Título: Ano difícil na economia, pior ainda na política
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 02/01/2009, Opinião, p. A10

S e um ano eleitoral em que está em jogo o cargo de presidente da República tem um enorme poder de desorganizar o Congresso, onde contracenam os partidos que irão participar do jogo político, o ano que antecede a eleição traz também bom potencial de desorganização - e não apenas pelo embate entre partidos adversários, mas entre adversários dentro dos partidos. 2009 é o ano anterior de uma disputa eleitoral na qual os pré-candidatos de partidos com maiores chances de vencer mostrarão as suas caras e afiarão as garras; seus grupos disputarão a simpatia dos principais líderes e a maioria numérica dos colegiados; cada um terá que mostrar maior poder de articulação com outras forças políticas, superioridade nas pesquisas e capacidade de sobreviver aos ataques de dentro e de fora de suas legendas.

Talvez a única coisa que possa unir os concorrentes internos seja o trabalho de convencimento da opinião pública de que o seu partido é o mais apto a polarizar com o que está no poder, no caso da oposição. Isso, no PSDB, pode unir os esforços do governador de Minas, Aécio Neves, e do governador de São Paulo, José Serra, até o momento em que eles precisarem se diferenciar um do outro para conquistar o seu público interno. Na verdade, exceto em questões de grande repercussão pública, esse trabalho de manter a polarização com o PT já tem mobilizado a aliança PSDB-DEM no Congresso e a luta travada a nível parlamentar com os dois candidatos atuando nos bastidores. A aliança, consolidada agora com o golpe de mestre da candidatura e vitória do prefeito Gilberto Kassab (DEM) à reeleição à prefeitura de São Paulo, sob a proteção e apoio explícito de Serra, tende a assumir a sua face mais agressiva, dada a aderência que existe entre o estilo udenista do DEM e de setores mais à direita do PSDB.

Como indicam as ações prévias do PSDB e do DEM, que têm levado à Justiça as derrotas impostas a eles pelo governo pelo voto ou pela edição de medidas provisórias, tudo indica que não vão ser fáceis os dois últimos anos de gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. E não serão fáceis também por conta de seu partido. Com uma oposição mais barulhenta de um lado, Lula também terá que lidar com grupos petistas que precisam se impor nesse ano anterior às eleições para terem espaço e poder na definição de uma candidatura, ou de um lugar mais privilegiado ao lado do candidato.

Para o Palácio do Planalto, as duas tarefas - lidar com a oposição e com a base aliada - devem ter o mesmo grau de dificuldades. Lula não imporá a candidatura de sua preferência, seja ela a da ministra Dilma Rousseff ou qualquer outra, se não tiver uma solução de compromisso que una todos os grupos do partido, missão dificultada por uma histórica queda de braço entre o presidente e seu partido, e que se torna mais difícil quanto mais aumenta a popularidade do chefe petista.

A outra dificuldade adicional para Lula será o PMDB, um aliado sempre no governo e sempre na oposição. A contar pela história do PMDB pós-redemocratização, 2009 é o ano em que o partido vai ameaçar lançar candidato próprio, vai arrumar um pretexto para criar crises que possibilitem parte dos ministros pemedebistas saírem do governo e, por fim, deverá rachar, mantendo um pé no PT de Lula e outro no PSDB de Serra - para se recompor com o governo de novo, seja do PSDB ou do PT, depois da posse do eleito, em janeiro de 2011.

Essas dificuldades, aliadas a uma crise econômica, não prometem muita agilidade ao governo para responder às dificuldades que poderão vir. Nesse momento, será difícil fazer andar um governo que a oposição insiste em manter cada ato subjudice, ou manter-se em negociação permanente com o PMDB, ou ainda esperar muitas surpresas do Senado, onde a maioria governista depende de um PMDB cada vez mais hostil. Dentro do PT, ou Lula consegue emplacar um presidente com quem tenha bom diálogo, ou terá que se envolver em negociações diretas com os grupos que se sentem alijados por sua popularidade. A vida do governo, portanto, não será fácil. Se Lula ainda tiver sorte, deve esperar que ela se repita pelo lado da economia e que a crise seja mais leve e menos profunda do que predizem economistas. Será mais fácil lidar com a economia do que com a política. E será muito difícil lidar com a política com a economia em declínio.