Título: Aquisições da Vale após a crise visam ativos estratégicos
Autor: Durão , Vera Saavedra
Fonte: Valor Econômico, 02/02/2009, Empresas, p. B6

A aquisição dos ativos da Rio Tinto, fechada na madrugada de sexta-feira, mostra o novo caminho adotado pela Vale do Rio Doce para ir às compras em plena crise econômica global. A estratégia de aquisição da companhia para os tempos de vacas magras da mineração prioriza a compra de ativos de pequeno e médio porte que têm sinergias com os negócios atuais, ao invés de sair à caça de mineradoras robustas e caras, como a suiça Xstrata. Tanto que a mineradora brasileira não titubeou em desembolsar US$ 750 milhões pelo sistema de minério de ferro de Corumbá (MT) da anglo-australiana, incluindo a logística, e mais US$ 850 milhões por depósitos de potássio na Argentina e Canadá.

Com US$ 15 bilhões em caixa para gastar, a Vale dispendeu a soma de US$ 1,9 bilhões em quatro ativos, após a deflagração da crise mundial, incluindo o negócio com a Rio Tinto. No final de novembro, adquiriu por US$ 10 milhões a PGT, uma empresa especializada em identificação de áreas de petróleo. Em meados de dezembro, pagou US$ 65 milhões por 50% de participação numa empresa de cobre a ser criada pela sul-africana African Rainbow Minerals Limited (ARM), que tem negócios no famoso "cinturão de cobre africano", metal que é um dos focos da Vale.

Antes do Natal, a companhia firmou contrato para ficar com 100% dos ativos de exportação de carvão da Cementos Argos, na Colômbia, por US$ 300 milhões. Há 10 dias, anunciou negociações com a Woodside Energia Investimentos em Exploração de Petróleo para deter metade da participacao da empresa em consórcios da Bacia de Santos, visando explorar gás para consumo próprio.

O montante gasto até agora é um valor considerado "folgado" por analistas comparado ao caixa que tem à sua disposição. Mas, mesmo assim, eles consideraram "salgado" o preço pago pela mina da Rio Tinto, mesmo incluindo o sistema logístico pelo rio Paraguai. Rodrigo Ferraz, da corretora Brascan, calculou que a Vale pagou US$ 300 a tonelada pelo minério de Corumbá. "É caro nesta base, mas a Vale não é uma empresa júnior e sabe o que está fazendo. Ela não deve estar olhando só os US$ 300, mas enxergando um porte maior do que os 2,5 milhões de toneladas de minério, capacidade atual da mina".

Para Ferraz, esse valor cai para US$ 209 se for levado em conta que a Vale pretende implementar o plano da Rio Tinto de expandir a produção da mina para 12,8 milhões de toneladas até 2010, investindo US$ 2,5 bilhões. O que pode estar por trás desta valorização é que o negócio abre espaço para interesse da Vale nos ativos da MMX Corumbá, criando um polo de mineração no Centro-Oeste. "Aí sim, o ganho de sinergia de uma operação com a outra são gigantescos", avaliou Ferraz.

José Viveiros, diretor de ferrosos da ArcelorMittal Serra Azul, especialista em mineração, parabenizou a Vale pela aquisição. Segundo ele, ela comprou Corumbá mais por conta da alta qualidade do minério local. Segundo ele, é excepcional e muito raro em termos de teor. É o tipo granulado, que vai direto ao alto-forno, sem necessidade de concentração, com 67% de teor de ferro. "Ó negócio foi um ponto fora da curva, pois hoje ninguém está comprando nada. Mas a Vale tem caixa e a sorte de não ter comprado a Xstrata. O que pareceu um erro, virou acerto", disse.

A mina da Rio Tinto, um ativo de classe mundial, é a céu aberto e fica em Mato Grosso do Sul. Os ativos de logística incluem barcaças e porto fluvial de San Nicolas, na Argentina. A mina possui reservas provadas e prováveis de 210 milhões de toneladas e recursos minerais de 583 milhões de toneladas, com 62,5% de teor. Os ativos de logística possibilitam ter 70% de auto-suficiência no transporte do produto através do rio Paraguai. Recentemente, a Vale fez uma encomenda de 32 barcaças a estaleiros nacionais, num investimento de US$ 122,3 milhões, que certamente serão para uso na sua nova empresa.

A compra dos ativos de potássio mostram outro foco da Vale, além do minério, cobre e carvão, que é o negócio de fertilizantes, um nicho promissor, alinhado a estratégia de crescimento da companhia.

Com esta nova política de aquisições, a mineradora sinaliza ao mercado que está apostando numa virada forte do mercado mais à frente. "São promessas de grandes operações no futuro. Se o mercado virar, a Vale será a primeira a colher os frutos. Do contrário, o risco é enorme", analisou Rodrigo Ferraz.