Título: Crise exige um Cade mais ágil, diz presidente
Autor: Madureira , Daniele
Fonte: Valor Econômico, 10/02/2009, Empresas, p. B1

Arthur Badin, presidente do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), arrancou risos dos 85 empresários e executivos que o ouviam ontem, em São Paulo, durante almoço promovido pela Câmara de Comércio França-Brasil (CCFB), no qual era o convidado principal. "Agora que eu já terminei de falar, podemos abrir para perguntas, mas vou pegar a minha sobremesa primeiro", disse ele, de olho no doce que levava o sugestivo nome de "Escândalo de Chocolate". Não se sabe se a iguaria foi feita ou não com ingredientes da Garoto ou da Nestlé - que em 2002 anunciaram a compra da primeira pela segunda, em uma operação que ainda está sob análise do ponto de vista concorrencial -, mas o assunto desperta o apetite do novo presidente do Cade, que assumiu o cargo em novembro. Sergio Zacchi / Valor

Badin, presidente do Cade, responde que em se tratando de Nestlé e Garoto ainda é possível "separar a gema da clara"

Para Badin, uma das principais vantagens da nova lei de defesa da concorrência, hoje no Senado, está na análise prévia de atos de concentração. "Assim não teremos casos em que a gema está tão misturada com a clara que fica impossível separar", diz ele, referindo-se ao trâmite atual, que relega ao Cade a missão de analisar a concentração depois do anúncio da fusão ou aquisição. Questionado se a compra da Garoto pela Nestlé é um desses casos indissociáveis, Badin responde que não. "A operação só foi fechada porque havia um acordo de preservação da reversibilidade do negócio, portanto, ainda é possível separar clara e gema", disse, enquanto degustava a sua sobremesa. Mês passado, dois desembargadores de Brasília votaram a favor do reenvio do processo ao Cade para que seja reapreciado. O julgamento, porém, está interrompido porque o juiz pediu vistas.

Em ano de crise, no entanto, o órgão de defesa da concorrência acredita que terá de se debruçar sobre setores que vão muito além das guloseimas. Para Badin, o atual cenário econômico pode incentivar não só novas fusões e aquisições, como também práticas anticompetitivas, a exemplo de operações de cartel (quando empresas se juntam para impor preços ao consumidor ou fixar cotas de produção) e de truste (oligopólio). "Por isso esperamos que o Senado aprove em breve a nova lei (PL 3937/04, de autoria do deputado Ciro Gomes), que já recebeu a aprovação da Câmara dos Deputados", diz Badin.

Na Câmara, lembra o presidente do Cade, o projeto de lei ficou em plenário durante um ano. "Tomei posse em novembro passado e em dezembro a Câmara aprovou o PL", recorda. "Vou procurar sensibilizar os senadores para a urgência da aprovação nesse momento, que requer nova postura do governo em torno da defesa da concorrência".

Badin acredita que, com a nova legislação, seja possível concluir 92% dos casos analisados pelo Cade em até 20 dias. Os mais complexos poderiam ser resolvidos em até 180 dias. Ele explica que a grande maioria dos casos analisados pelo Cade é simples, mas a resolução demora devido ao trâmite burocrático que envolve os três órgãos do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência - Secretaria de Direito Econômico (SDE), Secretaria de Acompanhamento Econômico (SEAE) e o próprio Cade. Na nova estrutura, toda análise passa a ser feita pela superintendência geral do Cade.

Embora precise da nova legislação para acompanhar com mais agilidade a economia, Badin avalia que a defesa da concorrência no Brasil vem se mostrando cada vez mais eficiente. "Em 2006, o Cade recolheu R$ 12 milhões em multas das empresas infratoras. Em 2007 esse valor subiu para R$ 32 milhões e, no ano passado, foi a R$ 78 milhões", diz ele, que se esquiva, no entanto, de comentar uma das decisões mais controversas de toda a história do Cade: a aprovação, em 2000, da fusão que deu origem à AmBev, dona de marcas que somam cerca de 70% do mercado nacional de cervejas. "Não me sinto à vontade para falar de uma decisão da qual não tomei parte", diz.