Título: Vale busca atingir "investment grade
Autor: Cristiane Perini Lucchesi
Fonte: Valor Econômico, 28/02/2005, CAPTAÇÕES EXTERNAS, p. Fs

A Companhia Vale do Rio Doce (CVRD), maior mineradora de minério de ferro do mundo, trabalha em 2005 com a expectativa de ser elevada pelas agências de avaliação de risco crédito ao grau de investimento ("investment grade"), espécie de selo de investimento não-especulativo. Para tentar chegar lá, a companhia já alongou o perfil de sua dívida, reduziu a participação dos juros flutuantes na formação de seu passivo, vai renovar em maio com um grupo de bancos um crédito externo de US$ 500 milhões - que lhe garante recursos em casos de crise internacional de liquidez - e planeja ir ao mercado internacional captar US$ 1 bilhão durante este ano. A gigante exportadora foi a segunda colocada no "Ranking Valor de Captações Externas" por tomador em 2004, com US$ 1,2 bilhão em recursos captados no exterior. "Uma empresa que chega ao grau de investimento tem custo de captação de recursos 300 pontos básicos menor", explica o diretor executivo de Finanças, Fábio Barbosa. O impacto do valor da empresa no mercado é imediato, avalia ele. "Uma empresa com a mesma geração de caixa, mas com nota de crédito maior, tem mais valor de mercado que a Vale. O custo de capital é fundamental para poder aumentar o valor de mercado da companhia", lembra Barbosa. Em busca do "investment grade", a empresa vai tentar renovar em maio uma linha de crédito stand-by (contingente) de US$ 500 milhões fornecida pelo Citigroup, ABN AMRO, HSBC, Santander, Société Générale e Tóquio/Mitsubishi. A idéia, segundo ele, é buscar ampliação de prazos e do valor e redução de custos. O crédito stand-by é como uma espécie de cheque especial -a empresa paga uma comissão para ficar com a linha disponível, mas só usa se precisar. "Se acontecer alguma catástrofe - que acreditamos não vai acontecer - e a Vale não conseguir captar, temos recursos lá fora garantidos para honrar nossos compromissos." De acordo com ele, esse tipo de linha, também tomada pela Votorantim, reduz o risco de liquidez da companhia e melhora a nota de crédito junto às agências de rating. Também como estratégia para atingir o grau de investimento, a Vale tem se empenhado em se tornar uma companhia cada vez mais conhecida dos grandes investidores globais. No final de janeiro e início de fevereiro, Fábio Barbosa viajou para Austrália e Hong Kong para divulgar a companhia junto a grandes investidores locais. Ele contou que tem ido duas vezes por ano à Austrália para vender a companhia para investidores institucionais e gerentes de fundos mútuos. Em Hong Kong, Barbosa participou de conferência da área de renda fixa sobre emissão de papéis. O perfil da dívida da empresa veio melhorando nos últimos anos. Antes, a participação da taxa de juro flutuante era de 71% no total da dívida. Hoje, é de 50%. O prazo médio de vencimento da dívida era em setembro do ano passado de 6,5 anos, ante 2,9 anos em 31 de dezembro de 2002, conta Barbosa. A relação entre a dívida bruta da empresa e sua geração de caixa operacional (Ebitda) passou de 2,05% para 11,34%, o que significa que bastam 15 meses de geração de caixa operacional para o pagamento de toda a sua dívida bruta. Em 2001, o prazo era de 24 meses. A relação entre a dívida total e o valor da empresa também melhorou, saindo de 25% para 16,2%, enfatizou. Para conseguir o grau de investimento, a direção da mineradora também encaminhou ao Banco Central, em dezembro de 2003, a proposta de desobrigar as empresas que são exportadoras líquidas da repatriação mandatória das divisas geradas até o limite equivalente a 12 meses de serviço da dívida. A medida permitiria que essas grandes empresas tivessem a possibilidade de sempre manter no exterior um ano de serviço da dívida, reduzindo o risco de um controle cambial impedir o pagamento. A proposta, segundo ele, ajuda a lidar com esta desvantagem comparativa para as empresas brasileiras, que é o custo de capital. "Já ouvi de algumas agências de rating que a legislação cambial atrasada, que implica em certos mecanismos de controle defasados, aumenta o risco de crédito das empresas brasileiras", afirmou. Segundo ele, a medida beneficiaria em muito a Vale, que está apenas um degrau abaixo do grau de investimento e com perspectiva de alta da nota de crédito (outlook positivo). "Costumo brincar que estamos a meio grau do 'investment grade'", disse Barbosa. "Se o Brasil se mover ou se as agências entenderem que empresas como Vale e Petrobras podem se mover na boa direção, muito provavelmente vamos conseguir o grau de investimento este ano ainda." Barbosa ressalta ainda que o plano de captação externo da Vale neste ano "está de acordo com a manutenção da alavancagem da companhia em níveis extremamente prudentes". O total a ser captado, de US$ 1 bilhão, será suficiente para fazer frente às amortizações de US$ 700 milhões, aproximadamente, e também aos pagamentos de juros de US$ 250 milhões. O executivo disse que o programa de captação de 2005 é consistente com o nível de investimento anunciado, de US$ 3,3 bilhões, e com o nível de dividendo mínimo também anunciado no final de janeiro, de US$ 1 bilhão. Barbosa pretende implementar este programa buscando recursos junto a agências de crédito à exportação de países ricos, como o JBIC, banco japonês de desenvolvimento, e a agência alemã KFW, dentre outras. Também poderá acessar o mercado de capitais externo com uma operação de bônus "que muito provavelmente teria o objetivo de fixar mais um ponto na estrutura a termo dos papéis da Vale." Ele relatou que a companhia já tem um papel com vencimento em 2013 e um de vencimento em 2034, lançado com grande sucesso no ano passado. A Vale colocou US$ 300 milhões em títulos de 30 anos e teve demanda de US$ 500 milhões. Barbosa relatou que o rendimento dos bônus da Vale pagam no mercado secundário quase 100 pontos básicos abaixo dos juros pagos pelos títulos da República. "Se formos ao mercado de capitais, temos que consolidar este avanço em termos de prazo médio que já conseguimos", disse. Ele não descartou também operações de crédito vinculado à exportação. Neste ano, existe uma "uma situação bastante confortável do ponto de vista de nível de captação, até mesmo melhor que a do ano passado". Segundo ele, a empresa tem um fluxo de caixa crescente, mesmo assumindo um preço constante do minério. De acordo com o executivo, o fluxo de caixa da Vale está crescendo por conta do volume de produção esperada para 2005. "Temos a mina de Fábrica Nova (MG) entrando com mais 10 milhões de toneladas de produção, Carajás com mais 7 milhões de toneladas, mais a própria Minerações Brasileiras Reunidas, controlada da Caemi", disse. Segundo o executivo, há um aumento de produção de minério de ferro e um aumento do efeito de doze meses do cobre. "No potássio também estamos expandindo a produção em 40% este ano", disse. "Independente do resultado nas negociações de preços do minério de ferro, temos um fluxo de caixa confortável", conclui.