Título: Empresas disputam contratos na Venezuela
Autor: Leo , Sergio
Fonte: Valor Econômico, 29/01/2009, Brasil, p. A3

Nem a crise financeira nem o tombo das cotações de petróleo derrubaram o projeto de cooperação entre os governos brasileiro e venezuelano para construção de indústrias voltadas ao consumo interno da Venezuela, uma das principais iniciativas do presidente Hugo Chávez para enfrentar o crônico desabastecimento local. Nesta semana, a Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) abriu inscrições para cadastrar empresas do Brasil interessadas em fornecer máquinas e equipamentos para montagem de sete indústrias no país vizinho. Negócios que podem chegar a US$ 500 milhões.

O plano de instalação de indústrias não escapou ileso da mudança no ambiente econômico mundial. Chávez, no ano passado, anunciou um plano de construção de 200 indústrias "populares", e orientou sua equipe a discutir com o Brasil a possível colaboração brasileira na instalação de pelo menos sete tipos de indústria voltadas ao consumo popular.

A percepção de que os recursos do Estado venezuelano não serão tão fartos após a queda do preço de petróleo, de mais de US$ 140 o barril para menos de US$ 40, fez com que o projeto previsto, agora, seja a instalação de sete fábricas com apoio brasileiro (não mais um número indeterminado de instalações industriais de sete tipos diferentes).

"A escala e o timing da implantação dos projetos será decisão da Venezuela", disse o diretor de Assuntos Internacionais da ABDI, Roberto Alvarez, que ouviu dos venezuelanos a garantia de que querem iniciar a última fase de instalação das fábricas ainda neste semestre, com recursos do Fundo de Desenvolvimento montado com recursos do petróleo na fase de alta de preços.

As empresas interessadas em fornecer para os projetos industriais ou associar-se aos futuros empreendimentos venezuelanos (como minoritárias, sócias do governo), poderão apresentar suas propostas até 27 de fevereiro. Álvares comenta que as empresas de serviço brasileiras também poderão vender seus produtos à Venezuela. O valor desses serviços, especialmente os de consultoria e gerenciamento, poderão ser "valorados", convertidos em ações dos empreendimentos, para os interessados em operar as empresas em sociedade com o governo. Os valores dos serviços a serem prestados não estão computados nos US$ 400 milhões a US$ 500 milhões previstos para compra de equipamentos - sujeitos a negociação, ainda, adverte ele.

Em edital divulgado nesta semana, a ABDI detalha equipamentos que serão comprados pelo governo venezuelano para instalação das sete fábricas, que produzirão 1) latas e tampas metálicas; 2) equipamentos para processar alimentos; 3) tubos e conexões de PVC; 4) placas eletrônicas montadas; 5) fundição, usinagem e montagem de válvulas para indústria de petróleo; 6)embalagens de vidro; e 7) equipamentos para refrigeração industrial.

Para evitar atrasos e dificuldades enfrentadas pela Venezuela com outras indústrias montadas no início do plano de industrialização estatal de Chávez, o governo brasileiro financiou, por cerca de R$ 1 milhão, estudos da consultoria Certi, ligada à Universidade de Santa Catarina, com treinamento de engenheiros venezuelanos e assessoria de especialistas brasileiros em desenho de fábricas e engenharia de produção.

O interesse das empresas brasileiras pode ser medido pela iniciativa da Abimaq, a associação da indústria de máquinas e equipamentos, de abrir escritório nas instalações da estatal de petróleo venezuelana, a PDVSA, em Caracas. Outros setores têm empresas interessadas, embora seja cedo para identificar os possíveis fornecedores, como informa o gerente de tecnologia e política industrial da Associação Brasileira da Indústria de Equipamentos Elétrico-Eletrônicos (Abinee), Fabián Yaksic. A Abinee acredita que as empresas do setor terão mais interesse em transferência de know-how que em montagem de equipamentos, mas Yaksic acredita que há mais chances de sucesso nos projetos de tubos e conexões, de válvulas (onde a PDVSA é cliente cativo) e latas e tampas.

Chávez tem garantido ao governo brasileiro que não faltarão recursos para a cooperação com o Brasil, como voltou a assegurar no último encontro com Lula, em janeiro. Os editais divulgados pela ABDI detalham os volumes e prazos de instalação das indústrias, que, em alguns casos, chegam a cinco anos. Os volumes de produção serão adaptados à demanda no país, e à disponibilidade de recursos, acredita Alvarez. O fato de que as associações empresariais do Brasil assessoraram os governos na definição das especificações dos equipamentos é uma garantia de que os projetos serão adequados às necessidades de produção imaginadas por Chávez e à capacidade de fornecimento das empresas brasileiras, crê a ABDI.