Título: Inflação do DF é a pior
Autor: Nunes, Vicente
Fonte: Correio Braziliense, 14/01/2010, Economia, p. 10

Enquanto IPCA nacional encerra 2009 em 4,31%, dentro da meta, em Brasília o índice dispara e fecha em 4,92%. A guinada foi consequência do aumento de 51% no preço de passagens aéreas, de 20,5% na tarifa de ônibus e de 9% em condomínios

Os brasilienses que andam reclamando do elevado custo de vida na capital do país estão cobertos de razão. É o que diz o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Ao consolidar os dados da inflação de 2009, o órgão vinculado ao Ministério do Planejamento constatou que Brasília registrou o maior reajuste de preços do Brasil. Enquanto o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) nacional teve aumento de 4,31%, no Distrito Federal, o salto foi de 4,92%. ¿Realmente, nos impressionou o resultado da inflação em Brasília¿, disse a gerente de Pesquisas de Preços do IBGE, Irene Machado.

Segundo ela, a disparada da inflação na capital federal foi comandada pelas passagens aéreas, com reajuste de 51,39%, e pelas passagens dos ônibus urbanos, com aumento de 20,52%, e dos ônibus interestaduais, com 7,09%. Também pesou no bolso dos brasilienses a elevação de 8,08% dos aluguéis e de 9,07% dos condomínios. ¿Como esses itens pesam mais no orçamento das famílias de Brasília, nem mesmo o fato de os preços dos alimentos terem sido reajustados em 2,28%, abaixo da média nacional, de 3,18%, foi suficiente para evitar que a capital liderasse o ranking inflacionário do país¿, afirmou Irene.

Pelas suas contas, com os preços das passagens aéreas e de ônibus em disparada, o grupo transportes computou alta de 4,38% em Brasília, quase o dobro da média nacional, de 2,36%. O pior é que, no caso das passagens de aviões, não há perspectiva de recuo. Muito pelo contrário, a tendência é de novos reajustes, pois a demanda por viagens é crescente, sobretudo por causa do maior poder aquisitivo da população. O DF, como bem lembrou a técnica do IBGE, tem a maior renda per capita do país e é o terceiro maior polo recebedor de voos, atrás de São Paulo e do Rio de Janeiro.

Crise ajuda

Apesar da surpresa negativa provocada pelos fortes reajustes de preços em Brasília, a inflação média do Brasil, de 4,31%, mostrou-se sob controle, encerrando 2009 abaixo do centro da meta, de 4,5%. Em 2008, o IPCA havia subido 5,90%. Parte do recuo da inflação, no entender de Irene Machado, foi fruto da crise mundial, que reduziu o consumo de commodities agrícolas (grãos), mercadorias com cotação internacional exportadas pelo Brasil. ¿Houve mais sobras de produtos no país. Um exemplo são as carnes, cujos preços encolheram, em média, 5,33%¿, assinalou.

Além disso, houve o impacto nos preços de bens duráveis da redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), para evitar uma recessão mais profunda da economia. Os automóveis novos ficaram 3,62% mais baratos e os preços dos usados recuaram 11,90%. No caso dos eletrodomésticos, a queda chegou a 4,85%. ¿Não podemos esquecer ainda o efeito da baixa do dólar, que diminuiu em 13,78% o preço da farinha de trigo e em 1,11% o valor do pão francês¿, destacou Irene. Em compensação, houve um forte aumento, de 9,05%, no preço da alimentação fora de casa. Sozinho, o item alimentação fora de casa deu a maior contribuição para o IPCA no ano: 0,37 ponto percentual.

Para a economista Tatiana Pinheiro, do Banco Santander, ainda que a crise tenha ajudado no encolhimento do IPCA, por meio do corte do IPI, que provocou deflação de 2% nos bens duráveis, foi o grupo alimentação, que saiu de uma alta de 11,11%, em 2008, para 3,18% no ano passado, o ponto mais importante para a inflação ter ficado abaixo do centro da meta. Ela ressaltou que, em 2010, mesmo com pressões inflacionárias visíveis, muito provavelmente, o IPCA ficará próximo de 4,5%. ¿Veremos pressão, principalmente, nos preços dos serviços, que subiram 6,4% em 2009. Por isso, o BC deverá começar a subir os juros a partir do segundo semestre, dos atuais 8,75% para 10,75% ao ano¿, assinalou.

O número Moradia cara 8,08% Acréscimo nos valores dos aluguéis da capital federal no ano passado

Juro real de 3,5% possível

Ainda que o Banco Central seja obrigado a aumentar a taxa básica da economia (Selic) ao longo deste ano, o Brasil caminha firme para conviver com juros reais (descontada a inflação) de 3,5%. Estudo realizado pela economista Giovanna Franco Siniscalchi, do Banco Itaú Unibanco, mostra que, juntos, fatores como a credibilidade da política monetária, a inflação dentro das metas, a queda do risco-país, a boa situação das contas externas e o equilíbrio das contas públicas vão levar o Brasil a ficar mais parecido com o mundo desenvolvido na década que se inicia. ¿Veremos, neste ano, os juros reais voltando para 6%, na média. Mas logo a taxa voltará a cair¿, afirmou.

Na avaliação de Giovanna, muito se tem discutido qual é a taxa real de juros de equilíbrio do país, ou seja, a taxa que permite um crescimento sustentado a médio e longo prazos sem pressões inflacionárias ou bolhas especulativas. Há pouco mais de 10 anos, a taxa real estava próxima de 40%. No fim do ano passado, baixou a 5,4% ¿No curto prazo, esses juros reais não são sustentáveis, devido à forte retomada da economia depois do corte de cinco pontos da Selic por causa da crise internacional¿, assinalou. ¿Mas, ao longo dos próximos 10 anos, teremos Selic de 7% e inflação e juros reais de 3,5%¿, emendou.

O que torna esse cenário mais factível, no entender da economista do Itaú Unibanco, é o fato de a inflação estar dentro das metas definidas pelo governo por cinco anos consecutivos. ¿É a confiança do mercado de que o BC fará tudo para controlar a inflação que mantém as expectativas nas metas¿, destacou.

Para o presidente do BC, Henrique Meirelles, a inflação de 4,31% em 2009, abaixo do centro da meta de 4,5%, é para comemorar. ¿A inflação sob controle nos últimos seis anos representou previsibilidade para a economia, com consequente aumento dos investimentos, o que permitiu crescimento médio do PIB (Produto Interno Bruto) de cerca de 5% ao ano, mais do que o dobro do passado recente¿. Ele ressaltou ainda que o crescimento maior, com a inflação sob controle, criou condições para o aumento da renda dos trabalhadores e uma elevação ¿vigorosa¿ do nível de emprego. (VN)