Título: UE e Brasil vão levar Doha para reunião do G-20
Autor: Grabois , Ana Paula
Fonte: Valor Econômico, 23/12/2008, Brasil, p. A3
A União Européia e o Brasil pretendem trabalhar juntos nas negociações do próximo encontro do G-20, em Londres, em 2 de abril, com foco na regulação dos mercados financeiros e em medidas relativas às alterações climáticas. O presidente da França e do Conselho da União Européia, Nicolas Sarkozy, disse que o esforço também vai abranger as discussões no âmbito da Organização Mundial de Comércio (OMC). Leo Pinheiro/Valor RJ
O presidente da França, Nicolas Sarkozy, e Lula durante a 2ª Cúpula Brasil-União Européia, no Rio: plano de ação conjunta para estreitar relações comerciais
Contrariando as posições adotadas até o momento pelo bloco europeu, especialmente na área agrícola, Sarkozy e o presidente da Comissão Européia, o português José Manuel Durão Barroso, se posicionaram ontem contra o protecionismo, durante a 2ª Cúpula Brasil-União Européia, realizada no hotel Copacabana Palace.
"Vamos trabalhar com o presidente Lula em iniciativas futuras em matéria de OMC porque nós acreditamos na liberdade do comércio e nós não queremos o protecionismo. Trabalhamos numa iniciativa para relançar as coisas e agora consideramos que são os chefes de estado que deverão tomar suas responsabilidades", disse Sarkozy após a divulgação de um plano de ação conjunta do Brasil e da União Européia para os próximos três anos.
"Decidimos fazer com que as coisas mudem muito, como decidiu o presidente Lula", afirmou o presidente da França, que defendeu ainda a mudança do papel do Fundo Monetário Internacional (FMI) e a criação de um sistema de controle mundial das instituições financeiras diante da crise global.
No mesmo tom, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva cobrou a conclusão das discussões da Rodada Doha para liberalização comercial. A última reunião fracassou por falta de consenso entre países desenvolvidos e em desenvolvimento em áreas como agricultura e serviços. Também fracassou a idéia de convocar uma reunião de ministros ainda em 2008. O presidente Lula disse que pretende colocar na pauta das negociações a questão agrícola, principalmente a discussão das barreiras fitossanitárias.
Para Durão Barroso, a reunião de ontem estabeleceu pontos para avanço de uma agenda de "convergência para uma nova arquitetura global". "Temos que lutar contra crises e lutar para relançar Doha", disse Durão Barroso, que também afirmou ser "essencial" resistir ao protecionismo. Ele tem esperança de que o futuro presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, coloque "alguma energia" ao desenvolvimento de Doha.
Presente ao encontro, o ex-ministro do Desenvolvimento e presidente do conselho de Administração da Sadia, Luiz Fernando Furlan, foi enfático ao afirmar que o Brasil deve focar com mais afinco os seus interesses por meio de acordos bilaterais, como com a União Européia.
"Está na hora de o Brasil olhar seu futuro combinando a convivência dentro do Mercosul com seu interesse nacional", afirmou. O ex-ministro se disse um entusiasta do bloco sul-americano, mas lamentou que, nos últimos seis ou sete anos, as discussões no Mercosul giravam em torno de temas pontuais. "Nesse momento, infelizmente, vejo o Brasil com uma bola de ferro no pé, querendo correr, querendo fazer, com um grande número de países fazendo propostas e o país amarrado numa situação", disse Furlan.
Para ele, o Brasil cresceu e se tornou "maior de idade", tanto que hoje, no momento de crise, o mundo vê o país como parte da solução e não parte do problema. "O Mercosul teve seu tempo, não é que faltou tempo para que as coisas avançassem", disse Furlan, que defende a continuidade do bloco sul-americano, mas com a possibilidade de acordos bilaterais de forma paralela. Atualmente, a União Européia é o principal parceiro comercial do Brasil. A troca comercial dos dois países superou US$ 77 bilhões, o equivalente a 26% do comércio global no Brasil em 2007.
Na declaração conjunta entre Brasil e União Européia, os presidentes pedem a adoção de uma nova arquitetura global e o fortalecimento do sistema multilateral com reformas nos principais órgãos da Organização das Nações Unidas (ONU), como a Assembléia Geral e o Conselho de Segurança. Ontem, Sarkozy chegou a defender a indicação do Brasil como membro permanente do Conselho de Segurança. "Precisamos do presidente Lula como membro permanente do Conselho de Segurança da ONU, como líder na questão ambiental", disse.
Na área ambiental, foi colocado o compromisso com a redução da emissão de gases causadores do efeito estufa e da perda de biodiversidade no mundo e promoção da energia renovável, incluindo a produção e uso dos biocombustíveis. Também reafirmaram sua contribuição para alcançar os objetivos do Milênio e erradicar a pobreza. Apesar do bloco do Mercosul não ter participado das conversas com a União Européia, o plano fala da disposição para retomar as negociações de um acordo de associação entre Mercosul e União Européia. (*Do Valor Online)