Título: Brasil e UE vão negociar acordos setoriais
Autor: Moreira , Assis
Fonte: Valor Econômico, 22/12/2008, Brasil, p. A3

O Brasil e a União Européia (UE) planejam estimular a negociação de cinco acordos setoriais para troca de preferências de produtos industriais específicos por meio da parceria estratégica lançada no ano passado e que será detalhada hoje, na cúpula do Rio. O plano de ação para 2009-2011 da parceria estratégica, ao qual o Valor teve acesso, prevê a condução de "setoriais pilotos" começando pelas áreas de têxteis e confecções, produtos florestais, siderúrgicos, metais não ferrosos e minerais.

Por esse tipo de iniciativa, os setores envolvidos trocam preferências, como baixa substancial de tarifas para a entrada de produtos dos parceiros, que precisarão ser consolidadas num acordo UE-Mercosul. Para os dois lados, a iniciativa complementa as negociações de um acordo de livre comércio birregional. Brasil e UE vão se engajar na luta contra o protecionismo, mas sabem que a prudência é fundamental em tentativas de liberalização, mesmo setorial, no contexto atual de crise financeira e recessão global.

A negociação setorial foi um dos principais impasses na Organização Mundial do Comércio (OMC) e impediu a convocação, este mês, de reunião de ministros para tentar um acordo agrícola e industrial global. Os EUA faziam exigências para Brasil, China e Índia se comprometerem com o resultado das negociações, sem saber como elas terminariam, em pelo menos dois setores obrigatórios, um deles o químico.

A União Européia teve abordagem diferenciada e chegou a reclamar que nem ela poderia aceitar as condições exigidas por Washington para fazer acordos setoriais.

Na semana passada, os setores têxteis do Brasil e da UE levaram adiante uma discussão de longa data para tentar baixar alíquotas, eliminar problemas burocráticos nas alfândegas e estimular joint-ventures, tentando pavimentar o terreno para um acordo UE-Mercosul.

O encontro de cúpula entre os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva, o francês Nicolas Sarkozy, e o presidente da Comissão Européia, José Durão Barroso, quer manter a negociação UE-Mercosul viva na agenda, mas sem estabelecer prazo de retomada. Isso porque a a discussão birregional continua vinculada à combalida Rodada Doha na OMC. Depois de inúmeros fiascos, essa negociação agora espera a sinalização do presidente eleito dos EUA, Barack Obama, para saber até que ponto ela ficará congelada.

A agenda da cúpula dará ênfase à crise financeira global e estímulos para reformar a arquitetura dos mercados. Abordará questões de energia e mudança climática, reforço do multilateralismo (inclui a reforma do Conselho de Segurança das Nações Unidas), luta contra a pobreza, relações bilaterais e situação regional.

A parceria estratégica vai estabelecer um mecanismo de consultas sobre questões sanitárias e fitossanitárias (conhecida pela sigla inglesa SPS), para "compreensão mútua das respectivas condições de SPS que podem afetar o comércio". De fato, esse tema tem provocado as maiores fricções na área comercial, a começar pelas barreiras à entrada de carne bovina brasileira no mercado comunitário. "Nossa expectativa é que a parceria estratégica vai reforçar os vínculos comerciais e de investimentos concretamente", diz o embaixador brasileiro na UE, Ricardo Neiva Tavares.

Na área de migração, um acordo que acaba com visto de entrada para estadias de três meses só deixará de fora o Reino Unido e a Irlanda, que têm outros acordos com o Brasil. Esses dois países têm sido rápidos em mandar de volta turistas brasileiros.

Na área climática, o Banco Europeu de Investimentos tem planos de financiar programas nesse setor, em cooperação com o BNDES. O banco europeu já acenou com interesse inclusive em financiar produção sustentável de etanol, antes da dura campanha contra o produto na Europa.

Em comunicado, o presidente da Comissão Européia, José Durão Barroso, destacou que "a evolução da crise financeira e o papel proativo desempenhado pelo Brasil no G-20 vieram mais uma vez confirmar a importância do aprofundamento das relações com as economias emergentes, como o Brasil". Segundo ele, "a solução de alguns dos desafios cruciais que enfrentamos, como as alterações climáticas e a energia sustentável, passa pelo Brasil e a cúpula do Rio vai nos permitir discutir sobre a melhor forma de avançarmos nessas importantes questões e de colaborarmos para assegurar um sistema multilateral efetivo".

A comissária de Relações Exteriores da UE, Benita Ferrero-Waldner, afirmou que o Plano de Ação Conjunto que a UE e o Brasil aprovarão no Rio é "um roteiro que traduz a ambição das nossas relações e, sobretudo, nos permitirá desenvolver em conjunto de atividades concretas num largo espectro de domínios".

Em Bruxelas, a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil) assinou uma parceria com a EuBrasil, associação sem fins lucrativos que promove as relações econômicas entre Brasil e Bélgica. Segundo Luigi Gambardella, presidente da EuBrasil, o acordo visa aumentar a amplitude de ação da Apex-Brasil no continente europeu, de forma a monitorar questões comunitárias que possam influenciar o exportador brasileiro. A Apex-Brasil espera estabelecer e fortalecer relacionamentos com empresas, câmaras de comércios e órgãos comunitários na Europa. Seu presidente, Alessandro Teixeira, terá um assento no Conselho da EuBrasil.