Título: Celular inteligente sai do escritório e atrai público comum
Autor: Moreira , Talita
Fonte: Valor Econômico, 07/01/2009, Empresas, p. B3
Foi-se o tempo em que Blackberrys e afins eram aparelhos enigmáticos e cheios de botões usados por executivos de alto escalão. É cada vez mais freqüente encontrar os chamados "celulares inteligentes" nas mãos de pessoas comuns, que querem um telefone multifunções para navegar na internet e consultar e-mails a qualquer hora, além de fazer ligações, tirar fotos e ouvir músicas. Marisa Cauduro/Valor
Marcelo Zenga, diretor de marketing da Palm: com subsídio de operadoras, estão disponíveis modelos a R$ 199
Jônia da Rocha Corrêa, aposentada, é exemplo disso. Dona de um E71, da Nokia, ela mantém a agenda do aparelho sincronizada com a do computador, checa os e-mails e usa o programa de mensagens instantâneas MSN. Seu próximo passo é baixar o Skype, software com o qual pretende fazer ligações telefônicas sem custo. "Eu gosto do aparelho para me comunicar com as pessoas [de várias maneiras diferentes]", afirma.
Para Jônia, o grande atrativo dos celulares inteligentes ou "smartphones" é o fato de agruparem diversos recursos. "Gosto muito de coisas portáteis", afirma ela, com a experiência de quem teve seu primeiro notebook há 15 anos e já usou também PDAs e computadores de mão. O lançamento das redes de terceira geração (3G) da telefonia móvel - que permitem o tráfego de dados em alta velocidade - e o sucesso do iPhone, o celular da Apple, são alguns dos fatores que explicam o interesse pelos celulares inteligentes.
Esse tipo de aparelho já equivale a 16% das vendas de celulares e deve representar um terço do mercado até 2012. A estimativa é da Qualcomm, empresa americana que produz chips para telefonia móvel. Os números são mundiais, mas o Brasil acompanha o movimento, afirma o presidente da empresa no país, Paulo Breviglieri. "O crescimento pode ser atribuído às vendas de 'smartphones' para pessoas físicas", diz.
Uma pista disso está no ranking de produtos mais vendidos em 2008 pelo site de comércio eletrônico Mercado Livre: os celulares inteligentes ficaram em quarto lugar, atrás de câmeras digitais, tocadores de música e memórias para PC.
Atentos à demanda, fabricantes que sempre dependeram do mercado empresarial, como RIM (do BlackBerry), Hewlett-Packard (HP) e Palm, têm reforçado o portfólio com modelos que não têm aquele jeitão de escritório. Já os fabricantes de celulares convencionais têm se empenhado para criar seus próprios celulares inteligentes.
A Nokia tem um modelo cujo perfil muda com o clique de um botão: as funções de trabalho ficam em segundo plano e as de entretenimento ganham destaque e vice-versa. A demanda fez a empresa criar duas linhas específicas para aparelhos desse tipo e se reorganizar para oferecer também serviços de vídeo e música aos clientes. "Mesmo com a desaceleração do mercado de telefonia móvel em termos mundiais, os 'smartphones' devem continuar a crescer", comenta Fiore Mangone, gerente de vendas e serviços.
Segundo o executivo, as vendas têm sido impulsionadas pela queda nos preços - decorrência do aumento da escala desde 2005 - e a demanda por recursos avançados. Nos mercados em que o uso dos aparelhos inteligentes está consolidado, a Nokia constatou que os usuários gastam 12% de seu tempo com chamadas de voz. O resto fica com aplicações como música, fotos etc.
A redução nos preços - em parte, associada aos subsídios oferecidos pelas operadoras - também é apontada como um fator importante por Marcelo Zenga, diretor de marketing da Palm. "Hoje já é possível encontrar aparelhos a R$ 199", diz ele.
A Palm, que reinou absoluta na era dos PDAs (precursores dos celulares inteligentes), vem tentando recuperar terreno. Uma de suas armas é lançar modelos para pessoas físicas. Nos últimos dois anos, a participação dos clientes empresariais nas vendas da companhia caiu de 80% para 60%, diz Zenga.
A RIM também tem se empenhado para levar seu bem-sucedido BlackBerry às mãos de pessoas que nada têm a ver com o perfil de executivos. A aposta de Henrique Monteiro, gerente de produtos, é de que em três anos os consumidores comuns já representarão a maior parte do mercado de "smartphones".
Apesar do otimismo, os fabricantes reconhecem que não vão passar incólumes à crise. O mercado brasileiro deve crescer entre 20% e 25% neste ano, segundo a HP. Em outro contexto, o número oscilaria entre 30% e 35%, diz Tatiana Torres, gerente de iPaqs, a linha de telefones da companhia. "Mas o patamar atual é mais do que suficiente para justificar investimentos", afirma ela. A HP só deve lançar sua linha de celulares para o usuário final em 2010, mas pretende lançar mais um modelo corporativo no país em 2009.
A valorização do dólar poderá elevar o preços dos terminais nos próximos meses, mas o reflexo pode ser suavizado por uma eventual concessão de subsídios. "As operadoras podem querer estimular as vendas de 'smartphones' porque eles ajudam a elevar as receitas com serviços de dados", avalia Zenga.
Por outro lado, a alta da moeda americana pode incentivar os fornecedores a produzir no Brasil esses aparelhos, hoje quase todos importados. Segundo Monteiro, a RIM tem estudado a fabricação local, mas ainda não há uma definição.
A demanda por celulares inteligentes teve impacto na balança comercial de eletroeletrônicos, segundo a Abinee, associação que acompanha o setor. A importação dos aparelhos com recursos avançados fez com que o volume de celulares trazidos ao país crescesse 127% em 2008, atingindo US$ 854 milhões.