Título: A luta pela influência na América Latina
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Fonte: Valor Econômico, 12/01/2009, Internacional, p. A9

A influência política de Washington na América Latina está declinando. Uma tendência que começou antes dos atentados terroristas de 2001 contra os EUA se acelerou desde então, à medida que o governo de George W. Bush procurava, com pouco sucesso, ampliar a influência do país em outros lugares. A pergunta, oito dias antes de Barack Obama se mudar para a Casa Branca, é se ele fará algo para reverter o quadro.

Um sinal preliminar poderá surgir em abril - em Trindade, na Cúpula das Américas - quando a maioria dos líderes da América Latina (à exceção de Raúl Castro) poderá ter sua primeira chance de ver o novo presidente em ação.

Os EUA ainda são o mais poderoso vizinho nas redondezas: seu comércio exterior com a América Latina supera os US$ 500 bilhões anuais, mais de cinco vezes o da China. Mas a expansão da influência chinesa e russa, e de potências menores como o Irã, está desafiando o domínio dos EUA na região.

Como deverá reagir o governo Obama a esses recém-chegados? Em primeiro lugar, dizem especialistas em política externa, ele deve reconhecer que os motivos para a Rússia e a China ingressarem na América Latina contrastam.

No caso da Rússia, seu crescente envolvimento - que possui um forte componente militar e é em grande parte direcionado aos adversários dos EUA na região, como a Venezuela de Hugo Chávez - visa a desestabilizar Washington. A intervenção mais discreta da China, cuja orientação é em grande parte econômica, pretende obter o efeito oposto.

"A Rússia ainda tem nostalgia de superpotência", diz Dimitri Simes, que dirige o Nixon Center em Washington. As vendas de armas têm algum significado econômico para Moscou, acrescenta ele, já que a Rússia não tem muito mais para exportar além de matérias-primas. A principal motivação, porém, está em outro lugar: em responder à altura à percepção russa de que os EUA estariam se intrometendo na esfera de influência de Moscou.

Bates Gill, especialista em China que preside o Instituto Internacional de Pesquisas para a Paz de Estocolmo, diz que a abordagem de Pequim em relação à América Latina remonta a decisões dos anos 90 de se envolver com as principais regiões do mundo. A abordagem, diz, "é muito meticulosa e rigorosamente bem concebida". Hu Jintao, o presidente chinês, visitou a maioria dos países latino-americanos nos últimos seis anos.

Ainda assim, os EUA continuam sendo o país em que a China deposita seu maior interesse estratégico. Para Cynthia Watson, professora de estratégia na Escola Nacional de Guerra dos EUA, "Pequim não cruzará uma linha que ameace [os laços com os EUA] por temer que isso ponha em risco o crescimento econômico exigido para sustentar o monopólio político do Partido Comunista Chinês".

De acordo com Daniel Erikson, do Diálogo Interamericano, em Washington, o objetivo do Departamento de Estado dos EUA é converter a China numa protagonista responsável na América Latina. Os EUA incentivaram o envolvimento chinês na missão de manutenção da paz da ONU no Haiti. E hoje, a China deve assumir participação simbólica no Banco Interamericano de Desenvolvimento, algo impensável sem a benção americana.

Mas nem todos em Washington estão confiantes. Peter Brookes, do conservador Heritage Foundation, argumenta que a "intromissão" russa e chinesa na América Latina é um obstáculo no caminho dos EUA retomarem a influência na região. Mas, a maioria dos observadores crê que algumas atitudes sagazes da parte de Obama poderiam contribuir para recuperar a imagem de Washington na região. Mas reverter o declínio da influência dos EUA de forma mais permanente será uma tarefa muito mais árdua.