: Agnelo Queiroz tem grande apoio

Em três meses, as surpresas da Caixa de Pandora abateram os partidos que partilhavam o poder, isolaram as forças políticas na cidade e dividiram o grupo de oposição em busca de preencher o vazio provocado pela maior crise institucional da história da capital do país, iniciada em 27 de novembro do ano passado. Oito (1)das 13 legendas que apoiavam o governo de José Roberto Arruda produziram representantes no escândalo. Para evitar comprometimento ainda maior, as siglas adotaram uma tática de distanciamento da administração capitaneada, até 11 de fevereiro, pela dobradinha Arruda e Paulo Octávio. Nessa data, Arruda foi afastado e preso por suposta tentativa de suborno. Menos de duas semanas depois, o vice no exercício do mandado renunciou ao cargo. Acabava aí o único governo do DEM no país, que teve o diretório regional dissolvido por intervenção da executiva nacional.

O Inquérito nº 650 teve o efeito de uma bomba nas composições políticas vigentes nas últimas duas décadas da política candanga. A força de devastação das investigações protagonizadas pelo Ministério Público e a pela Polícia Federal (PF) partiu de uma vez por todas o grupo de poder nascido sob a liderança do ex-governador Joaquim Roriz (ex-PMDB e atualmente no PSC). Nas últimas eleições, seus herdeiros ganharam vida pública própria. Um deles, Arruda, chegou ao topo do poder no Distrito Federal, mas hoje está sob os escombros da crise. Roriz, Arruda, Paulo Octávio, Tadeu Fillippeli ¿ todos um dia transitaram no mesmo campo político. Em 2006, Arruda e Paulo Octávio chegaram a disputar o apoio de Roriz. Eram potenciais adversários, mas fizeram uma chapa puro-sangue, que acabou contando com a aceitação do ex-governador. Deu certo, Arruda foi eleito em primeiro turno e, até o início da crise, era considerado favorito para a disputa em 2010, numa provável polarização com seu criador, Roriz.

Estilhaços

No momento, Arruda tem como objetivo principal deixar a prisão. Paulo Octávio busca preservar seu patrimônio empresarial e Roriz tenta escapar dos estilhaços da Caixa de Pandora. Esse cenário, aparentemente, favoreceria a eleição de um político da oposição. Mas essa é uma interpretação que pode não se sustentar até 3 de outubro. Antes da crise, o PT não tinha perspectiva de poder, mas já escolhera candidato ao Executivo. Agnelo Queiroz havia consolidado seu nome para a disputa ao Executivo, num acordo fechado entre as forças políticas do PT. Àquela época, o deputado federal Geraldo Magela (PT) havia aceitado os termos de um acerto que o colocava na condição de candidato ao Senado. A possibilidade de vitória, provocada pela derrocada de Arruda e Paulo Octávio, desestabilizou a harmonia na legenda.

Magela tem cobrado a revisão do acordo em função de um fato novo revelado na crise. Agnelo Queiroz foi filmado na sala do ex-secretário de Relações Institucionais Durval Barbosa que lhe apresentou o conteúdo das bombásticas gravações sobre distribuição de dinheiro a autoridades, base do inquérito da Caixa de Pandora. O episódio causou constrangimento entre petistas e abriu uma brecha para adversários internos questionassem a candidatura de Agnelo, sob o argumento de que obteve informação privilegiada sobre o futuro cenário político. Agnelo garante que não houve nada além do normal e tem o apoio de grande parte da legenda. Mas o impasse só será resolvido em prévias que deverão ocorrer em 21 de março, para escolha direta do representante petista na corrida ao Palácio do Buriti.

Inimigos

Nos últimos tempos antes da crise, Joaquim Roriz tornou-se um inimigo de Arruda. O governador do DF, hoje afastado e preso preventivamente, tentou diferenciar as duas gestões, atacou a administração anterior e trabalhou nos bastidores para tomar o PMDB de Roriz. Por isso, Roriz poderia se beneficiar com o tombo de Arruda e Paulo Octávio. Mas seus adversários apostam que dificilmente o ex-governador vai conseguir se descolar das denúncias de Durval Barbosa, o delegado aposentado da Polícia Civil do DF que gerenciou todos os contratos de informática no governo de Roriz. Por causa dessa passagem pelo Executivo, Durval responde a 37 ações judiciais, algumas das quais ao lado do ex-governador.

Desde 27 de novembro, quando a PF cumpriu mandados de busca e apreensão na casa e no gabinete de autoridades do Executivo e do Legislativo, trazendo à tona um suposto esquema de corrupção no DF Roriz permanece recluso, em casa ou na fazenda. A única declaração pública sobre o assunto ocorreu na semana passada no programa de seu partido, o PSC. ¿É tão vergonho, tão escandaloso... Fico numa indignação, fico numa vergonha... Meu Deus do céu, como pode chegar nisso aí?¿, declarou. Mas a oito meses das eleições, período em que os pré-candidatos costumam se exibir em público ao eleitorado, o ex-governador mantém a discrição.

Alternância

A grande dúvida sobre o futuro das eleições deste ano é reforçada pela instabilidade política que ainda permanece. Só em fevereiro, o Distrito Federal teve três governadores. O eleito foi preso. O vice tentou se viabilizar, mas foi pressionado a renunciar e o deputado distrital Wilson Lima (PR), que conquistou o mandato na Câmara Legislativa com menos de 9 mil votos acabou herdando a administração praticamente esvaziada. Pelo menos cinco secretários já deixaram o governo. Numa entrevista concedida ao Correio, Wilson Lima falou de seu desejo de imprimir uma ¿cara nova¿ no GDF. Talvez não tenha tempo, diante da ameaça de uma intervenção federal.

Também na Câmara Legislativa há uma expectativa de renovação. Dos 24 distritais, um terço é investigados no Inquérito do STJ. Desses, Leonardo Prudente (que renunciou na sexta) e Rogério Ulysses não podem sequer concorrer à reeleição porque perderam a legenda. Oito parlamentares, além de dois suplentes, são citados no escândalo e o grupo de 19 distritais que apoiavam Arruda perdeu o palanque para as próximas eleições.

Poderosos secretários, administradores regionais, gerentes do governo Arruda abatidos com a crise vão ter que adiar os planos de se candidatar a um cargo eletivo neste ano. Até outubro do ano passado, havia um congestionamento de candidatos a vice de Arruda, ao Senado e a uma vaga de deputado federal.

1 - Lista Políticos filiados aos partidos DEM, PMDB, PR, PSB, DEM, PSDB, PP, PPS, PRP foram citados no Inquérito nº 650 do Superior Tribunal de Justiça, que investiga denúncias de corrupção envolvendo distritais, empresários e a cúpula do governo do DF

O número Seu voto Faltam 217 dias até o primeiro turno das eleições, marcado para 3 de outubro

Principais datas

27 de novembro de 2009 A Polícia Federal deflagra a Operação Caixa de Pandora, na qual investiga o suposto esquema de propina do GDF para a base de deputados aliados, com dinheiro repassado por empresas privadas. Durval Barbosa, até então secretário de Relações Institucionais do governo Arruda, é quem denuncia do esquema à PF. O inquérito sobre o caso está no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Quando as denúncias vêm à tona, Durval é exonerado.

28 de novembro É divulgado vídeo de um encontro entre José Roberto Arruda e Durval Barbosa durante a campanha eleitoral de 2006. As imagens mostram o então candidato recebendo dinheiro de Durval.

29 de novembro Pelo menos oito dos 24 deputados e dois suplentes da Câmara Legislativa (CLDF) são citados no inquérito como beneficiários do esquema. Eurides Brito (PMDB), Júnior Brunelli (PP) e Leonardo Prudente (então no DEM) aparecem em vídeo recebendo dinheiro de Durval Barbosa.

18 de janeiro de 2010 A Justiça determina o afastamento de Leonardo Prudente da presidência da Câmara Legislativa.

20 de janeiro O TJ decide que os oito distritais e os dois suplentes investigados não podem participar da tramitação dos pedidos de impeachment do governador.

25 de janeiro Prudente renuncia à presidência da Câmara.

2 de fevereiro Wilson Lima (PR) é eleito presidente da Câmara Legislativa.

4 de fevereiro Agentes da PF prendem Antônio Bento da Silva após ele entregar sacola com R$ 200 mil ao jornalista Edson Sombra. Na versão deste, o dinheiro seria um suborno para o jornalista desqualificar os vídeos feitos por Durval Barbosa. Na denúncia, Sombra implica Weligton Moraes, então chefe da Agência de Comunicação do governo; o distrital Geraldo Naves (DEM); e Rodrigo Arantes, secretário particular de Arruda. À polícia, Bento cita ainda o nome de Haroaldo de Carvalho, ex-diretor da CEB.

11 de fevereiro O STJ decreta a prisão preventiva dos seis citados acima. O vice-governador Paulo Octávio assume o GDF interinamente. O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, protocola no Supremo Tribunal Federal (STF) pedido de intervenção federal no DF.

18 de fevereiro Paulo Octávio, que havia divulgado à imprensa que renunciaria, desiste de sair. A Comissão de Constituição e Justiça da Câmara vota pela admissibilidade de três processos de impeachment contra Arruda e três contra Paulo Octávio.

23 de fevereiro Paulo Octávio renuncia. O presidente da Câmara Legislativa, Wilson Lima, assume o Executivo local.

25 de fevereiro A Comissão de Ética da Câmara abre processo por quebra de decoro parlamentar contra os distritais Eurides Brito, Júnior Brunelli e Leonardo Prudente. Mas suspende os processos dos outros cinco deputados citados na da Caixa de Pandora.

26 de fevereiro Comissão Especial da Câmara aprova parecer favorável à abertura de processo de impeachment contra José Roberto Arruda. Leonardo Prudente renuncia ao mandato.