Título: Poder dos executivos de bancos será limitado
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Fonte: Valor Econômico, 06/02/2009, Opinião, p. A10

Quando o então secretário do Tesouro no governo Bush, Henry Paulson, apresentou sua primeira versão de um plano de salvamento das instituições financeiras de US$ 750 bilhões - um cheque em branco, sem contrapartidas -, ele argumentou que não se deveria restringir bônus e salários dos executivos dos bancos, porque encontraria resistência entre os banqueiros e a adesão ao programa seria pequena. Naquela altura, em um dos piores momentos da pior crise financeira em 80 anos, os grandes bancos americanos estavam insolventes e três dos maiores bancos de investimentos haviam sido varridos do mapa - Bear Stearns, Merrill Lynch e Lehman Brothers. O Congresso americano não teve o mesmo respeito sacrossanto pelos executivos que colocaram o mundo todo em uma crise que já eliminou milhões de empregos e trilhões em riqueza em todo o mundo. Os congressistas fulminaram a proposta de Paulson e exigiram ações dos bancos em troca da capitalização. Ao mesmo tempo iniciou debate para restringir a farra em Wall Street, cujos executivos viveram inigualáveis anos dourados.

Essa época acabou, mas aqueles que chegaram a ser conhecidos como "senhores do universo" continuam agarrados a velhos hábitos, ganhando e gastando milhões de dólares de bancos que hoje só sobrevivem com a ajuda pública. O pacote de restrição de gastos, salários e bônus de executivos de empresas que receberam recursos do contribuinte apresentado pelo presidente Barack Obama é um bom começo, vai na direção correta, embora, com o agravamento da crise e com o estado lamentável dos bancos, terá de ir mais longe. Até agora foi deixada de lado a espinhosa questão: as mesmas pessoas que provocaram a maior devastação financeira em décadas serão capazes de reerguer as instituições que destruíram?

Tudo indica que não. Há sinais de que muitos executivos sequer entenderam que o mundo mudou ao seu redor. A colunista Maureen Dowd, do "The New York Times", colecionou de passagem algumas das proezas patrocinadas por executivos de bancos quebrados que já receberam bilionários socorros do Estado. Sandy Weill, por exemplo, ex-presidente executivo do Citigroup, pegou um jato da companhia, com tapetes de US$ 13 mil e almofadas feitas com lençóis Hermès, para voar com a família até um hotel de luxo em San Jose del Cabo. Os executivos americanos do Citi, aliás, parecem ter predileção especial por jatos luxuosos. Depois de receber garantias para perdas com títulos podres de até US$ 306 bilhões, mais uma injeção de capital de US$ 50 bilhões, o Citi recebeu a recomendação do governo americano de que não seria adequada a compra de um novo jato de US$ 50 milhões para o banco. O Citicorp anunciou dispensas de 53 mil funcionários pelo mundo. Outros bancos esqueceram que austeridade é recomendável em épocas de extrema penúria. Há histórias parecidas envolvendo executivos do Wells Fargo, Bank of America, o holandês Fortis e o Royal Bank of Scotland, hoje com 70% de suas ações nas mãos do governo britânico.

Há ainda muito prejuízo pela frente para os bancos, porque a fatura dos títulos podres não foi liquidada e porque a economia mergulhou em recessão nos países desenvolvidos e retraiu-se fortemente nos países emergentes. Uma nova onda de inadimplência baterá no caixa dos bancos. Há uma complexa discussão em torno do novo plano de Obama para escorar as instituições financeiras, com quantia de dinheiro maior do que os US$ 750 bilhões aprovados. Ela diz respeito à melhor forma de sanear as instituições. Alguns defendem a criação de um "banco ruim" federal para limpar as carteiras dos títulos que viraram pó. Outros, como o megainvestidor George Soros, defende a capitalização de "bancos bons", isolando as perdas, separando capital para cobri-las, e com ajuda financeira de reforço do capital, sem que os títulos tóxicos saiam dos balanços dos bancos. Outros não veem saída a não ser aprofundar a nacionalização, que já ocorre na prática.

Seja qual for a solução, parece inevitável uma maior pressão política para cobrar a conta da irresponsabilidade de executivos endinheirados. O Proer brasileiro, por exemplo, afastou donos e executivos dos bancos quebrados, e era um plano modesto. É uma questão de tempo até que isso ocorra nos EUA e Europa.