Título: OMC suspeita de subsídios em juros cobrados por bancos estatais do Brasil
Autor: Moreira, Assis
Fonte: Valor Econômico, 30/01/2009, Brasil, p. A3

A Organização Mundial do Comércio (OMC) acaba de concluir um relatório sobre a política comercial do Brasil, no qual levanta a suspeita de que as taxas de juros cobradas pelos bancos estatais, como BNDES e Banco do Brasil, carregam subsídios à produção e exportação. Leo Pinheiro/Valor

Luciano Coutinho, presidente do BNDES: quem fala em subsídio na taxa de longo prazo ignora estrutura de juros no país

O estudo mostra que o papel do financiamento oficial no Brasil é mais importante do que em qualquer outro país em desenvolvimento, com juros que equivaleriam à metade dos cobrados pelos bancos comerciais em 2008. A OMC coloca como alvo o spread bancário, do lado dos bancos oficiais, justamente quando o governo Lula pressiona as instituições oficiais a baixarem essa taxa para dar mais fôlego ao setor produtivo.

O documento confidencial da OMC já foi entregue ao governo, e pavimenta o terreno para que os parceiros discutam o assunto durante o exame da política comercial do país em março. Segundo fontes, o crédito oficial foi o que mais causou debate com economistas da OMC, na preparação do exame da política comercial brasileira, que ocorre a cada quatro anos.

A pergunta dos economistas era por que os juros persistiam sendo tão altos no Brasil, entre os maiores do mundo, e por que as taxas dos bancos oficiais eram tão baixas em relação às cobradas pelo mercado. Os brasileiros rebateram que não há crédito de longo prazo por parte dos bancos comerciais. O BNDES cobre essa carência. Assim, se não existe taxa de mercado para juros de longo prazo, não se pode comparar taxa dos bancos oficiais.

Nos últimos tempos, vários programas do BNDES foram alvo de questionamentos por parceiros no Comitê de Subsídios, principalmente pelos Estados Unidos e União Européia, sem que chegassem à fase final, quando é aberta uma denúncia contra o país.

Em entrevista ao Valor, o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, rechaçou suspeitas de subsídios oficiais. Explicou que há uma "deformação" na estrutura dos juros no país, porque a taxa de curto prazo é "extravagantemente elevada" e sempre foi assim desde a implantação do Plano Real, como necessidade para fixar a nova moeda, evitar um processo dolarização e de fragilização da estabilização. A taxa de longo prazo no caso brasileiro é "uma construção institucional, porque não existe um mercado de longo prazo no país". A duração máxima de crédito é de 12 meses.

Isso gerou uma estrutura única de juros no mundo. Para Coutinho, o Brasil está "finalmente" se aproximando do "momento em que ela poderá ser superada". Segundo ele, elementos como a deflação global, que começa a se refletir no Brasil, criam "perspectiva" de convergência entre as taxas de curto prazo e de longo prazo.

Em função dessas características, Coutinho considera que não é possível apontar a existência de subsídios nos juros oficiais, e sim o contrário. Argumenta que a taxa de juros real de longo prazo no Brasil, a TJLP, agregada dos spreads e de outras taxas de repasse através da rede bancária, é mais alta em média do que a taxa da maioria das economias do mundo. "Se for tomado o "benchmark" internacional, nunca se poderá afirmar que a taxa de longo prazo no Brasil carrega subsídio. Quem disser isso ignora a problemática da estrutura de juros no país", afirmou.

Outro ponto que alimentará pressões sobre o Brasil é que a OMC aponta alta da média tarifária no país desde o último exame, em 2004. A alta foi de 1,5% nas tarifas de importação de produtos mais sensíveis, como têxteis, calçados e veículos. Isso enquanto o país persistia na cruzada contra as alíquotas de países ricos. De maneira geral, a constatação é que não houve mudança dramática na política comercial, e o país procurou gradualmente modernizar a aduana.

A OMC nota que a exportação teve um papel menor no crescimento econômico do que a impressão de fora, e atribui a alta do Produto Interno Bruto, nos últimos tempos principalmente, à demanda interna.

Ainda segundo fontes que tiveram acesso ao documento, outra conclusão é que a produção agrícola brasileira cresceu menos do que se imaginava, como um dos maiores produtores do mundo. Os subsídios rurais aumentaram, mas não têm comparação com os bilhões dados até por exportadores liberais, como Canadá e Austrália.