Título: Preços mais salgados
Autor: Martins, Victor
Fonte: Correio Braziliense, 15/01/2010, Economia, p. 10

Enquanto a receita do varejo no país cresceu 1,1% em novembro, em relação a outubro, no Distrito Federal o avanço apurado pelo IBGE foi bem maior, de 5,1%. Contudo, o volume de vendas ficou estável. A constatação é de que o brasiliense elevou os gastos, mas não o consumo

Certeza do exagero: ¿Quando saio de Brasília, sinto-me menos roubada¿, diz a professora Cristiane Oliveira

O alto custo de vida na capital federal estagnou o volume de vendas em 2009, mas não a elevação dos preços e o crescimento das receitas dos comerciantes. Enquanto o volume de produtos vendidos até novembro ficou praticamente na mesma quantidade do ano anterior, a receita do comércio aumentou acima da inflação, em 5,1%. No cenário nacional, os dados da Pesquisa Mensal de Comércio (PMC), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), surpreenderam o setor, que esperava um avanço abaixo do percentual de 1,1%, apurado pelo levantamento, no volume de vendas entre outubro e novembro.

A pesquisa do IBGE reforçou os números do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), segundo os quais o Distrito Federal figurou com o título de pior inflação do Brasil em 2009 ¿ alta de 4,92% contra os 4,31% nacionais. Nas estatísticas do comércio em novembro, a pressão no custo de vida candango se destacou mais uma vez. Os lojistas da capital tiveram uma alta de apenas 0,14% na quantidade de produtos vendidos, resultado que não incomodou o setor frente o crescimento das receitas. ¿É como se o pessoal do DF tivesse vendido a mesma quantidade de produtos que em 2008, mas, como os preços subiram, o brasiliense acabou pagando 5,1% a mais pelas compras¿, explicou o coordenador da PMC, Nilo Gonçalves.

Diferença Para a professora de artes Cristiane Oliveira, 35 anos, é explícita a diferença de preços entre a capital federal e o resto do país. ¿Com certeza, aqui é exagerado. Acham que todo mundo tem salários altíssimos e sobem os preços¿, afirmou. ¿Quando saio de Brasília para outra cidade, vejo coisas mais em conta e pago por produtos que não teria coragem de comprar aqui. Em outros lugares, me sinto menos roubada¿, desabafa. A caixa Ana Paula Costa, 22 anos, sustenta que o segredo para fugir da inflação no comércio é pesquisar e, em alguns casos, evitar os grandes centros de compras. ¿A cidade não é tão cara assim. Aqui tem de tudo. Se você procurar bem, encontra muita coisa em conta. Fora do Plano Piloto, é possível achar bons preços em Taguatinga, Ceilândia e outros lugares¿, aconselha.

Além de Brasília, mais unidades da Federação registraram resultados semelhantes. Casos de Espírito Santo, Tocantins e Paraíba, que chegaram a vender menos que em 2008, mas ainda assim, tiveram suas receitas em alta. ¿Nessas cidades, houve um aumento do tíquete médio. No DF, os níveis de renda são diferentes do Brasil, bem maiores. Nos outros casos, o alto desempenho da economia e a realização de fortes investimentos fizeram o gasto médio do consumidor aumentar¿, justificou o presidente da Câmara Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL), Roque Pellizzaro.

Surpresa Passado o pior momento da crise financeira, entre o fim de 2008 e os três primeiros meses de 2009, o comércio reagiu e, em novembro, registrou a sétima alta mensal consecutiva em volume de vendas. O crescimento foi de 1,1% entre outubro e novembro. Nas receitas nominais, a trajetória foi um pouco mais longa: oito altas seguidas, a última, uma variação de 1,3% na mesma base de comparação. ¿Esse números surpreenderam um pouco e para melhor¿, afirmou o economista da Confederação Nacional do Comércio Fábio Bentes. ¿O dado de crédito em novembro não foi bom para justificar esse incremento, mas uma variável importante foi o preço¿, explicou.

Reajuste na gasolina

Luciano Pires

A redução do volume de álcool na gasolina terá impactos imediatos no bolso do motorista que optar por abastecer o carro com o derivado do petróleo. A Fundação Getulio Vargas (FGV) fez as contas e prevê que, em fevereiro, quando a medida autorizada pelo governo entrar em vigor, os consumidores que encherem o tanque com gasolina vão pagar 2% a mais pelo litro do combustível. Com menos etanol em sua composição, o valor da gasolina vendida nos postos do país tende a subir porque, quanto mais ¿pura¿, mais cara ela fica.

Na avaliação dos técnicos da entidade, no entanto, o efeito deve ser de curto prazo. A alta de preços será sentida apenas nas primeiras semanas do próximo mês para, em seguida, perder força, devido à sobra de etanol nas revendas e à entrada de mais produto no mercado por causa do início da safra da cana-de-açúcar. O economista André Braz, da FGV, reforça ainda que o reajuste da gasolina tende a influenciar a inflação. ¿Vai ter um impacto de curto prazo que vai se diluindo com o passar dos meses¿, completa. Segundo ele, a mudança no setor de combustíveis refletirá em um salto de 0,06 ponto percentual no Índice de Preços ao Consumidor (IPC) de fevereiro.

Temendo uma escalada maior dos preços do etanol ¿ e até mesmo o desabastecimento ¿, o governo autorizou nesta semana a diminuição de 25% para 20% da quantidade de álcool anidro por litro de gasolina a partir de 1º de fevereiro. A solução emergencial terá duração de 90 dias e, por mês, o mercado brasileiro poderá contar com pelo menos 100 milhões de litros de etanol a mais, conforme estimativas do setor. Usineiros e donos de postos elogiaram a decisão, mas reagiram com cautela quanto aos possíveis benefícios para os motoristas.

Entressafra O preço do álcool combustível disparou nos últimos três meses. O início da entressafra em novembro, o excesso de chuvas e a preferência das destilarias por produzir açúcar em vez de etanol desestabilizaram toda a cadeia. Essa não é a primeira vez que o governo intervém. Em 2006 e em 2007, quando o Brasil viveu crises semelhantes, os órgãos reguladores tiveram de atuar. O setor sucroalcooleiro reclama que faltam mecanismos de comercialização de longo prazo e exige também tratamento tributário mais adequado. A formação de estoques públicos chegou a ser cogitada no ano passado, na tentativa de proteger o mercado de oscilações bruscas. Essas e outras políticas estruturantes, no entanto, nunca saíram do papel.

O número 2% Aumento projetado para o preço do litro do combustível a partir de fevereiro, segundo as contas da Fundação Getulio Vargas