Título: Básicos ajudam balança, mas janeiro tem saldo negativo
Autor: Leo , Sergio
Fonte: Valor Econômico, 03/02/2009, Brasil, p. A3
A deterioração do comércio exterior brasileiro fez surgir, no primeiro mês de 2009, um resultado que o país não assistia desde março de 2001: as importações superaram as exportações e provocaram um déficit na balança comercial de US$ 518 milhões. O aumento das vendas de commodities como milho, açúcar e soja, em comparação com janeiro de 2008, leva o governo a crer que o comércio exterior brasileiro continuará muito dependente dos produtos básicos neste ano. É forte a queda na exportação dos produtos manufaturados, como automóveis e têxteis.
"A crise não é brasileira, é mundial", argumentou o secretário de Comércio Exterior, Welber Barral. Ele prevê resultados negativos também em fevereiro e março, quando começa a safra agrícola. "Vai ser um ano ruim para todo mundo", diz ele, que diz ser impossível ao governo fazer, agora, no "vórtice da crise", a tradicional previsão sobre o comportamento das exportações em 2009.
Barral acredita que a manutenção do crescimento nos países emergentes, ainda que menor fará com que as vendas para estes mercados aumentem mais que para os países desenvolvidos ao longo do ano. Ele argumenta que, apesar da queda em relação aos níveis máximos alcançados em 2008, os preços das commodities estão em um patamar suficiente para compensar a queda no volume de vendas.
"Não haverá grande queda nos preços das commodities neste ano, e a queda nas exportações de produtos básicos será menor que em manufaturados", comentou. Ele lembrou que, até novembro, o Brasil manteve crescimento nas exportações, enquanto países emergentes registravam queda, especialmente nas economias fortemente dependentes de poucas commodities como Rússia e Chile, ou dependentes do mercado dos Estados Unidos, como China e México. Em dezembro, a queda nas exportações do Brasil foi a menor entre esses grandes exportadores.
Ao comentar o resultado da balança comercial, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, atribuiu exatamente à queda dos preços das commodities vendidas aos países emergentes o mau resultado das exportações. Mas anunciou que o governo quer incrementar as vendas aos países vizinhos, que caíram 37% em janeiro, estimulando a adoção do comércio em moeda local, como feito com a Argentina desde o ano passado.
A queda mais impressionante, e de maior impacto no resultado das exportações do Brasil, foi a das vendas para a Argentina, que caíram quase pela metade (48,4%) em janeiro, comparadas com as do mesmo mês no ano passado. O principal motivo foi a redução no comércio automotivo nos dois mercados - as vendas da Argentina ao Brasil também caíram quase na mesma dimensão: 43,6%.
Como na Argentina, a maior razão para a forte queda (34%) nas exportações totais de manufaturados brasileiros foi a retração mundial dos mercados, explicou Barral. Em menor escala, os exportadores brasileiros vêm perdendo espaço para exportadores de bens industrializados asiáticos, em mercados como os da América do Sul, constatou o governo. "A exportação é o que mais nos preocupa [no comércio exterior]", reconheceu Barral.
Produtores de aço, até do Leste Europeu, tomaram mercado dos brasileiros na Colômbia e nos Estados Unidos, informou Barral. Muito estocados, os produtores mundiais estão aumentando os incentivos aos exportadores, e vendendo a "preços de ocasião", queixou-se Barral.
"Os concorrentes dispõem de crédito, desoneração de impostos e incentivos que acabam deslocando a produção brasileira", comentou Barral. "Temos de tomar medidas para igualar as condições", disse. Ele garantiu que é "iminente" a divulgação das novas medidas para os exportadores, discutidas com a Receita Federal. Uma dessas medidas é a aplicação do chamado drawback integrado, que permite aos exportadores do agronegócio descontar os impostos pagos por insumos usados na produção, como fertilizantes e praguicidas.
Em janeiro, o país teve um déficit de US$ 843 milhões no comércio com os Estados Unidos após dez anos de superávit, em parte devido à aquisição de um grande avião Boeing 777 pela TAM, e por compras de carvão. Para o vice-presidente da Associação dos Exportadores Brasileiros (AEB), José Augusto de Castro esse resultado, mesmo inflado pela importação do avião, revela a necessidade de investir mais fortemente nas vendas ao mercado americano.
"Agora, com o câmbio ajustado, temos preço e qualidade", argumenta ele. Calçados e móveis são alguns dos produtos que podem ganhar mercado nos Estados Unidos, apesar da recessão, acredita Castro, que comemora a retomada dos planos de missões comerciais brasileiras ao país, em abril, quando segue para lá uma missão da Agência de Promoção de Exportações (Apex). "Não podemos depender dos emergentes; eles estão perdendo receita em moeda forte, com a queda de preços e redução dos mercados", defende Castro.
Barral argumenta que a manutenção dos preços de commodities em patamares altos (embora menores que os de meados do ano passado), abre possibilidades em países ainda com grande crescimento, como Índia e China.
O bloco asiático foi o único para o qual cresceram as exportações em janeiro - 18% só para a China, que aumentou mais as compras de minério de ferro, açúcar e celulose. Também houve fortes aumentos para outros países devido à abertura de novos mercados, como o de etanol para a Coreia do Sul. Os acordos sanitários com a China fizeram aumentarem as vendas para Hong Kong em 9,5%, com a compra de carnes de frango e bovina.
Para Castro, esses números dão uma impressão errônea das tendências para 2009 porque resultam da comparação dos valores do mês passado com os de janeiro de 2008, quando a maioria destas commodities ainda não havia recebido os reajustes que impulsionaram as exportações no ano.