Título: Cúpula pedirá fim de embargo a Cuba
Autor: Romero , Cristiano
Fonte: Valor Econômico, 17/12/2008, Brasil, p. A6

Reunidos sob a liderança do Brasil, os 33 países da América Latina e do Caribe farão hoje declaração pelo fim do bloqueio econômico, comercial e financeiro imposto a Cuba, há 46 anos, pelo governo dos Estados Unidos. Este será um dos principais resultados da Cúpula da América Latina e Caribe sobre Integração e Desenvolvimento (Calc), que começou ontem e terminará hoje. Cuba e a manifestação de independência em relação aos EUA estão sendo os principais temas das quatro reuniões de cúpula em curso neste balneário da Bahia. Um sentimento anti-americano tem marcado o tom das manifestações. Ricardo Stuckert/PR

O presidente de Cuba, Raúl Castro, e Lula: mais difícil manter o isolamento

Segundo apurou o Valor, as declarações que a Calc fará hoje incluem também um comunicado sobre as Ilhas Malvinas, cuja propriedade o governo argentino reivindica historicamente à Inglaterra. Além disso, a cúpula formalizará apoio à solicitação do Sistema de Integração Centro-Americano (Sica) à União Européia para continuar concedendo ao Panamá os benefícios tarifários do Sistema Geral de Preferências (SGP).

Ontem, após o primeiro dia da Calc, o Grupo do Rio se reuniu para anunciar a inclusão de Cuba no grupo. "Desde quando o Brasil presidiu o Grupo do Rio, sugeriu a abertura de diálogo com Cuba", disse o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim.

Antes da reunião, o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, deu o tom. "Que nos reunamos sozinhos, sem hegemonia e sem a proteção de império algum. Já basta de império", declarou. "A OEA [Organização dos Estados Americanos] era como o ministério das colônias dos EUA, que faziam na OEA e na América Latina o que lhes dava vontade. Acabou esse tempo e agora que vem o novo presidente dos EUA é propício que os países do Sul falem com sua própria voz e peçam respeito do novo governo."

Chávez ainda fez uma piada com o episódio do par de sapatos atirado por um jornalista iraquiano no presidente americano, durante entrevista no domingo. "Vejamos os sapatos que jogaram em Bush: eu trouxe uns sapatos bem leves", disse o presidente venezuelano, que não participou da reunião do Mercosul e chegou atrasado para o encontro da União das Nações Sul-Americanas (Unasul).

Uma das estrelas dos encontros de cúpula de Costa do Sauípe, o discreto e pouco carismático presidente de Cuba, Raul Castro, chegou a Salvador, na noite de segunda-feira, mandando um "recado" ao presidente eleito dos Estados Unidos, Barack Obama. "Se o senhor Obama quiser discutir, discutimos; se não quiser discutir, não se discute. Está cada vez mais difícil manter Cuba isolada", afirmou. Castro também defendeu o fim da OEA. Por decisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que preside a reunião, Castro participou como convidado dos encontros de Mercosul e Unasul. Segundo ele, não há mais nenhuma razão, política ou econômica, para a manutenção do bloqueio a Cuba

Na reunião de cúpula do Mercosul, concluída na manhã de ontem sem avanços quanto às questões relacionadas ao funcionamento do bloco, os EUA também estiveram no centro das preocupações. Recentemente, o governo Bush decidiu suspender preferências tarifárias da Bolívia, em represália ao fato de o governo de La Paz ter cancelado o tratado de combate a drogas que tinha com o DEA, a agência de drogas dos EUA. Por isso, a Bolívia perdeu mercado de US$ 21 milhões para seus produtos têxteis.

Na falta dos Estados Unidos, o Mercosul. Os presidentes dos quatro países do bloco decidiram ontem oferecer à Bolívia o mercado bloqueado pelos americanos. O plano é que as economias do Mercosul absorvam, em 2009, US$ 30 milhões em exportações bolivianas de produtos têxteis. Ao discursar como representante de um país-associado na cúpula do Mercosul, o presidente da Bolívia, Evo Morales, atacou o governo Bush.

"A Bolívia sofreu vingança política do presidente Bush. Suspendeu a importação de têxteis, desrespeitando decisão do Congresso americano, não respeitou as leis internacionais e o governo boliviano está preparando uma ação (judicial)", afirmou Morales, que tratou de restringir seus ataques ao atual governo americano.

Na declaração da Calc que será divulgada hoje, os 33 países defenderão a reforma do Conselho de Segurança das Nações Unidas, tema que interessa diretamente ao Brasil. Em mais uma mensagem aos países ricos, os chefes de Estado dirão que essas nações causaram a atual crise financeira internacional, e condenarão o crescimento da xenofobia e da discriminação, além da "criminalização dos fluxos migratórios e as medidas que atentam contra os direitos humanos dos migrantes". Os países da Calc, diz o texto ao qual o Valor teve acesso, "reafirmaram que a livre circulação de pessoas é tão importante quanto a circulação de bens e os fluxos financeiros".