Título: Defesa da autonomia do DF
Autor: Tahan, Lilian
Fonte: Correio Braziliense, 23/02/2010, Cidades, p. 25

Procurador-geral apresenta ao Supremo Tribunal Federal os argumentos contra o pedido de intervenção federal na capital da República

Galvão: ¿O pedido de intervenção não especifica limites. Não se sabe se ela seria feita apenas no Executivo ou se estenderia ao Legislativo¿

Monique Renne/CB/D.A Press - 17/2/10 Gurgel fez um adendo ao pedido de intervenção federal no DF

O procurador-geral do Distrito Federal, Marcelo Galvão, entregou ao Supremo Tribunal Federal (STF) na tarde de ontem a defesa contra a intervenção na capital da República pedida pela Procuradoria-Geral da República. Num documento de 53 páginas, Galvão reúne argumentos para tentar convencer o Supremo Tribunal Federal (STF) de que a nomeação de um interventor é ¿inconstitucional¿, ¿exagerada¿ e ¿desnecessária¿.

Antes de protocolar a defesa formalmente ao STF, Marcelo Galvão esteve com o presidente do Supremo, Gilmar Mendes, a quem resumiu os itens da defesa do Distrito Federal. Um dos focos da sustentação da Procuradoria-Geral do DF(1) é de caráter técnico. ¿O pedido de intervenção não especifica limites. Não se sabe se ela seria feita apenas no Executivo ou se estenderia ao Legislativo¿, ressaltou Galvão. Em reação ao argumento dos advogados do DF, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, fez um adendo ao pedido de intervenção. Acrescentou que o pedido se estende ao Poder Legislativo. Com isso, foi aberto prazo de cinco dias para a Câmara Legislativa apresentar defesa.

Na interpretação dos assessores jurídicos incumbidos de fazer a defesa dos interesses do DF, a intervenção seria uma demonstração de ¿incompetência¿ da sociedade em eleger os seus representantes. Mas segundo a Procuradoria-Geral, a crise, apesar de grave, não estaria a ponto de um colapso social, com paralisação de serviços públicos e manifestações populares que inviabilizem a governabilidade.

Outro argumento contido na defesa do Distrito Federal é um paralelo traçado entre o caso da capital da República e o de outras 15 unidades da Federação, que sofrem ação penal no âmbito do Supremo e estão com os processos parados por falta de autorização das assembleias legislativas locais. Na visão da Procuradoria-Geral do DF, a intervenção em Brasília, com a consequente destituição do governador afastado José Roberto Arruda, criaria uma situação diferenciada, já que aqui também há um dispositivo na Lei Orgânica segundo o qual a Justiça precisa pedir autorização à Câmara antes de instaurar processo(2) contra o governador.

Soluções constitucionais Para os advogados do DF, existem soluções constitucionais para lidar com o problema na capital da República. A sugestão dos procuradores é de que a linha sucessória prevista na Lei Orgânica seja respeitada. Segundo ela, na falta do governador, assume o vice e depois o presidente da Câmara Legislativa. O próximo a ter direito de comandar o Executivo seria o vice-presidente da Câmara Legislativa e, por último, o presidente do Tribunal de Justiça.

A Procuradoria-Geral do DF ainda noticia em sua peça de defesa os últimos acontecimentos da Câmara Legislativa que para os procuradores indicam uma mudança de comportamento dos distritais. Na semana passada, os deputados aceitaram em um só dia os processos de impeachment contra Arruda e o governador em exercício Paulo Octávio, numa sinalização de que se tiverem de correr o risco de desamparar aliados políticos e de lidar com uma intervenção, vão ficar com a primeira opção.

Contrário à tese levantada pelos advogados do DF, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, voltou a defender publicamente o decreto de intervenção na capital da República. Segundo disse durante solenidade no Ministério da Justiça na manhã de ontem, ¿uma solução simplista não resolve o problema. Na verdade o direito da Câmara não admite soluções mágicas. É evidente que (a intervenção) é um remédio drástico. Mas estamos diante de um raríssimo caso em que a Constituição Federal não só autoriza como exige a decretação da intervenção¿. Roberto Gurgel preferiu não fazer previsões sobre a votação da intervenção no Supremo e reconheceu até que, em casos semelhantes, o STF costuma negar esse tipo de pedido.

1 - Consultoria A Procuradoria-Geral do Distrito Federal, órgão do sistema jurídico do DF, é uma instituição de natureza permanente. Cabe ao órgão representar o Estado judicialmente e dar consultoria jurídica. Os procuradores são escolhidos por concurso público e podem ser responsabilizados judicialmente em caso de pareceres em desacordo com a legalidade. No DF, os procuradores podem advogar, desde que não representem causas contra o interesse do Estado.

2 - Na CCJ Deve entrar na pauta da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) de hoje a votação do Projeto de Decreto Legislativo 499, que autoriza o Superior Tribunal de Justiça a processar Arruda no âmbito do Inquérito nº 650. A proposta, assinada por sete distritais, ganhará a adesão de mais parlamentares e deve ser aprovada, como uma sinalização política da Câmara de que vai colaborar com a Justiça.

Argumentação

Conheça alguns dos argumentos usados pela Procuradoria-Geral do DF na defesa contra a intervenção na capital da República:

Para os procuradores, a medida é exagerada porque não há sinais de ¿convulsão social¿. Os serviços públicos, por exemplo, estariam sendo prestados normalmente

A intervenção seria uma declaração de ¿incompetência¿ da população, que não soube escolher seus representantes

A Procuradoria defende a utilização da linha sucessória prevista na Lei Orgânica, que seria o remédio constitucional para lidar com a crise política no DF

Os advogados do Distrito Federal fazem um paralelo entre a situação da capital da República e a de outros 15 estados que têm processos penais parados no Supremo por falta de autorização das assembleias legislativas. A intervenção, como sustentam, seria tratar o caso no DF de maneira diferenciada

As atitudes recentes dos distritais, que aceitaram os processos de impeachment contra Arruda e Paulo Octávio, seriam uma sinalização de mudança de comportamento dos deputados, agora dispostos a enfrentar a crise independentemente de conchavos políticos

Secretariado reunido

Saulo Araújo Viola Junior/Esp. CB/D.A Press Os secretários discutiram os rumos do governo durante duas horas

Uma transformação total na imagem do governo. Essa é a missão do secretariado de Paulo Octávio para tentar amenizar a crise política que toma conta do Distrito Federal. Ontem à noite, durante reunião convocada de última hora, no 8º andar do Palácio do Buriti, parte dos chefes das 21 pastas do DF discutiram durante mais de duas horas os rumos da administração de Brasília. O governador em exercício do DF, Paulo Octávio, não participou do encontro. Um dos participantes disse que o ¿governo é um corpo sem cabeça¿ e que é hora de reagir para mostrar que a máquina continua funcionando. ¿É hora de mostrar que o governo está presente nas ruas. Hoje, a sensação é que estamos inertes. O que não é verdade. Inauguramos escolas e a imprensa diz que o governo está parado, inauguramos pontes e a imprensa fala a mesma coisa. É hora de mostrar que a crise não abalou o andamento dos trabalhos¿, disse.

Um outro secretário sugeriu a criação de um portal da transparência, semelhante ao do governo federal. A ideia seria disponibilizar no site todos os gastos das secretarias. ¿Com a criação de um portal com todas as contas abertas ao público, nós esvaziamos as críticas. É uma ação concreta e que poderia surtir um efeito extremamente positivo¿, afirmou.

O tratamento com a imprensa também recebeu destaque na conversa. Um secretário alertou aos colegas que é desgastante apenas ¿ficar respondendo a acusações¿. ¿Não adianta ficar brigando com a imprensa. Temos que mostrar apenas o que estamos fazendo¿, disse ele, que também sugeriu, como forma de fortalecer a imagem do governo, formar um novo líder. ¿Não temos mais o Zé Humberto (José Humberto, ex-secretário de Governo), o Maciel (José Geraldo Maciel, ex-chefe da Casa Civil). Temos que fazer um novo nome forte. Um líder mesmo, que eu ainda não sei quem seria¿, afirmou, recebendo o apoio dos colegas.

Novas denúncias A situação do governador em exercício do Distrito Federal, Paulo Octávio, está cada dia mais complicada. Ontem, ele dedicou parte do seu dia para estudar junto aos seus advogados uma defesa que desqualificasse as acusações de que ele teria interferido no curso das Operações Tucunaré e Tellus, ambas conduzidas pela Polícia Civil do DF. A primeira envolve um suposto esquema de distribuição de propina usando empresas de fachada da capital, cujo articulador seria o policial aposentado Marcelo Toledo. Já a Tellus apurava uma acusação semelhante, porém, na Secretaria de Desenvolvimento Econômico do DF, na época em que Paulo Octávio chefiava a pasta. Por meio de seu advogado, Antônio Carlos de Almeida, ele garantiu estar tranquilo. Segundo o defensor, a acusação que tramita na 8ª Vara Criminal de Brasília é inválida, pois, por se tratar de um vice-governador de Estado, a instância não teria competência para julgá-lo.

Permanência no DEM

Denise Rothenburg

Depois das idas e vindas em relação à renúncia, o governador em exercício, Paulo Octávio, fez o mesmo em relação à saída do Democratas. Ele disse na última sexta-feira que a carta de desfiliação estava pronta para ser entregue ao presidente do partido, Rodrigo Maia, mas ontem decidiu permanecer na legenda e aguardar o desfecho da reunião de amanhã, quando o DEM analisará o pedido de expulsão apresentado pelo deputado Ronaldo Caiado e pelo senador Demostenes Torres, ambos de Goiás. Se a maioria dos integrantes da Comissão Executiva Nacional acolher a proposta goiana, Paulo Octávio recorrerá na Justiça comum.

A intenção de Paulo Octávio é preservar a filiação partidária e uma brecha para, se for o caso, concorrer a uma vaga de deputado federal ou senador em outubro. Se pedisse a desfiliação, Paulo Octávio não poderia mais se filiar a outro partido a fim de disputar um mandato eletivo este ano, porque o prazo de filiação partidária para os candidatos expirou em outubro do ano passado, um ano antes do pleito. O mesmo raciocínio vale para a desfiliação por justa causa, que demoraria a ser julgada, comprometendo o calendário eleitoral imaginado pelo governador.

Movimentação Paulo Octávio passou o dia em conversas com integrantes da Executiva de seu partido para explicar por que não pretende pedir para sair do DEM. Sua movimentação, no entanto, não deu resultado. ¿Ele tem o direito de fazer o que acha que deve e o partido, de cobrar o que deve ser cobrado. A decisão está tomada e será ratificada: quem não sair do Governo do Distrito Federal deve sair do partido. Como ele ficou no governo, se não sair do partido, será saído¿, disse o líder na Câmara, Paulo Bornhausen (SC).