Título: Em Davos, Rússia e China criticam modelo ocidental
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Fonte: Valor Econômico, 29/01/2009, Internacional, p. A15
Os líderes da China e Rússia mudaram drasticamente, ontem, a agenda econômica mundial que vinha sendo ditada por seus colegas ocidentais, reprovando-os por falhas de políticas que, segundo eles, levaram à crise financeira mundial. AP O premiê russo Putin: os bancos de investimento deixaram de existir
Wen Jiabao, o primeiro-ministro chinês, e Vladimir Putin, primeiro-ministro da Rússia, usaram o Forum Econômico Mundial em Davos para afirmarem que as duas potências em ascensão precisam ter um papel maior na nova ordem econômica mundial.
Putin zombou dos delegados americanos que no Fórum de Davos do ano passado falaram sobre "a estabilidade fundamental e das perspectivas sem nuvens" da economia dos Estados Unidos, dizendo que "os bancos de investimento, o orgulho de Wall Street, praticamente deixaram de existir".
Wen fez comentário duros sobre as "políticas macroeconômicas inapropriadas" de alguns países e o "modelo insustentável de desenvolvimento caracterizado por períodos prolongados de poupança baixa e consumo elevado".
AP O premiê chinês Jiabao: modelo inviável de poupança baixa e consumo alto Ele atacou "a busca cega por lucros" das instituições financeiras e sua "falta de autodisciplina".
Os pronunciamentos cheios de confiança dos dois contrastaram com o clima sombrio que paira sobre a reunião anual dos líderes políticos, financeiros e sociais mundiais. "Isso é Davos sob a bandeira russa", disse a jornalistas Dmitri Peskov, porta-voz de Putin.
"Nos últimos meses, praticamente todos os discursos sobre esse tema começaram com críticas aos Estados Unidos. Mas eu não vou fazer isso", disse Putin. Segundo ele, o conceito de um mundo unipolar em torno do poderio dos EUA ficou "obsoleto". Putin defendeu o que considerou ser uma mudança "irreversível" para um sistema com diversas moedas fortes em vez de um sistema em que só o dólar tenha peso.
Enquanto os dois líderes falavam, um assessor graduado de Dmitri Medvedev, o presidente da Rússia, criticou a escala do novo pacote de socorro econômico do governo americano e projetou um déficit orçamentário, dizendo que isso vai sugar liquidez de outros mercados mundiais.
"É desencorajador o comunicado de Barack Obama, de que ele vai administrar um déficit de US$ 1 trilhão nos próximos anos. Para nós, isso significa que toda a liquidez livre no mundo vai correr para os títulos do Tesouro americano", disse Igor Yurgens, que comanda um centro de estudos que aconselha Medvedev.
Yurgens comparou a política às políticas protecionistas do tipo "empobreça vossos vizinhos" adotadas na década de 1930. "É claro que Obama acredita que os chineses e os russos comprarão os títulos do Tesouro dos EUA. É uma coisa muito egoísta e filosoficamente trata-se de protecionismo."
Wen também proclamou sua preocupação em relação ao protecionismo enquanto pediu o estabelecimento de "uma nova ordem econômica mundial que seja justa, igualitária, sólida e estável".
A China teve "a confiança, as condições e a habilidade para manter um crescimento econômico contínuo e acelerado e continua contribuindo para o crescimento econômico mundial", disse Wen. E que será difícil para a China cumprir a previsão de um crescimento de 8% em 2009, mas ela "pode ser atingida com trabalho duro".
Wen não mencionou os comentários feitos na semana passada por Timothy Geithner, o novo secretário do Tesouro dos EUA, acusando a China de manipular seu câmbio para incentivar a economia.
Wen insistiu que a China está ajudando o mundo a se recuperar por meio de medidas internas que visam manter a economia doméstica em boa forma, apesar dos impacto da crise global. Wen voltou a fazer críticas à gestão dos bancos americanos e reiterou seu argumento de que foram os erros das políticas ocidentais - e não os excedentes de poupança chineses - os responsáveis principais pela crise, onde os bancos estão em melhor situação que os do Ocidente.
Ele disse, porém, que uma relação de confronto com os EUA "fará dos dois perdedores". Os comentários de Yurgen destacaram os desafios que a economia russa está enfrentando no combate à crise.
A Rússia está enfrentando sua primeira recessão em dez anos e já gastou um terço de suas reservas em moedas fortes no combate a um ataque ao rublo que foi desencadeado pela grande queda nos preços das commodities e pela crise de crédito mundial.