Título: Buscas miram Paulo Octávio
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Fonte: Correio Braziliense, 14/02/2010, Cidades, p. 25

Caixa de pandora

Dois dos alvos da PF na operação de ontem estão diretamente ligados ao governador em exercício. Advogado nega proximidade

Paulo Octávio nas obras da Linha Verde, ontem pela manhã: Não quero deixar a cidade parada diante da crise política

Das pessoas que foram alvo ontem de mandados de busca e apreensão por parte da Polícia Federal (PF), pelo menos duas são ligadas ao governador em exercício Paulo Octávio (DEM). As residências do ex-secretário de Governo José Humberto Pires e do policial civil aposentado Marcelo Toledo Watson, ambas no Lago Sul, foram visitadas por equipes da inteligência da PF, que cumpriu determinação do ministro Fernando Gonçalves, relator do Inquérito nº 650 no Superior Tribunal de Justiça (STJ). O inquérito judicial investiga as denúncias de corrupção e pagamento de propina à cúpula do GDF, deputados distritais e empresários de Brasília e deu origem à Operação Caixa de Pandora.

Marcelo Toledo é apontado pelo ex-secretário de Relações Institucionais Durval Barbosa ¿ delator do suposto esquema à Justiça ¿ como um dos operadores da distribuição de dinheiro ilícito. De acordo com as denúncias, Toledo também seria o operador de Paulo Octávio no suposto esquema de corrupção envolvendo empresas de informática.

Em uma das gravações entregues por Durval à polícia, o policial civil aparece entregando um pacote de dinheiro à Durval e dá a entender, no diálogo, que parte da quantia deveria ser destinada a Paulo Octávio. Toledo é sócio da Voxtec Engenharia e Sistemas Ltda. A empresa faz parte de um consórcio que tem contrato no valor de R$ 21 milhões com o Transporte Urbano do Distrito Federal (DFtrans). Em outro vídeo em poder da PF, Marcelo Carvalho, principal executivo do Grupo Paulo Octávio, foi filmado negociando suposto pagamento de propina ao governador em exercício.

Nas investigações do Ministério Público Federal (MPF), o ex-secretário de Governo José Humberto é citado como um dos sócios da construtora Conbral, que faz parte do consórcio responsável pela construção do residencial Ilhas do Lago, às margens do Lago Paranoá. A PauloOctavio Empreendimentos, de propriedade do governador em exercício, fez parte do mesmo grupo empresarial.

As investigações da Caixa de Pandora apontam que a base societária da Conbral é a Milênio Empreendimentos Imobiliários, cujo sócio-proprietário é José Humberto, que deixou o GDF depois do escândalo. Em dezembro, a PF apreendeu na Conbral cópia de uma transferência bancária que mostraria a triangulação de empresas (leia matéria ao lado).

Defesa O advogado de Paulo Octávio, Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, disse ontem ao Correio que a sociedade entre a PauloOctávio Empreendimentos e a Conbral foi desfeita assim que o Ilhas do Lago foi construído. ¿Os empresários se uniram à época para construir o empreendimento e depois acabou o consórcio. A prática é muito comum no mercado imobiliário¿, justificou.

Sobre as citações feitas por Marcelo Toledo em nome do governador em exercício nas gravações feitas por Durval, o advogado é firme. ¿Marcelo Toledo nunca teve vínculo profissional e institucional com Paulo Octavio¿, disse. Antônio Castro contou que o novo chefe do Executivo conheceu o policial aposentado quando este foi eleito suplente da Câmara Legislativa, mas que os dois não tinham uma relação próxima.

José Humberto e Marcelo Toledo não foram encontrados ontem para falar sobre a operação da Polícia Federal.

Visitas a obras e articulação política

No dia em que comemorou 60 anos, o governador em exercício Paulo Octávio (DEM) trocou a viagem marcada com a família por trabalho. A prisão de José Roberto Arruda (sem partido) mudou os planos e a rotina do então vice-governador. Ontem, ele vistoriou obras no sistema viário de Brasília, teve reuniões com secretários do GDF e pediu ajuda para governar até as eleições de outubro. O apelo foi direcionado à população, aos colegas de outras legendas e até ao presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva.

¿Não quero deixar a cidade parada diante da crise política¿, afirmou. Segundo o atual chefe do Executivo local, a agenda será extensa até a quarta-feira de cinzas, quando terá encontros importantes para azeitar novas articulações. Durante o feriado, Paulo Octávio pretende visitar Arruda na Polícia Federal. ¿Vou ver o melhor momento de visitá-lo¿, afirmou.

O intuito de dar continuidade ao mandato iniciado pelo governador afastado será a prioridade de Paulo Octávio nos próximos 10 meses. Os quatro pedidos de impeachment protocolados na Câmara Legislativa contra ele não o preocupam: a renúncia do cargo foi descartada. ¿Eles foram muito apressados. Estou no início do mandato¿, reclamou. A sustentação dos pedidos de afastamento é o suposto envolvimento dele nas denúncias de pagamento de propina e corrupção investigados pela Operação Caixa de Pandora.

Paulo Octávio pretende fazer alterações no primeiro escalão e pediu aos titulares das 16 secretarias de governo que colocassem os cargos à disposição. O secretário de Cultura, Silvestre Gorgulho, já se afastou. ¿Não quero trocar equipe. Apenas quero ter tranquilidade para fazer as composições políticas que serão necessárias¿, disse.

O governador em exercício disse ter conquistado o apoio de quatro partidos (PPS, PTB, PSDB e PMDB). Na quarta-feira, se reunirá ainda com integrantes de outras 12 legendas para negociar condições que garantam a boa governabilidade da cidade. O assunto será discutido com o presidente Lula no mesmo dia. Na pauta do encontro presidencial, ainda há a ameaça de intervenção federal e os 50 anos de Brasília. ¿Irei entregar uma carta a ele (Lula)¿, adiantou. Paulo Octávio visitou as obras da Linha Verde, na Estrada Parque Taguatinga (EPTG) e na Estrada-Parque Guará (EPGU), em frente ao Zoológico. (Luísa Medeiros e Manoela Alcântara)

Sujeira no shopping Ariadne Sakkis/CB/D.A Press

Vinte e cinco pessoas do Movimento Fora Arruda se reuniram ontem em frente ao Brasília Shopping para protestar contra a permanência de Paulo Octávio no comando do Governo do Distrito Federal. Os manifestantes jogaram ovos e despejaram 15 sacos cheios de lixo na entrada do estabelecimento, construído pela empresa do governador em exercício. ¿Essa sujeira não é nem um centésimo da sujeira de Arruda e Paulo Octavio¿, afirmou Walter Célio, um dos integrantes do movimento. No fim do protesto, os manifestantes limparam a sujeira que haviam espalhado. Eles justificaram que o objetivo do ato é demonstrar a indignação com as denúncias de corrupção que envolvem o GDF e não sobrecarregar os funcionários da limpeza do shopping.

Documento complica ex-secretário

Uma apreensão feita pela Polícia Federal (PF) durante as investigações da Operação Caixa de Pandora mostrou ligações societárias entre o ex-secretário de Governo do Distrito Federal José Humberto Pires e a construtora Conbral. Em dezembro do ano passado, os agentes encontraram no prédio da construtora, no Setor de Armazenamento e Abastecimento Norte (SAAN), cópia de uma transferência bancária de R$ 100 mil feita pela Guará Empreendimentos Imobiliários à construtora. A base societária da Guará Empreendimentos é a própria Conbral e a Milênio Empreendimentos ¿ cuja parte pertence a José Humberto.

O homem de confiança de José Roberto Arruda (sem partido) foi afastado do GDF desde as denúncias de pagamento de propina e corrupção reveladas, em novembro, pelo ex-secretário de Relações Institucionais Durval Barbosa. Ele foi apontado pelo delator como o distribuidor do dinheiro ilícito do suposto esquema.

Investigações da PF apontam que na Conbral e na casa do conselheiro afastado do Tribunal de Contas do DF (TCDF), Domingos Lamoglia, também citado por Durval no inquérito do Superior Tribunal de Justiça (STJ), foram encontradas cédulas cujos números de série coincidem com aqueles contidos nas notas distribuídas pelo ex-secretário de Relações Institucionais sob monitoramento da PF. Segundo o auto de apreensão da polícia, ¿a construtora era o local onde o dinheiro ficava guardado, aguardando sua distribuição entre os envolvidos no esquema de corrupção¿. José Humberto não foi localizado ontem pela reportagem, mas em outras ocasiões negou que fosse sócio da Conbral.