Título: Investidores brasileiros são vítimas de fundo de Madoff
Autor: Monteiro , Luciana
Fonte: Valor Econômico, 16/12/2008, EU & Investimentos, p. D2

Não foram apenas investidores estrangeiros que amargaram perdas estimadas em US$ 50 bilhões com o esquema de fraude em "hedge funds" realizado pelo ex-presidente da Nasdaq, Bernard Madoff. Na lista, há também brasileiros que tinham dinheiro aplicado em fundos "offshore" (que investem no exterior) com exposição em carteiras gerenciadas pela Bernard L. Madoff Investment Securities, fundada em 1960.

Um histórico de 20 anos de retornos bem convidativos, na faixa de 1% ao mês, atraiu muitos investidores, inclusive "private banks" brasileiros. Um gestor de fortunas conta que, diante de rentabilidades tão consistentes, chegou a ir para Nova York para conhecer a operação. Ele afirma que o fundo americano se recusou a dar explicações detalhadas sobre a estratégia de gestão, o que o fez desistir de fazer a distribuição do "hedge fund" no Brasil.

O sócio de uma asset independente no Brasil diz que também chegou a considerar o investimento no fundo, mas optou por não fazê-lo porque não havia explicação plausível para retornos tão consistentes. Segundo ele, o fundo era uma caixa-preta, mas muitos aceitaram a idéia de que o sucesso estava atrelado ao segredo.

Diferentemente do que ocorre aqui, a regulamentação dos fundos hegde é bastante flexível no mercado americano. Lá fora, os gestores podem investir em qualquer tipo de ativo, não são obrigados a publicar diariamente as cotas do fundo, nem divulgar as operações em carteira ou mesmo marcar a mercado diariamente os investimentos.

A grande maioria dos investidores brasileiros perdeu dinheiro porque aplicava no Fairfield Sentry Fund, que investia no fundo gerenciado por Madoff. Dos fundos "offshore" distribuídos para clientes "private", o Fairfield era um dos mais badalados, conta um gestor. Segundo ele, a carteira era distribuída não apenas por "private banks" estrangeiros, mas por bancos locais também.

Muitas instituições distribuíam esse fundo pois, além do desempenho consistente, recebiam taxas de rebate interessantes. Essa taxa consiste em uma remuneração recebida pelo assessor que indica o fundo. Um gestor independente conta que, durante o período em que trabalhou em um banco (entre 1997 e 2000), acompanhou de perto o retorno do Fairfield Sentry Fund. A carteira, conta, era "impecável", uma vez que atravessou várias crises financeiras de forma ilesa. Esse gestor também foi a Nova York porque queria entender a estratégia de gestão da carteira, mas diz que a resposta dada na ocasião não fazia sentido e, então, optou por não distribuir o fundo.

O esquema fraudulento chamado de "pirâmide" não estava muito claro até ontem, mas, segundo as agências internacionais, o gestor pagava os retornos aos investidores usando o dinheiro aplicado por clientes novos. Como esse esquema conseguiu sobreviver durante tanto tempo e atravessar várias crises financeiras é a grande questão a ser respondida.

Segundo o sócio da asset independente, isso só aconteceu porque não havia distribuição de retorno ou dividendos. O investidor colocava o dinheiro no fundo e acompanhava o rendimento da aplicação, que se mostrou artificial, diz. O pagamento efetivo do retorno só acontecia no saque da aplicação, mas para honrar os resgates o gestor americano mantinha uma conta com cerca de US$ 200 milhões a US$ 300 milhões. Segundo essa fonte, ao longo desses anos, o fundo nunca havia enfrentado uma onda tão grande de saques. "Com mais de US$ 7 bilhões em pedidos de resgate, Madoff se viu sem dinheiro para pagar."