Título: Rato de empresa
Autor: Verdini, Liana
Fonte: Correio Braziliense, 14/02/2010, Economia, p. 13

Crise amplia fraudes em corporações e faz crimes econômicos avançarem. No Brasil, esse tipo de infração abrange um quarto dos grandes grupos

As empresas brasileiras estão enfrentando um inimigo silencioso e traiçoeiro, que está, como admitem os próprios gestores, em plena expansão: os crimes econômicos. Pesquisa da consultoria PricewaterhouseCoopers (veja quadro) mostra que, no Brasil, cerca de um quarto das grandes corporações (24%) tiveram que lidar com esse tipo de situação nos últimos 12 meses. Pior: para quase um terço (27%) dos entrevistados, o problema aumenta e envolve, cada vez mais, pessoas que ocupam cargos de chefia.

A questão é realmente séria e está atingindo o coração dos grandes grupos no país: as finanças. Para 13% das organizações, as infrações resultaram em perdas superiores a US$ 1 milhão, enquanto que para 80% o prejuízo foi de até US$ 1 milhão. Em todo o planeta, mas principalmente nos países que formam o Bric (grupo composto por Brasil, Rússia, Índia e China, as economias emergentes mais promissoras no momento), os crimes econômicos que resultam em dano superior a US$ 1 milhão para as empresas afetam parcela maior: 17% no mundo e 25% no Bric.

Piora

Para a gerente sênior da PricewaterhouseCoopers Flávia Ribas, o agravamento da situação percebida pelas empresas pode não ser sinônimo de que a criminalidade está campeando nas organizações. ¿O número de registros vem crescendo porque cada vez mais empresários e executivos estão implementando mecanismos para detecção das violações cometidas por seus funcionários e por terceiros, como fornecedores, distribuidores, consultores etc.¿ Segundo a gerente, parte dos crimes registrados em 2009 pode estar sendo cometida há anos sem que fosse percebida.

A despeito da disseminação de instrumentos e técnicas para revelar as violações no meio corporativo, o ambiente de crise econômica(1), conforme os gestores entrevistados, agrava o risco de fraude. Em todo o mundo, 40% dos que responderam à pesquisa acreditam firmemente nessa afirmação, ao passo que no Brasil apenas 16% concordam com isso. Para esses executivos, os aumentos das oportunidades, da pressão e do incentivo, como, por exemplo, o estabelecimento de metas muito agressivas, criam um ambiente favorável às fraudes.

¿Com a crise, as empresas nos mercados emergentes foram muito pressionadas por suas matrizes em países desenvolvidos a produzir resultados. Toda essa pressão pode estimular as irregularidades¿, avaliou Mona Clayton, sócia da PricewaterhouseCoopers. Além disso, com a necessidade de reduzir os orçamentos, algumas corporações podem ter enxugado os custos cortando mecanismos de identificação, monitoramento e investigação das violações. De acordo com a pesquisa, no Brasil, apenas 20% dos crimes foram descobertos por auditoria interna(2). Os 80% restantes foram revelados por canais informais: 20% por denúncia interna e informal; 13% depois de uma reestruturação de funcionários; 13% por acidente e os restantes 34% por outros meios, como, por exemplo, a área de segurança corporativa.

Infrações

A pesquisa mostra que o tipo de crime mais comum em todo o mundo, incluindo o Brasil, é o roubo de ativos, isto é, de itens do patrimônio da companhia, como grampeador, calculadora e até bens de maior valor, como notebooks. ¿Embora mais corriqueiro, esse tipo de violação tem uma relevância financeira mais baixa para a empresa¿, analisou Flávia.

De acordo com o estudo, o segundo tipo de crime mais habitual é a fraude contábil. ¿Esse crime pressupõe a manipulação de resultados. Portanto, envolve valores mais altos e pode representar, inclusive, prejuízo para os acionistas¿, disse ela. Por isso mesmo, as fraudes contábeis requerem o envolvimento de funcionários mais graduados, chegando mesmo à alta administração. ¿São pessoas que têm o poder de decisão.¿

Para o futuro, os executivos brasileiros se revelam otimistas em relação à vulnerabilidade de suas empresas perante os crimes econômicos. Tanto que apenas um terço dos gestores dos grandes grupos (29%) admitiram que o roubo de ativos continuará a acontecer nos próximos 12 meses; 15% acreditam que pode haver casos de corrupção e suborno; 13%, casos de roubo de dados; e 11% de fraudes contábeis. ¿O que podemos dizer depois de 10 anos acompanhando essas pesquisas é que nem sempre o que os executivos esperam do futuro reflete a realidade¿, disse Flávia. A pesquisa recomenda, inclusive, que as empresas reavaliem essas perspectivas ¿a fim de viabilizar a implementação de controles internos capazes de combater efetivamente as ocorrências de crimes econômicos¿, conclui o texto.

1 - Prejuízos A crise mundial começou com o superaquecimento do mercado imobiliário norte-americano, movido a baixas taxas de juros e boas condições de financiamento. Com o aumento da inadimplência das hipotecas a partir de 2007, várias instituições quebraram, causando prejuízos a outras e provocando perdas generalizadas no mundo todo.

2 - Controle O processo de auditoria interna é uma prática normal entre grandes organizações empresariais, que periodicamente têm suas atividades averiguadas sob a ótica de regras de controle apropriadas à gestão. As auditorias também podem ser externas, quando realizadas por profissionais sem relação direta com o órgão ou empresa analisados.