Título: Concessão de asilo a italiano foi correta, diz Lula
Autor: Leo , Sergio
Fonte: Valor Econômico, 16/01/2009, Brasil, p. A4
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendeu ontem enfaticamente a decisão do ministro da Justiça, Tarso Genro, de conceder status de refugiado político ao escritor e ex-integrante da esquerda armada italiana Cesare Battisti. A decisão de Genro constrangeu o Itamaraty, contrário à medida, mas, segundo a avaliação feita no Palácio do Planalto, baseada em informações da diplomacia brasileira, é incapaz de provocar uma crise política entre Brasil e Itália. Após a decisão de Genro, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) tendem a negar o pedido de extradição do italiano, feito pelo governo da Itália.
"É uma questão de soberania do Estado brasileiro: nós, assumindo uma posição soberana, tomamos decisão de entender que essa pessoa não precisava voltar para a Itália, que poderia ter status de refugiado", comentou Lula, em Ladário, na fronteira com a Bolívia, onde se encontrou ontem com o presidente boliviano, Evo Morales. Lula cobrou da Itália respeito à decisão "soberana" do Brasil, e disse não acreditar em deterioração nas relações bilaterais. "É uma decisão do Estado brasileiro, alguma autoridade italiana pode não gostar, mas terá de respeitar", disse. Lula questionou a consistência do processo, baseado em acusações de um beneficiado de um programa de delação premiada.
No Planalto, são lembrados como precedentes os asilo ao ex-ditador paraguaio Alfredo Stroessner e a George Bidault, ex-primeiro-ministro francês que comandou atentados contra o governo de Charles de Gaulle. Os auxiliares de Lula acreditam que Berlusconi não deixará que o caso se torne um conflito diplomático.
O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, ficou irritado ao lhe perguntarem ontem sobre o assunto. Ele deixou claro não ter influído na decisão, lembrando que a posição do Itamaraty foi a manifestada durante o julgamento do caso pelo Comitê Nacional para Refugiados (Conare), que foi favorável ao pedido de extradição por três votos a dois - o representante de Amorim votou a favor. Battisti é acusado de ser mandante de quatro assassinatos realizados pelo grupo guerrilheiro ao qual pertencia, mas nega ter responsabilidade nos crimes.
Nos julgamentos de extradições, os ministros do STF procuram separar dois aspectos: o crime comum imputado ao estrangeiro e as declarações de que este estaria sofrendo perseguição política em seu país. O aspecto que pesar mais é fundamental na decisão. Se os ministros entenderem tratar-se de crime comum, tenderão a conceder a extradição. Mas, se for demonstrada a perseguição ao acusado ou o caráter político do pedido, a extradição deve ser negada. Genro antecipou-se ao julgamento do STF ao considerar o italiano refugiado político. Isso criou um impasse adicional para o STF, pois a Lei dos Refugiados Políticos determina que a decisão do ministro da Justiça não será passível de recurso e deve ser apenas notificada ao Conselho Nacional para os Refugiados (Conare) e à Polícia Federal para a adoção de providências.
Em março de 2007, ao julgar a extradição do ex-dirigente das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) Oliverio Medina para a Colômbia, o atual presidente da Corte, Gilmar Mendes, concluiu que a decisão do Conare que concedeu a qualificação de refugiado a Medina foi administrativa e, portanto, não afetaria o processo judicial de extradição. Os demais ministros entenderam válida a decisão administrativa, porém, e derrotaram Mendes. Se o tribunal não contestou a decisão do Conare é pequena a possibilidade de contrariar a do ministro da Justiça.