Título: Pólo tecnológico coloca a Paraíba no mapa da inovação
Autor: Barros , Bettina
Fonte: Valor Econômico, 19/12/2008, Empresas, p. B3

Não é mais apenas o disputado forró de São João que atrai um sem número de "estrangeiros" a Campina Grande, a segunda maior cidade da Paraíba que divisa o agreste do sertão. Ao menos 250 novas mentes aportam todos os anos aqui para preencher as cobiçadas vagas de Ciência da Computação e Engenharia Elétrica da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG). Nos próximos cinco anos, um contingente de quase mil cérebros inundará o mercado local de tecnologia da informação (TI). É um batalhão de primeira atrás do sonho de qualquer iniciante: emprego garantido e bom salário.

Campina Grande é um dos 74 pólos tecnológicos do país, mapeados pela Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos Inovadores (Anproteca). Concilia todos os predicados necessários: uma centena de empresas de TI, mil empregos gerados e o maior número proporcional de PhDs do Brasil - 600. Nos últimos anos, o setor alavancou para 43 países as exportações de software e hardware, que vão de bancos de dados de alta complexidade às mais simples recicladoras de cartuchos. Entre seus clientes estão nomes como HP, Nokia, Petrobras e Interpol, a polícia internacional para o crime organizado.

Não é à toa, portanto, que esta cidade quente do semi-árido nordestino atraia tantos forasteiros - paulistas, gaúchos, catarinenses e nordestinos dos Estados vizinhos, numa curiosa colcha de sotaques diferentes que em comum terão a mesma trajetória profissional.

"Temos metade do tamanho de Pernambuco e estamos na pior parte do Nordeste: daqui só sai pedra e cacto. A Paraíba só poderia andar com a universidade e a tecnologia", resume Alexandre Moura, ex-aluno da UFCG e diretor de uma de suas crias, a Light Infocon.

O boom tecnológico só foi possível graças ao tripé universidade, empresa e a entidade que faz a ponte entre as duas. Esse entendimento estratégico, essencial a todos os grandes pólos mundiais de TI, ocorreu em Campina Grande há 40 anos. Muito se deve a uma figura lendária na cidade, Lynaldo Cavalcante de Albuquerque, então reitor do campus campinense da Universidade Federal da Paraíba e depois presidente do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

"A grande contribuição dele foi atrair cabeças, fazer parcerias com pessoas de universidades do exterior", afirma José Clóvis Vidal, um simpático pernambucano de Guaranhuns que hoje dirige a Apel, outra gigante paraibana de TI.

Foram 13 anos de um período de ouro. Entre 1973 e 1986, a universidade campinense cresceu com intercâmbios de mestrandos e doutorandos indianos, russos, alemães e franceses. E mandou os seus alunos para fora - um luxo para muitos estudantes brasileiros nos anos de chumbo da ditadura.

Os pesquisadores da UFCG estão entre os poucos do Brasil a se debruçar sobre a computação quântica e tornaram-se referência na chamada "computação em nuvem", uma das áreas mais quentes e promissoras da tecnologia.

A universidade, como se vê, foi a espinha dorsal para a transformação de uma economia baseada fortemente em serviços e na indústria para a de tecnologia de ponta. O pólo já responde por 20% da economia do município e projeta um salário médio da população para R$ 2,9 mil, o dobro da região.

Mas foi nessa época também que surgiu a Fundação Parque Tecnológico da Paraíba (PaqTcPB), o elo entre a sala de aula e a empresa. Com um conselho robusto de empresários, políticos e acadêmicos, a entidade atingiu uma ampla capilaridade, o que lhe permite funcionar como um "capitão que faz todos remarem para o mesmo lado", nas palavras de Moura, da Light. Cerca de 70 empresas já foram beneficiadas por suas incubadoras, aumentando a taxa de sobrevivência das empresas novatas.

"Houve uma alavancagem muito grande com a criação do parque", afirma Francilene Procópio Garcia, diretora de entidade, ainda que ela trabalhe com o orçamento enxuto, de apenas R$ 3 milhões em 2008. Francilene garante: "Raras são as empresas de tecnologia que fecham as portas no Estado".

A alta concentração de cérebros também foi impulsionada por um pacote de incentivos fiscais. Pesou a recente medida do governo federal que reduziu à metade os impostos sobre exportações de TI. Antes disso, a prefeitura já tinha se encarregado de baixar uma lei reduzindo o ISS para softwares, de 5% para 2,5%. E o Estado, por fim, concedeu um desconto no ICMS para o setor - 100% para microempresas e 50% para as demais.

Nas últimas quatro décadas, Campina Grande ganhou 12 universidades, tendo a UFCG 70% das matrículas nos cursos de Ciência da Computação e Engenharia Elétrica. Na maturidade da quinta geração, o pólo faturou R$ 150 milhões em 2006, o equivalente a 5,5% do PIB local no mesmo ano.

A vocação para o desenvolvimento tecnológico deve estar no DNA campinense. A cidade do forró e da carne de sol foi precursora nos cursos de Ciência da Computação e Engenharia Eletrônica, e a primeira também a ter computador em sala de aula na região. Hoje, praticamente tudo o que o pólo de TI produz vai para o exterior com a chancela "Made in Brazil".