Título: Debate sobre spread tira o foco sobre BC
Autor: Ribeiro , Alex
Fonte: Valor Econômico, 02/02/2009, Finanças, p. C1

Os bancos públicos estão no centro de uma controvérsia no governo sobre os juros e os spreads bancários. Fontes ouvidas pelo Valor relataram que o contencioso afetou não apenas as instituições federais, que estão sendo pressionadas pelo presidente Lula a cortar juros. Os critérios estatísticos do Banco Central para calcular os spreads foram questionados e o Ministério da Fazenda foi cobrado para reduzir o custo da intermediação financeira no país.

Uma fonte do governo aliada ao presidente do BC, Henrique Meirelles, disse que ao levantar dentro do governo a bandeira dos altos spreads cobrados pelos bancos públicos, ele conseguiu tirar o foco da política monetária, que vinha sendo publicamente criticada pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, em fins de 2008. O principal objetivo desse movimento foi fazer a Fazenda, que criticava os altos juros básicos (a taxa Selic) fixados pelo Comitê de Política Monetária (Copom), explicar por que não fazia nada para controlar os excessos cometidos pelos bancos federais, que estão sob a sua alçada.

Duas razões levaram o presidente Lula a assumir a bandeira levantada por Meirelles, informou uma alta fonte do Palácio do Planalto. O presidente também queria tirar o foco das críticas à política monetária porque, no fim das contas, a imagem de todo o governo acabava arranhada pelo chamado "fogo amigo". O entendimento do Palácio do Planalto é que a crise internacional criou uma oportunidade histórica para a taxa Selic cair, o BC está ciente disso e fará o possível para aproveitá-la. Além disso, o presidente Lula se sensibilizou com os números apresentados por Meirelles, que, de fato, mostram que os bancos públicos subiram os juros depois da crise.

Os dados do BC são particularmente negativos no que diz respeito ao Banco do Brasil, o que deixou o presidente da instituição, Antônio Francisco de Lima Neto, em situação delicada. Este não era o primeiro sinal de descontentamento de Lula com a direção do BB. Por ocasião da negociação com o banco Votorantim, o presidente Lula havia manifestado a preferência para que, na compra, o BB assumisse o controle acionário.

Lima Neto, porém, convenceu o presidente Lula de que, se o Votorantim passasse para o controle estatal, perderia agilidade para expandir a sua carteira de veículos. Nesse caso, Lula endossou os argumentos técnicos, mas, sobre os juros cobrados pelo BB, a determinação foi de que eles fossem reduzidos imediatamente. Apesar do desgaste provocado pelo episódio dos spreads bancários, Lula não pretende tirar Lima Neto da presidência do BB porque ele teria o perfil técnico adequado à posição.

O BB reconhece que, logo após a crise, seus juros subiram porque a instituição perdeu o referencial de taxas. Em entrevista ao Valor no início de janeiro, Lima Neto disse que todos os bancos ficaram perdidos. Entre fins de setembro e início de outubro, instituições financeiras privadas chegaram a divulgar várias tabelas de juros por dia para as concessionárias de veículos. Mas o BB sustenta, nas discussões dentro do governo, que suas taxas voltaram aos patamares anteriores aos da crise financeira.

O problema é que essa baixa não estaria se refletindo nas estatísticas divulgadas pelo BC, devido a falhas da metodologia usada pela autoridade monetária. O presidente Lula determinou que a metodologia do BC seja debatida e, dentro de duas semanas, sejam apresentados dados definitivos que mostrem quem tem razão sobre os juros cobrados pelos bancos federais.

Mesmo antes do resultado desse levantamento, os bancos federais já estão tomando providências para reduzir os juros. A Caixa Econômica Federal, que já cobra os juros mais baixos entre os grandes bancos de varejo, está concluindo estudos para, nesta semana, anunciar uma nova redução de suas taxas. Segundo um executivo da instituição, a taxa de inadimplência é uma variável central para determinar o nível adequado dos juros. Os bancos que conseguirem calculá-la com precisão vão ganhar fatias de mercado.

Paralelamente, um grupo de trabalho, formado pelo BC e pela Fazenda, ficou encarregado de estudar medidas que possam auxiliar os bancos federais na redução dos juros e dos spreads bancários. Esta é uma agenda antiga dentro do governo, que contempla pontos como a redução de tributos, cortes de depósitos compulsórios e medidas para ampliar a competição bancária. Desta vez, porém, o foco será em medidas que possam contribuir para a redução dos spreads dos bancos públicos.