Título: Pedro do Ovo na berlinda
Autor: Tahan, Lilian ; Medeiros, Luísa
Fonte: Correio Braziliense, 24/02/2010, Cidades, p. 27

Para evitar a intervenção no DF, deputados estão dispostos a cassar todos os distritais citados nas investigações da Polícia Federal, inclusive o suplente de Wilson Lima

Começa hoje a fritura de Pedro do Ovo (PRP). Com a saída de Wilson Lima (PR), o suplente assume a vaga de distrital. Mas tão logo seja formalizada a posse do deputado, ele será alvo de uma representação da Mesa Diretora por quebra de decoro. Pedro do Ovo é um dos nove políticos investigados na Operação Caixa de Pandora. Ele é acusado pelo ex-secretário de Relações Institucionais Durval Barbosa de receber dinheiro para votar projetos de simpatia do governo. Pedro do Ovo e Berinaldo Pontes foram os dois substitutos de parlamentares citados no Inquérito nº 650, do Superior Tribunal de Justiça.

Apesar das suspeitas, na condição de suplente nenhum processo poderia correr na Câmara contra Pedro do Ovo. Mas como assumirá a titularidade do mandato, ele se tornará alvo de um possível processo por quebra de decoro parlamentar. ¿É natural que a Mesa Diretora faça uma representação recomendando a abertura de processo para investigar a conduta do deputado, já que ele também foi citado na Operação¿, afirmou Raimundo Ribeiro (PSDB), corregedor Ad hoc dos outros oito deputados supostamente envolvidos no escândalo. Ele afirmou, no entanto, que o eventual processo de Pedro do Ovo terá novo relator: ¿Não serei eu a relatar esse processo também¿.

Vício No dia em que ganhou status de distrital, Pedro do Ovo arriscou uma manobra para colocar em xeque toda a investigação em curso no STJ relacionada à suposta compra de votos dos parlamentares, da qual é alvo. Entrou no Supremo Tribunal Federal (STF) pedindo a transferência da investigação para a Corte máxima. Alegou um vício no processo, o de que um dos investigados, o deputado federal Augusto Carvalho (PPS) tem foro especial no STF e que, portanto, não deveria ser investigado no STJ. Pedro do Ovo chegou a pedir o arquivamento do inquérito. Ele afirmou que a subprocuradora da República Raquel Dodge agiu de forma ¿temerária, com má-fé e deliberadamente omitindo fato de que dentre os noticiados pela prática de suposto crime estava o deputado federal Augusto Carvalho, que tem prerrogativa de foro especial¿.

Na tarde de hoje, Raimundo Ribeiro apresentará relatório provavelmente recomendando a abertura de processo contra os oito deputados citados na Pandora, além de Cabo Patrício (PT), acusado de beneficiar os negócios de Leonardo Prudente em contratos do lixo. Com a recomendação, ficará nas mãos da Comissão de Ética julgar se os distritais devem perder o mandato. Apesar da pressão, principalmente sobre os distritais que aparecem em vídeo recebendo dinheiro de Durval, eles negam a intenção de se antecipar e renunciar ao mandato.

Leonardo Prudente chegou na Câmara antes da leitura da carta de renúncia do ex-vice-governador Paulo Octávio (sem partido) e garantiu aos jornalistas que ficará no cargo para se defender das acusações de quebra de decoro parlamentar. ¿Não existe essa possibilidade (renúncia). Estou preparado para enfrentar o processo. Vou me defender aqui na Casa¿, assegurou. Eurides Brito também manteve o mesmo discurso firme quanto à sua suposta saída. ¿Não integro o grupo de covardes deste país. Integro o grupo de pessoas que, quando recebem acusações, ficam até o fim¿, justificou. A assessoria de imprensa de Júnior Brunelli (PSC), que está afastado das atividades parlamentares por um atestado médico, informou que o distrital não falou ainda sobre a hipótese de renúncia.

Distritais unidos em defesa da autonomia

Luísa Medeiros Em meio à crise institucional da Câmara Legislativa, o único ponto de convergência entre deputados governistas e oposicionistas é a torcida contra a intervenção federal pedida pela Procuradoria-Geral da República (PGR). Nenhum dos distritais apoia a tese do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, de que a linha sucessória prevista na Lei Orgânica do Distrito Federal está contaminada. Depois da renúncia de Paulo Octávio (sem partido), os parlamentares voltaram a afirmar que não há necessidade de o Supremo Tribunal Federal (STF) adotar a medida drástica, chamada também de ¿golpe¿, e que hoje deputados da Casa devem focar na busca de soluções para estancar a crise.

O distrital Raimundo Ribeiro (PSDB) mostrou boa vontade para construir uma sustentação política para o novo governador interino do DF, Wilson Lima (PR).O tucano disse que seu partido é contrário à intervenção no DF: ¿Estamos preocupados com a possibilidade do golpe que alguns querem dar contra Brasília¿, afirmou. ¿Wilson merece, no mínimo, o crédito de confiança necessário para desenvolver seu trabalho¿, disse aimundo Ribeiro.

Para Paulo Tadeu (PT), as decisões tomadas na Câmara Legislativa podem ser fundamentais para afastar a hipótese de uma intervenção federal. ¿A melhor saída contra a intervenção são as respostas efetivas do Legislativo em relação ao escândalo (o suposto esquema de corrupção revelado pela Operação Caixa de Pandora), como dar prosseguimento às investigações e punir os responsáveis¿, afirmou o petista. O colega de partido e atual presidente da Casa, Cabo Patrício, compartilha da mesma opinião: ¿A Câmara tem que acabar com a crise. Nós trabalharemos para que não haja a intervenção¿.

O procurador-geral da República esclareceu na última segunda-feira que o pedido de intervenção federal se estenderia ao Legislativo local, além do Executivo. Ontem, Roberto Gurgel disse que a renúncia de Paulo Octávio é um indício da falência das instituições no DF e que não há outra solução senão a intervenção. ¿A crise, infelizmente, continua. E infelizmente o Ministério Público continua convencido de que não há alternativa outra que a intervenção¿, afirmou.

Ombros Apesar de ter lamentado a renúncia de Paulo Octávio e a desfiliação dele do Democratas, Eliana Pedrosa (DEM) assegurou que Wilson Lima tem condições institucionais para assumir o GDF porque há ¿uma linha sucessória clara¿. ¿Ele (Paulo Octávio) teve coragem de deixar um dos postos mais importantes da cidade. Temos que começar uma nova história para deixar o fantasma da intervenção cada vez mais distante. A governabilidade, agora, está nos nossos ombros¿, alertou.

A deputada rechaçou as declarações do ministro da Justiça, Luiz Paulo Barreto, que classificou como grave a crise provocada pelas denúncias de corrupção do DF e criticou a atuação da Câmara Legislativa diante disso. ¿É triste que a Justiça disse que só agora, a toque de caixa, a Câmara está trabalhando. É lamentável e desastrosa a declaração do ministro da Justiça¿, afirmou Eliana.

O ministro da Justiça declarou que as manobras casuísticas adotadas pela Câmara não adiantariam para impedir uma intervenção federal. ¿Soluções mágicas adotadas a toque de caixa pelo Legislativo local, como a cassação de três ou quatro deputados, não adiantarão de nada.¿

Eliana Pedrosa pediu que a Câmara faça um comunicado ao ministro para o que ela qualifica de ¿fala irresponsável¿. ¿Merecemos respeito¿, cobrou a deputada, ao lembrar que o Legislativo local segue todo o ordenamento jurídico.

Análise da notícia Além dos partidos

A crise que se abateu sobre o Distrito Federal nos últimos três meses levou à prisão do governador e à renúncia de seu vice. O Palácio do Buriti agora será comandado pelo deputado Wilson Lima, que ocupava a presidência da Câmara Legislativa, mas os rumos políticos e institucionais da capital da República devem ser responsabilidade de toda a classe política. Acima de qualquer diferença partidária ou pessoal, é hora de as lideranças políticas se unirem para afastar o fantasma da intervenção federal.

Além de significar um desrespeito à autonomia do DF, a intervenção representaria uma queima de etapas. Isso porque não pesa sobre o novo governador em exercício, Wilson Lima, qualquer tipo de acusação ligada às denúncias da Operação Caixa de Pandora, o que legitima sua condição para, neste momento delicado de turbulência, conduzir o governo daqui para a frente.

Mais uma chance de defesa

HELENA MADER

Antes de marcar a sessão plenária para discutir o pedido de intervenção federal, apresentado pela Procuradoria-Geral da República, o Supremo Tribunal Federal (STF) pode fazer uma audiência pública para discutir o assunto. Essas reuniões são priorizadas nas votações de temas polêmicos e mais técnicos, como a aprovação de pesquisas com células-tronco ou as cotas raciais em universidades. Mas o presidente do STF e relator do processo, ministro Gilmar Mendes, é favorável à realização de audiências públicas nos casos de pedidos de intervenção federal. Ontem à tarde, foi entregue na Câmara Legislativa o ofício do STF, comunicando que a casa tem prazo de cinco dias para se manifestar sobre o assunto. Depois desse prazo, os ministros poderão fixar a data da votação que definirá o futuro político do DF.

Em 2006, Gilmar Mendes sugeriu ao então senador José Jorge a apresentação de um projeto de lei para criar regras para ¿as representações interventivas perante o Supremo Tribunal Federal¿. O assunto é regulamentado pelos artigos 34 e 35 da Constituição da República. Depois de ser aprovado no Senado, o projeto de lei chegou à Câmara dos Deputados com o número 5.456/09. O assunto será analisado pelos deputados da Comissão de Constituição e Justiça e, caso seja acatado, pode ser analisado em plenário e, em seguida, sancionado pelo presidente Lula da Silva.

Mas, independentemente da aprovação e da sanção desse projeto de lei, o presidente do STF e relator do pedido de intervenção, ministro Gilmar Mendes, pode solicitar a realização de uma audiência. Ele já se mostrou favorável à realização de uma consulta pública sobre o assunto.

Ao pedir a intervenção federal, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, argumentou que toda a linha sucessória do GDF está sob suspeita de envolvimento no suposto esquema de corrupção. Ele afirmou que haveria ¿indícios fortíssismos¿ da existência de um esquema criminoso no governo local e destacou que boa parte do Legislativo estaria envolvida no caso. Se a proposta de intervenção for acatada pelo STF, caberá ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva indicar o interventor.

Contra a intervenção, o procurador-geral do DF, Marcelo Galvão, argumenta que os serviços públicos estão sendo prestados normalmente e defende a utilização da linha sucessória prevista na Lei Orgânica. Segundo ele, a aprovação do pedidos de impeachment contra José Roberto Arruda e Paulo Octávio pela Câmara Legislativa seria uma sinalização de mudança de comportamento dos parlamentares.

Brasilienses contra a medida extrema

» Uma enquete realizada no site www.correiobraziliense.com.br mostrou que a maior parte da população da cidade é contra a hipótese de uma intervenção federal em Brasília. De acordo com a pesquisa, 60,13% dos internautas se posicionaram contrários à medida, com o argumento de que ¿a corrupção tem que ser combatida, mas não se pode tirar a autonomia política do Distrito Federal¿. Já os 39,87% restantes são favoráveis à intervenção. Para eles, ¿só assim o esquema de corrupção, espalhado pelos Três Poderes, poderá ser desmontado¿.