Título: Crédito ainda escasso para empresa média
Autor: Travaglini,Fernando
Fonte: Valor Econômico, 09/02/2009, Finanças, p. C1

O mercado de crédito se mantém restrito no início do ano. Empresas de pequeno e médio portes são as que mais sofrem para conseguir recursos dos bancos à medida que as grandes se voltam para o mercado local. Por conta desse cenário de restrição, companhias médias já diminuíram fortemente a demanda por recursos.

Nas últimas semanas, os bancos médios, que atendem esse nicho, vêm liberando apenas uma parcela das solicitações dos empresários, cerca de 20% a 30% do total, e ainda assim, com prazos mais curtos e taxas ainda salgadas.

Para Renato Oliva, presidente da Associação Brasileira de Bancos (ABBC), o mês de janeiro "até que foi bom para o crédito, dada a crise", mas a demanda das empresas não foi plenamente atendida. Essa retração é ruim, segundo ele, pois as empresas tendem a refazer os orçamentos anuais em bases menores, levando a economia a um patamar inferior.

"Cada dia que passa, conhecemos um pouco melhor o impacto da crise nas empresas e ficamos com maior segurança. Mas os bancos ainda não estão totalmente tranquilos. O funding está curto e é preciso ter certeza do recebimento dos empréstimos, pois a inadimplência pode significar menos recursos para fazer um novo empréstimo no futuro."

Além disso, os bancos de médio porte, que atendiam com mais rapidez o mercado de "middle market" (empresas com faturamento de até R$ 300 milhões), ainda não conseguiram restabeleceram completamente o fluxo de captações. O presidente da ABBC, que representa os bancos médios, avalia que o grande problema é que as instituições ainda não conseguem captar recursos via emissão de Certificado de Depósitos Bancários (CDB). "Há um problema de confiança e o restabelecimento do crédito só vai ocorrer quanto bancos começaram a vender CDB novamente."

A liquidez, que já não é mais um problema, é garantida por cessões de crédito e pelo interbancário. O Fundo Garantidor de Crédito (FGC) também tem adiantado recursos para os bancos emprestarem, com a obrigação de posteriormente ceder a carteira produzida ao fundo. Essas soluções, no entanto, não são perenes, na avaliação de Oliva.

Com as incertezas do atual cenário, as instituições financeiras de grande porte têm liberado menos recursos e preferencialmente para operações de menor risco. Além disso, as empresas que captavam no mercado capitais ou no exterior agora demandam crédito bancário, explica Rubens Sardenberg, economista-chefe da Federação Brasileira de Bancos (Febraban).

"Os prêmios das debêntures subiram e as grandes companhias estão buscando empréstimos de curto prazo (ponte). Há uma demanda adicional por recursos que pressiona o sistema bancário", disse. Ainda de acordo com o economista, em um cenário de oferta abundante de liquidez, esse crescimento seria absorvido por uma maior alavancagem do sistema. Na atual condição, no entanto, o avanço se dá por meio de uma concorrência pelos recursos.

Segundo dados do Banco Central, no último trimestre do ano passado, as concessões médias diárias dos empréstimos com taxas flutuantes - primordialmente direcionadas às grandes companhias - avançaram 12,6%, contra 2% da média de liberações para pessoas jurídicas.

Ao mesmo tempo, o saldo das operações com valores acima de R$ 10 milhões teve expansão de 14,2% nos meses de outubro e novembro, auge da crise, contra avanço de apenas 1,7% das linhas abaixo desse patamar.

Boa parte desse mercado era atendida pelas instituições médias. De acordo com um industrial ouvido pelo Valor, os bancos de nicho tinham um peso importante para empresas médias pela agilidade e pela proximidade. "Esses bancos são extremamente ágeis. Os gerentes estudam os seus clientes e montam operações estruturadas, baseadas nos ciclos dos negócios das empresas numa versatilidade que não é encontrada nem nos grandes bancos nem nos bancos oficiais", disse o empresário do setor de alimentos.

A dinâmica caminhava bem, conta o executivo, até meados de setembro. As operações de giro estruturadas por estes bancos consistiam na liberação de tranches para pagamento entre dez e doze parcelas. À medida que ocorriam as liquidações, novas operações eram montadas, sempre dentro dos limites de crédito pré-estabelecidos e garantidas tanto por recebíveis quanto por garantias reais (hipoteca, penhor, aval etc).

Nos últimos anos essa fórmula atendeu a demanda com sucesso. Com o agravamento da crise, no entanto, os bancos ou reduziram os limites, ou exigiram mais garantias, ou simplesmente cortaram as linhas. As poucas operações restantes tiveram seus spreads elevados. Sem crédito, o temor de muitas empresas é que comecem a aumentar os pedidos de recuperação judicial.