Título: Governo estuda linha de crédito para ajudar na rolagem da dívida
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 09/12/2008, Finanças, p. C1

O governo estuda criar uma nova linha de empréstimo em moeda estrangeira com recursos das reservas internacionais para ajudar a financiar a conta de capitais do balanço de pagamentos, a exemplo do que já foi feito para o comércio exterior. A medida se justificaria diante da forte queda na taxa de rolagem da dívida externa de médio e longos prazos do setor privado, que representava 18% dos vencimentos de empréstimos e papéis ocorridos em novembro, até o dia 24.

O modelo seria parecido com o adotado para as exportações, no qual o Banco Central faz empréstimos em moeda estrangeira para as instituições financeiras com prazo de até um ano, garantidos por operações de Adiamento sobre Contratos de Cambio (ACCs) e Adiantamento sobre Cambiais Entregues (ACEs). Em 2009, os vencimentos previstos da dívida externa do setor privado, incluindo instituições financeiras públicas, somam US$ 23,628 bilhões. Mantida a atual taxa de rolagem da dívida, de 18% dos vencimentos, as empresas e bancos teriam que levantar cerca de US$ 19 bilhões no mercado doméstico de câmbio para honrar seus compromissos no exterior no ano que vem.

Outro obrigação importante da conta de capitais em 2009 é a dívida externa de curto prazo (com vencimento em um ano), que somava US$ 49,058 bilhões em outubro. De certa forma, porém, o governo já encaminhou uma solução para esse problema, já que a maior parte desse débito (US$ 29,929 bilhões) é formada pelas linhas de financiamento a exportação. O BC assumiu o compromisso de atender, por meio de empréstimos em moeda estrangeira garantidos por ACCs e ACEs, 100% da demanda por financiamento a exportações.

Foi justamente o sucesso do modelo de empréstimo em moedas estrangeiras que levou o governo a cogitar estendê-lo para financiamentos de importação e para compromissos da conta de capitais, com foco nas amortizações de médio e longo prazo. A divida externa de curto prazo vinculada a importações somava US$ 4,837 bilhões em outubro. Na atual crise, as linhas de empréstimo estão sendo usadas em países de todo o mundo. Ele representa duas vantagens para os bancos centrais. Primeiro, permite fornecer liquidez temporária aos mercados, para lidar com uma crise que é temporária. Segundo, preservam as reservas internacionais, porque os empréstimos em moeda estrangeira não representam venda definitiva de divisas ao mercado.

O BC tem fornecido dólares ao mercado porque não considera que a falta de dólares é permanente. Se fosse permanente, deixaria o mercado fazer o ajuste por meio da taxas de câmbio. No caso das financiamentos a exportações, a expectativa é que os bancos estrangeiros retomem as linhas de financiamentos a contrapartes brasileiras assim que o pior da crise passar. A balança comercial e os demais itens das contas correntes, de outro lado, deverão reagir em algum momento à desvalorização cambial, reduzindo as necessidades de financiamento externo.

Se o BC deixasse de agir, a taxa de câmbio iria sofrer agora uma depreciação ainda mais aguda, voltando a se apreciar mais adiante, quando o pior da crise internacional passasse. Para evitar essa volatilidade indesejada da cotação do dólar, a autoridade monetária faz intervenções.

Do agravamento da crise internacional, em setembro, até novembro, o BC fez US$ 3,8 bilhões em empréstimos em moeda estrangeira garantidos por ACCs e ACEs, com recursos dirigidos exclusivamente ao financiamento de exportações. Também emprestou aos bancos US$ 1,5 bilhão garantidos por títulos da dívida externa, neste caso para aplicar em exportações e em importações. Outra intervenção importante foi a venda de US$ 6,4 bilhões ao mercado com compromisso de recompra, sem direcionamento na aplicação dos recursos pelo mercado.

Em todos esses casos, as reservas sob o conceito de liquidez internacionais não foram afetadas. Pelo dado mais recente, da última sexta, as reservas internacionais estavam em US$ 207,539 bilhões, valor muito parecido com os US$ 207,575 bilhões registrados em 15 de setembro, dia da quebra do Lehman Brothers, considerado o marco do agravamento da crise mundial.

O volume de reservas foi poupado porque, quando o BC faz operações de empréstimos, continua a ter ativos em dólares. O que muda é que, em vez de um título de um país desenvolvido ou um depósito num banco estrangeiro, o BC passa a ter um crédito contra um banco brasileiro. A autoridade monetária também vendeu US$ 6,7 bilhões em leilões no mercado à vista, que, em tese, deveriam ter provocado queda nas reservas. Essa saída de recursos, porém, foi compensada pela valorização das aplicações que o BC faz em títulos do Tesouro americano.

As reservas internacionais só são sensibilizadas no conceito de caixa, que procura medir os ativos prontamente disponíveis. Nesse conceito, as reservas caíram a US$ 194,668 bilhões no fim de novembro. Nesses números, não está incluída a linha de "swap" cambial colocada à disposição do BC pelo Federal Reserve, que as autoridades brasileiras ainda não decidiram se vão usar.