Título: Para BC, crise pode levar inflação à meta
Autor: Ribeiro , Alex
Fonte: Valor Econômico, 23/12/2008, Brasil, p. A4

O Banco Central espera que a crise mundial provoque uma desaceleração no crescimento da economia forte o suficiente para fazer a inflação retornar à trajetória das metas sem exigir apertos adicionais na política monetária. Mas, a julgar apenas pelas projeções numéricas do BC, o espaço para cortes na taxa básica segue reduzido. Leo Pinheiro / Valor

Mário Mesquita: "Mesmo com a desaceleração, o Brasil vai crescer em 2009 acima da média dos últimos dez anos"

O relatório trimestral de inflação do BC, divulgado ontem, projeta crescimento de apenas 3,2% na economia em 2009, bem abaixo dos 5,6% esperados para este ano. A desaceleração econômica significa, na visão do BC, que caíram os riscos de a demanda agregada continuar acima da capacidade de oferta da economia, pressionando a inflação. O BC conta também que, em virtude da crise, o país faça um ajuste externo de perto de 2% do Produto Interno Bruto (PIB), reduzindo as importações liquidas.

A projeção central é que a inflação vá ficar em 4,7% em 2009, tomando como base uma taxa Selic estável em 13,75% ao ano e uma taxa de câmbio de R$ 2,40, cotação vigente em 12 de dezembro, data de corte usada nos exercícios matemáticos e estatísticos feitos pelo BC. Como a projeção de inflação (4,7%) está acima da meta de inflação definida para o ano (4,5%), em tese não há espaço para promover cortes na taxa básica de juros.

Numa outra projeção divulgada pelo BC, a inflação ficaria em 4,5%, tomando como base a trajetória prevista pelo mercado financeiro para a taxa de juros (a expectativa é que caia para 13% ao ano no fim de 2009) e para a taxa de câmbio (a aposta é que recue para R$ 2,20). Essa projeção indica que, se a taxa de câmbio recuar, haverá espaço para o BC cortar os juros em 2009.

Embora a margem para relaxamentos monetários siga reduzida, o relatório de inflação mostra um quadro inflacionário mais benigno do que o projetado anteriormente pela autoridade monetária. Em setembro, antes da crise, o BC esperava uma inflação um pouco mais alta - de 4,8%, no cenário de referência, e de 4,7% no cenário de mercado. Nos meses seguintes, a inflação projetada chegou a subir. A inflação projetada para 2009 (4,7%) significa uma queda importante em relação aos 6,2% previstos pelo BC para este ano.

O diretor de Política Econômica do BC, Mário Mesquita, disse que a inflação projetada caiu em virtude dos sinais de desaquecimento da economia e do recuo da inflação mundial. "Mesmo com a desaceleração, o Brasil vai crescer em 2009 acima da média dos últimos dez anos e acima do crescimento da economia mundial", afirmou ele.

Alguns analistas econômicos mais preocupados com a inflação vinham afirmando que a crise internacional iria exigir um esforço ainda maior em termos de crescimento econômico para controlar a inflação. Antes da crise, argumentam, o BC vinha subindo os juros para conter uma demanda agregada que caminhava acima da inflação. A crise financeira piorou as coisas, porque limita o espaço para o país atender à demanda interna com importações - ou seja, consumo e investimentos teriam que ser cortados ainda mais para recolocar a inflação dentro da meta.

Os cálculos do BC, divulgados no relatório de inflação, são de que a chamada absorção doméstica (consumo das famílias, gastos do governo e investimentos) vá cair pouco mais de 4 pontos percentuais do PIB, passando de 7,9% em 2008 para 3,7% em 2009. Essa contração interna cobre com folga o ajuste exigido nas contas externas, calculado em pouco menos de 2 pontos do PIB. Os cálculos do BC são de que, em 2008, a absorção doméstica tenha crescido 2,4 pontos do PIB acima da capacidade de oferta interna graças às importações líquidas; em 2009, poderá crescer só 0,5 ponto percentual.

O fato de as projeções de inflação para 2009 estarem ainda acima da meta, porém, não significa que não haverá espaço para corte de juros. No relatório, o BC diz que a crise fez com que o cenário econômico se tornasse mais incerto, o que, em contrapartida, significa que são relativamente grandes as chances de a inflação se comportar diferente das projeções.

No relatório, o BC cita três riscos: uma crise mundial mais prolongada e intensa, um repasse mais forte da desvalorização cambial para os preços e uma desaceleração mais aguda da economia brasileira.

"Por um lado, a depreciação cambial pode refletir-se, em menor ou maior grau, em repasses aos preços de bens e serviços finais", afirma o relatório. "Por outro, a importante revisão das perspectivas para a inflação global , aliada ao esperado arrefecimento da atividade econômica, sugerem que pode haver um estreitamento na capacidade de as firmas repassarem os aumentos de custos advindos da depreciação do câmbio para os preços ao consumidor."

O mercado financeiro acha que irá prevalecer um cenário mais benigno, por isso aposta em um corte de 0,25 pp. na Selic em janeiro, segundo projeção divulgada na pesquisa semanal de expectativas.