Título: Vendas crescem, mas varejo adia encomendas
Autor: Lamucci, Sergio
Fonte: Valor Econômico, 19/12/2008, Brasil, p. A2

movimento no comércio até a primeira quinzena de dezembro faz o varejo projetar um Natal com expansão de vendas de 5% a 15% em relação ao ano passado. Esse bom resultado, contudo, ainda não se traduz em encomendas para a indústria na mesma proporção. Enquanto o varejo fala com cautela sobre novos pedidos, a indústria reclama abertamente que eles não estão ocorrendo e que a produção, em janeiro, deve se manter em compasso de espera. Marisa Cauduro/Valor

Patricio Mendizabal, presidente da Mabe Mercosul: pré-pedidos não estão sendo confirmados pelo varejo

Na Lojas Cem, a expectativa é de que as vendas neste Natal cresçam 5% em relação às do ano passado, segundo o supervisor-geral, Valdemir Colleone. "É um resultado até surpreendente. No começo do mês, projetávamos estabilidade", diz Colleone, explicando que as vendas haviam ficado estáveis em outubro e novembro, o que o levou a prever um comportamento semelhante em dezembro. Após os cinco primeiros dias "tímidos" de dezembro, com desempenho um pouco abaixo do previsto, as vendas da Lojas Colombo reagiram na segunda semana. Segundo o diretor de vendas Eduardo Colombo, a expectativa é confirmar a projeção de crescimento de 15% no faturamento do mês em comparação com o mesmo período de 2007.

Mesmo em Santa Catarina, Estado afetado pelas enchentes, as vendas reagiram. "Por incrível que pareça, vamos fechar o mês de dezembro acima do resultado de 2007", disse o presidente da rede de varejo Berlanda, Nilso Berlanda. Nos primeiros 15 dias, a rede já registrou aumento de 1% nas vendas em relação a dezembro do ano anterior. "Creio que nos próximos dias vai melhorar ainda mais porque tem mais 13º salário saindo nos próximos dias", diz ele, que estima que o crescimento atinja 10%.

A Berlanda vinha ao longo do ano com crescimento de 20% ao mês, mas já havia sentido em outubro e novembro uma queda do ritmo para 10% e Nilso não esperava um movimento tão forte no Natal. Segundo ele, nas primeiras duas semanas de dezembro a rede já vendeu 80% do total faturado em novembro. Ele acha que foi beneficiado por uma particularidade relativa às enchentes no Estado, pois muitas pessoas estão recomprando os móveis que perderam.

Por enquanto, contudo, Nilso ainda não fez pedidos de reposição de mercadorias. Disse que avaliará a reposição em janeiro, após a queima do estoque que sobrar do Natal, como tradicionalmente faz. Esse comportamento do executivo da Berlanda se repete no varejo. E preocupa a indústria.

No Amazonas, as indústrias estão encerrando o ano praticamente sem encomendas para 2009 e com perspectiva de estoques altos, diz o diretor-executivo das coordenadorias operacionais da Federação das Indústrias do Estado do Amazonas (Fieam), Flávio Dutra. "As indústrias fecham o ano com resultados positivos, mas sem um cenário visível para 2009", afirma. "Na normalidade, o varejo faz as encomendas com três a seis meses de antecedência e as indústrias não têm recebido encomendas para o próximo ano."

De acordo com a entidade, antes da quebra do Lehman Brothers, em meados de setembro, as indústrias do Estado já produziam as encomendas para o Natal e, por isso, o efeito mais drástico da crise só foi sentido a partir de outubro, período em que as indústrias iniciam a produção das encomendas para o ano seguinte. Para o ano, a expectativa é fechar com alta de 20%, chegando a US$ 30 bilhões.

No Amazonas, as indústrias estenderam o período de férias coletivas em função da queda no nível de encomendas observado a partir de outubro. As férias, normalmente de 20 dias, eram concedidas entre meados de dezembro e janeiro. Neste ano, as férias começaram em outubro e, na maioria dos casos, o prazo é superior a um mês.

As vendas do varejo também estão sendo beneficiadas por promoções antecipadas, que podem afetar as tradicionais liquidações de início de ano. Os fornecedores avaliam que muitas varejistas estão iniciando agora as ofertas com medo de ficarem estocadas depois do Natal. "As varejistas fizeram pré-encomendas para janeiro, mas o problema é que não fazendo a confirmação dos pedidos", afirma Patricio Mendizábal, presidente da Mabe no Mercosul, fabricante mexicana de eletrodomésticos que detém as marcas GE e Dako e lançou neste ano, no Brasil, a sua própria marca, a Mabe.

Devido às liquidações, janeiro costuma ser um mês importante em termos de vendas, tanto para as indústrias quanto para os lojistas, que incluem o evento em seu calendário de marketing. A não confirmação dos pedidos é preocupante. A queda nas vendas em relação a janeiro de 2008 pode ficar em torno de 10% se não houver uma mudança no atual cenário, avaliam empresários da indústria. Em setores que dependem de componentes e artigos importados, executivos afirmam que as pressões cambiais também podem estragar as liquidações.

Para Colleone, da Lojas Cem, a estratégia de elevar de quatro para seis parcelas o financiamento das compras sem juros ajudou a vender mais no Natal. Com o crescimento de 5% em dezembro, a empresa deve fechar o ano com expansão das vendas de 10% na comparação com 2007, abaixo dos 15% acumulados até setembro. Colleone diz que deve virar o ano com estoques equivalentes a 60 dias de vendas, acima do seu patamar normal, de 45 dias. Isso indica que a empresa deve demorar um pouco mais para fazer compras mais expressivas para repor as mercadorias. De acordo com Eduardo Colombo, a rede antecipou as compras e só deverá fazer reposições de estoques em janeiro.

Com lojas no Paraná, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Acre e Rondônia, a Móveis Gazin também vê um fim de ano positivo. "Nossas vendas estão 45% maiores em relação a novembro e, em relação a igual período de dezembro de 2007, o crescimento até agora é de 15%", conta o gerente-comercial, Marcos Antonio Vieira. Para ele, as classes C e D vão demorar um pouco mais para sentir os efeitos da crise. Ele não alterou prazos e decidiu ser mais criterioso no crédito. O resultado do ano está dentro do previsto, acrescenta. Vieira espera fechar 2008 com vendas 25% maiores.

Além de varejo, a Gazin também atua no atacado e tem indústria de mesas, cadeiras, estofados e colchões. "As encomendas não diminuíram", afirma Vieira. Por precaução, a direção da Gazin tomou algumas medidas, como a suspensão da contratação de pessoal até 31 de dezembro. Também quer reduzir o volume de mercadorias em 30% para a virada do ano. "Estou administrando o estoque e acredito que vou entrar o ano com necessidade de comprar", contou, citando eletroeletrônicos.

O presidente do Ponto Frio, Manoel Amorim, prevê para este Natal um desempenho de vendas igual ou um pouco inferior ao registrado em 2007. "Não dá para esperar crescer 10% a 15% em um cenário de crise mundial. Mas comparando com os últimos cinco anos, o mercado ainda está ótimo, mas não tão aquecido como se esperava em agosto", afirma. O executivo não cita números porque a a empresa tem capital aberto, mas diz que as vendas subiram em outubro e novembro a um índice inferior a 10% e devem fechar em queda em dezembro. "Mas ainda assim fechamos o quarto trimestre com crescimento", afirma.

Ainda segundo Amorim, o Ponto Frio opera com estoques ajustados de acordo com a expectativa de demanda para o primeiro trimestre de 2009, que é de um movimento de vendas similar ao do primeiro trimestre de 2007. "Talvez a empresa tenha que adiar por uma semana ou duas alguns pedidos para fechar o ano com o estoque ajustado", afirma. (Colaboraram Sérgio Bueno, Marli Lima e Vanessa Jurgenfeld)