Título: Sem apoio para continuar
Autor: Rothenburg, Denise
Fonte: Correio Braziliense, 24/02/2010, Cidades, p. 23

Paulo Octávio tentou reunir forças políticas para governar o DF, mas ficou isolado no DEM e na Câmara Legislativa. Família pediu a saída

No último sábado, o então governador Paulo Octávio preparou um churrasco para 30 pessoas. Esperava reunir deputados distritais, líderes políticos e, assim, ganhar musculatura para governar o Distrito Federal até dezembro. Apareceram apenas cinco e alguns nem ficaram para comer. Para a família do governador, acostumada a reuniões concorridas em que sempre o número de comensais supera a previsão inicial, era a senha. Até dona Vilma Pereira, a matriarca, respeitada e querida por políticos de todas as matizes, começou a dizer ao filho que a batalha estava perdida e a melhor saída era mesmo deixar o cargo.

O governador passou o fim de semana em conversas com distritais e integrantes da executiva nacional do Democratas. Tentou fazer com que seus correligionários entendessem que, sem apoio do DEM, seria impossível permanecer, especialmente, com um processo de impeachment em curso. Chegou inclusive a propor que o ex-ministro da Educação e ex-senador Hugo Napoleão assumisse a Secretaria de Educação. Acreditava na hipótese de ainda recuperar a imagem do governo local como o ¿cartão de visitas do DEM¿. Na última conversa com o senador Agripino Maia, de quem é amigo, foi direto: ¿Ou vocês me apoiam ou estou fora¿.

Àquela altura, no entanto, a locomotiva que Paulo Octávio pensava em colocar para funcionar com o apoio do DEM já estava fora dos trilhos. O que provocou o descarrilamento, na visão do comando do DEM, foi o vaivém do governador em exercício. Desde a prisão de José Roberto Arruda, Paulo Octávio não conseguiu se firmar no comando do GDF. Na sexta-feira véspera de carnaval, disse em entrevista ao Correio que sabia do fato de virar alvo e que tentaria uma união por Brasília. Se não conseguisse essa união, não teria como continuar. Antes mesmo de conceder a entrevista, já teria que responder sobre a ordem do DEM para que todos os filiados do partido deixassem seus cargos no governo local. O governador ainda tentou dizer que a determinação não lhe dizia respeito, uma vez que tinha a obrigação constitucional de assumir, mas não colou.

Expulsão

Uma semana depois de virar governador, Paulo Octávio perdeu totalmente o controle do comboio. Ao anunciar a renúncia às 15h40 de quinta-feira passada e, menos de duas horas depois, ler uma carta de permanência no governo em que se dizia pronto para renunciar, sua gestão virou um lusco-fusco. Na Câmara Legislativa, os distritais encheram os olhos diante da possibilidade de tomar conta do GDF. E, no plano nacional, o fato de ter dito que o presidente Lula havia lhe pedido para ficar, uma versão rechaçada pelo Planalto, irritou o comando do DEM. Assim, Paulo Octávio chegou à sexta-feira pós-carnaval sem o apoio da cúpula nacional do partido e com todas as pessoas de renome que convidara para o governo inseguras quanto à possibilidade de auxiliar alguém que estava com a carta de renúncia pronta.

Há dois dias, ele ainda cogitou permanecer no DEM. Ainda ontem pela manhã, quando leu nos jornais declarações do líder do partido na Câmara, Paulo Bornhausen, na linha de ¿ou sai do DEM ou será saído¿, Paulo Octávio tentou conversar com alguns líderes do partido para saber quais eram as suas chances na Comissão Executiva Nacional. Descobriu que seria massacrado, uma vez que, num ano eleitoral, o rufar dos tambores da expulsão, comandado pelo senador Demostenes Torres e pelo deputado Ronaldo Caiado, ambos de Goiás, ecoou por vários estados. Foi então que telefonou, no início da tarde, ao presidente do DEM, Rodrigo Maia.

A conversa foi lacônica. Quando o governador disse que sairia do partido, Maia respondeu que, infelizmente, não poderia pedir que ficasse e explicou que, embora não houvesse nada que desabonasse a conduta de Paulo Octávio como governador, seria impossível criar um clima favorável, uma vez que o DEM estava decidido a ficar fora da crise do DF. A carta entregue ao presidente do DEM foi seca. Apenas comunicava a desfiliação, sem entrar em detalhes. Para os comandantes do partido, ele não tinha mais o que dizer. ¿Amanhã o partido encaminharia processo de expulsão, o que provocaria um desgaste muito maior a ele¿, afirmou Rodrigo Maia.

O que mais ajudou na propagação do barulho de Demostenes e Caiado, no entanto, foi o fato de os democratas não terem a menor segurança de que não surgirá mais nada contra o seu mais novo ex-filiado. Ontem, todos os caciques do partido respiraram aliviados, porque acreditam que não terão mais de responder pelo escândalo. O sonho do comando democrata agora é substituir a tarja ¿mensalão do DEM¿ por ¿mensalão do Distrito Federal¿.

A família do vice-governador também respirou aliviada. Agora, Paulo Octávio poderá seguir os planos anteriores à prisão de Arruda. Ele planejava fazer uma viagem, sair de cena e, assim, dar tempo ao tempo. Quem sabe, no futuro, consegue voltar aos churrascos concorridos como um dos anfitriões mais prestigiados da cidade.

Amanhã o partido encaminharia processo de expulsão, o que provocaria um desgaste muito maior a ele¿

Rodrigo Maia, presidente nacional do DEM

Possível dissolução

A renúncia do governador em exercício e sua saída do Democratas não afasta a possibilidade de dissolução do diretório do DEM do Distrito Federal. O assunto será discutido hoje na reunião da executiva nacional marcada para o fim da manhã, na sede do partido. Ontem, o senador Adelmir Santana (DEM-DF) procurou o presidente do DEM, Rodrigo Maia, para tentar negociar uma autodissolução com a nomeação de uma direção provisória. Essa decisão será tomada hoje.

A intenção do Democratas é recomeçar do zero. Tudo de novo, buscar novos filiados. Para 2010, a ordem é aproveitar o ¿material¿ que sobrou para tentar essa reconstrução. Nesse quadro, o partido inclui o senador Adelmir Santana, suplente de Paulo Octávio que assumiu o mandato em 2006; os deputados Osório Adriano e Alberto Fraga; e aqueles que, sem um mandato eletivo, deixaram os postos no GDF para ficar com o partido. Esses nomes são a esperança do DEM local de conquistar algum espaço político em 2011 (DR).

Perfil - Paulo Octávio Sonho de ser governador

Juliana Boechat

O empresário Paulo Octávio iniciou a carreira política em 1986 com um sonho: alcançar a cadeira de governador do Distrito Federal. No último dia 11, logo após a prisão do governador José Roberto Arruda, conseguiu o que queria, mesmo em caráter provisório. Doze dias depois, no entanto, ele se desfiliou do DEM (ex-PFL), partido que ajudou a criar no Distrito Federal, e renunciou ao cargo de vice-governador do Distrito Federal por falta de apoio político. Um dos maiores empresários do ramo imobiliário de Brasília, Paulo Octávio decidiu se dedicar integralmente às suas empresas. Com 60 anos completados no último dia 13, tem dois filhos com Anna Christina Kubitschek, neta do ex-presidente da República Juscelino Kubitschek.

Paulo Octávio chegou a Brasília em 1962. O filho de dentista de classe média cursou economia na Universidade de Brasília (UnB). Em 1975, casado com a filha do ministro da Marinha Maximiniano da Fonseca, entrou no mercado imobiliário. Em parceria com o empresário Sérgio Naya, maior acionista do Palace II no Rio de Janeiro, ele construiu o Hotel St. Paul, no Setor Comercial Sul, coração da capital federal. Em seguida, assinou o Hotel Kubitschek Plaza, o Centro Empresarial Brasil 21 e o Brasília Alvorada (antigo Blue Tree). Paulo Octávio controla 20 empresas em Brasília, o que o torna um dos homens mais ricos do Brasil, com bens declarados em pelo menos R$ 323 milhões.

Durante a juventude, Paulo Octávio andava com o ex-presidente da República Fernando Collor de Mello e o senador cassado Luiz Estevão. Em 1986, filiou-se ao PFL e começou a carreira política. Três anos depois, atuou ativamente na campanha pela presidência do amigo Collor. Em 1990, foi o segundo mais votado para a vaga de deputado federal pela coligação PRN/PFL ¿ durante o mandato, ele foi um dos deputados que votou contra o impeachment de Collor.

O empresário e político manteve boa popularidade nas eleições seguintes. Nas eleições de 1994, recebeu 29.369 votos e ficou em sexto lugar na disputa por uma vaga de deputado federal ¿ oito cadeiras estavam em jogo. Apesar da expressiva votação, ele não conseguiu a reeleição para a Câmara dos Deputados por causa do coeficiente eleitoral ¿ foi candidato pelo PRN, numa coligação com o PFL, com o PV e o PRP. Em 1998, Paulo Octávio assumiu novamente um lugar como deputado federal. Em 2002, elegeu-se senador na chapa encabeçada pelo ex-governador Joaquim Roriz, ainda no PMDB. Quatro anos depois, deixou o cargo para concorrer ao governo do Distrito Federal.

Mas a cúpula do DEM interveio na política local. O diretório nacional da legenda convenceu Paulo Octávio a ficar com a vaga de vice-governador de Arruda com a promessa de que, quatro anos depois, a cadeira máxima do executivo do DF seria dele. Durante o mandato de Arruda a promessa já foi quebrada. E, com os últimos escândalos de suposto desvio de dinheiro e suborno envolvendo chefes dos três poderes do Distrito Federal, os planos para o futuro político de Paulo Octávio acabaram sepultados. Em 24 anos de vida política, o empresário e político pôde degustar apenas 288 horas como governador do Distrito Federal.