Título: Competitividade do Brasil cresce mais que a de rivais
Autor: Alda do Amaral Rocha
Fonte: Valor Econômico, 01/03/2005, Especial, p. A60

Se entrar num frigorífico hoje é uma experiência muito diferente do que era há 20 anos, isso se deve, sem dúvida, ao forte avanço da avicultura nesse período. Avanço esse que se deu em escala mundial e que aqui foi impulsionado pelo aumento das exportações de carne de frango e pelo incremento do consumo doméstico, principalmente a partir de 1994, com o Plano Real. "O crescimento da avicultura não é exclusivo do Brasil. O frango veio como uma alternativa de substituição à carne bovina por ser uma proteína mais barata", afirma Paulo Molinari, da Safras & Mercado. Mas o Brasil tirou proveito de condições favoráveis de produção em comparação com outros países, como a disponibilidade de grãos - principalmente de milho e soja -, clima favorável e mão-de-obra barata. Esses fatores garantem a competitividade do frango brasileiro, que tem atualmente o menor custo de produção do mundo. Segundo dados do Banco Mundial compilados pela Sadia, o custo do frango vivo no Brasil é equivalente à metade do custo europeu e 24,25% menor do que o custo nos EUA, maior produtor mundial de frango e que foi ultrapassado pelo Brasil nas exportações em 2004. Cláudio Martins, diretor-executivo da Associação Brasileira dos Produtores e Exportadores de Frangos (Abef), observa que a produção brasileira cresceu "na esteira" do avanço das exportações. Martins explica que, a partir da década de 80, quando os volumes exportados começaram a aumentar, o Brasil foi "confrontado" com a necessidade de ter as mesmas condições de qualidade e produtividade que seus principais países concorrentes. Assim, o setor de aves investiu em tecnologias para melhorar a produtividade e a sanidade, conforme lembra José Carlos Godoy, secretário-executivo da Associação Brasileira dos Produtores de Pintos de Corte (Apinco). Além do melhoramento genético, os produtores nacionais investiram também na nutrição, no manejo e na sanidade, com a utilização de vacinas e medicamentos. Raças melhoradas e rações especiais garantiram benefícios à conversão alimentar, ponto fundamental nos custos de produção. Se em 1970 eram necessários 2,15 quilos de ração para produzir um quilo de carne de frango, em 2004, essa proporção ficou em 1,8 quilo para um quilo de carne, segundo a Apinco. O tempo de engorda das aves também diminuiu - de sete a oito semanas, em 1970, para seis semanas. Godoy afirma que naquela época um frango era abatido com peso médio de 1,7 quilo após 56 dias de engorda. Agora, depois de 42 dias, o peso médio da ave é de 2,35 quilos. O aspecto sanitário também pesou para o avanço do frango brasileiro, principalmente nos últimos anos, de acordo com um especialista. O país é livre de influenza aviária, por exemplo, doença causada por um vírus que devastou - e continua afetando - plantéis da Ásia, abrindo espaço para o avanço brasileiro em mercados como o Japão. Para o consultor José Carlos Teixeira da Silva, a disponibilidade de tecnologia para a produção de frango ajudou a aumentar a oferta no país, com baixos custos. Em sua opinião, "o benefício desse custo foi transferido para o consumidor", que passou a ter no frango uma de suas principais fontes de proteína por conta do preço baixo em relação a outras carnes. Isso ficou claro com o Plano Real, que fez o consumo per capita anual sair de 19,1 quilos, em 1994, para 33,5 quilos em 2002 - recorde que perdura. No início do avanço da avicultura brasileira, os produtores do setor se espelhavam em concorrentes como os Estados Unidos e e a Europa. Mas, hoje, duas décadas após o início da corrida, os números mostram que o Brasil está num ritmo muito mais acelerado que os concorrentes. "O comércio e a produtividade [de outros países] não crescem no nível brasileiro", afirma Godoy. O crescimento da produção de carne de frango no Brasil entre 2000 e 2005 deverá atingir 47%, considerando uma estimativa de 8,8 milhões de toneladas para este ano. A taxa de aumento mundial deve ficar em 13% no mesmo período, com a produção de 57,3 milhões de toneladas este ano. Na comparação com seus principais concorrentes, os frangos brasileiros também estão à frente. De acordo com dados do Departamento de Agricultura do Estados Unidos (USDA), os EUA devem produzir 15,8 milhões de toneladas este ano, quase 16% mais que em 2000. Na China, o avanço deve ser de menos de 7,7%, para 9,99 milhões de toneladas. Na União Européia, o cenário é de relativa estabilidade, com a produção saindo de 7,6 milhões de toneladas em 2000 para 7,745 milhões este ano, segundo estimativas do USDA. Mas, além da competitividade, o Brasil também contou com muita sorte - ou azar dos concorrentes - nos últimos anos, para avançar no mercado mundial. Primeiro foi a doença da "vaca louca" na Europa que alavancou as exportações, e no último ano a gripe das aves, na Ásia, levou o Brasil ao topo do ranking dos exportadores em volume e receita. Quase não dá para acreditar que se trata do mesmo país que começou a exportar há 30 anos apenas em uma tentativa de enxugar a oferta interna.