Título: Administrações têm conseguido gerar superávits primários nos últimos anos
Autor: Felicio , César
Fonte: Valor Econômico, 30/12/2008, Política, p. A4

Mesmo com adesão a programas do governo federal e o conseqüente aumento de atribuições em áreas sociais como saúde, o conjunto dos municípios brasileiros tem conseguido gerar superávits primários, isto é, sobra de receita genuína, não decorrente de endividamento, para pagar juros e outros encargos de dívida.

No período de 2002 a 2007, só 2003 não foi ano de saldo positivo no resultado fiscal primário desse segmento do setor público, informa a Confederação Nacional de Municípios (CNM). Em relação a 2008, o número oficial ainda não foi levantado, mas a expectativa da entidade é de que se registre novo superávit. Convertido a preços de 2008, o resultado de 2007 indica saldo positivo em R$ 7,138 bilhões. Esse não foi um resultado tão bom quanto o de 2005, equivalente R$ 10,14 bilhões quando convertido a preços de 2008. Mas foi melhor do que o de 2002, 2004 e 2006.

Os municípios obtiveram superávit primário quase todos os anos, desde 2000, mesmo com elevação real de investimentos públicos. Corrigidos para preços de 2008, esses investimentos equivaleram a R$ 16,26 bilhões em 2000. Já em 2007, alcançaram, também em valores corrigidos até 2008, o equivalente a R$ 24,36 bilhões, o que representou aumento real (acima da inflação) de 49,81% em sete anos.

No mesmo período (2000-2007), as despesas de custeio da máquina administrativa dos municípios cresceram 46,1% acima da inflação, portanto, em ritmo ligeiramente inferior ao dos investimentos. Já as de pessoal subiram 59,3%, ritmo bem superior ao dos investimentos (49,81%).

Segundo a CNM, o item pessoal foi o que mais cresceu ao longo de anos porque é o mais afetado pela descentralização de políticas pública de saúde e educação. Para se ter uma idéia das transferência de responsabilidades, a assessoria técnica da CNM conta que, no fim da década de 80, a União tinha cerca de 800 mil servidores na área de saúde. Desde então, esse número vem caindo e hoje está em cerca de 40 mil, apenas 5% do que era. Essa redução das equipes federais teve de ser compensada com aumento de funcionários nas prefeituras, diz a CNM, referindo-se à execução de políticas de saúde como atendimento em postos, Programa Saúde da Família, Agente Comunitários de Saúde, entre outros.

Na média, as despesas primárias municipais cresceram 48,5% acima da inflação de 2000 a 2007, percentual inferior ao do crescimento real médio das despesas, que foi de 50,6%, ainda segundo números da CNM. Na avaliação de Paulo Kiulkosky, presidente da confederação, essa é mais uma evidência de que o custo da descentralização de políticas públicas federais está recaindo sobre os municípios.

Ziulkosky avalia que, nesse quadro de aumento de atribuições, a situação das finanças públicas municipais só não piorou porque tem havido esforço das prefeituras para melhorar suas estruturas de arrecadação e de fiscalização tributárias. Um reflexo desse esforço é a evolução da arrecadação do ISS, principal tributo próprio municipal. Medida a preços de 2008, a receita de ISS subiu 62% acima da inflação de 2002 a 2007, refletindo uma maior atividade econômica no setor de serviços. Ou seja, cresceu em cinco anos mais do que o conjunto das receitas municipais em sete anos.

Em termos nominais, a evolução da receita de ISS foi de 132,2% de 2000 a 2007. Para 2008, a CNM projeta arrecadação de R$ 22,01 bilhões em ISS, o que elevaria para 167% a variação nominal acumulada desde 2000 e para 73,5% a variação real do fluxo anual de pagamentos do tributo.

Olhando as administrações municipais de forma agregada, o alívio propiciando pela disparada da arrecadação de ISS também permitiu aos prefeitos dos dois últimos mandatos manter a dívida líquida sobre controle. Medido a preços de 2008, o saldo da dívida consolidada líquida das administrações municipais fechou 2007 em R$ 58,96 bilhões. Em termos reais, esse saldo é ligeiramente superior ao do fim de 2000, que, convertido a preços de 2008, equivale a R$ 58,41 bilhões. Relativamente a dezembro 2003, no entanto, a dívida consolidada líquida dos municípios caiu, pois, naquela data, chegou ao equivalente a R$ 74 bilhões em valores atualizados.