Título: Fundos Finor e Finam têm rombo de R$ 12,2 bilhões
Autor: Mandl , Carolina
Fonte: Valor Econômico, 19/02/2009, Especial, p. A14

Oito anos se passaram desde que, em meio a escândalos de desvio de recursos, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso acabou com a concessão de incentivos fiscais dos Fundos de Investimentos Regionais do Nordeste (Finor) e da Amazônia (Finam). Só agora, porém, o governo federal está descobrindo o tamanho do buraco deixado pela antiga política de desenvolvimento regional. São R$ 12,2 bilhões que as empresas incentivadas não pagaram, valor que supera a soma dos custos da transposição do São Francisco e da Transnordestina, obras consideradas pelo governo como as mais importantes para o Nordeste. Os números estão no balanço divulgado pelos fundos em 2008, correspondente ao exercício de 2007.

O Ministério da Integração envia desde o fim de 2007 fiscais para cada um dos empreendimentos incentivados para descobrir o que foi feito do dinheiro. Casos de fraudes, de insucesso e de descumprimento das normas estão sendo direcionados à Procuradoria Geral da Fazenda Nacional para dar início à cobrança judicial. "Primeiro, tentamos receber amigavelmente, mas sem sucesso. Agora vamos à Justiça", afirma Vitorino Domenech, diretor do Departamento de Gestão dos Fundos de Investimento do Ministério da Integração.

Ao mesmo tempo, o valor dos títulos devidos está sendo provisionado nos fundos. Com a faxina, de 2006 para 2007 o montante devido pelas companhias incentivadas ao Finor, por exemplo, passou de R$ 4,8 bilhões para R$ 8,7 bilhões.

Segundo Domenech, a limpeza na carteira dos fundos tem dois objetivos. Um deles é tentar recuperar judicialmente os valores devidos pelas empresas. O outro é reduzir as taxas de administração dos fundos pagas ao Banco do Nordeste e Banco da Amazônia. As instituições são remuneradas com uma porcentagem do patrimônio líquido dos fundos. Ou seja, se os fundos estão inchados, além de não receber das empresas, o governo ainda paga mais do que deveria pela sua gestão. De 2007 para 2008, o patrimônio líquido do Finam caiu 81% por causa das provisões, alcançando R$ 242 milhões.

Em outra esfera, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) também vem suspendendo as companhias incentivadas, que devem enviar anualmente demonstrações financeiras à autarquia. Sem isso, quem quer comprar ações das empresas - uma forma de o dinheiro dos incentivos voltar aos fundos - fica sem parâmetros de avaliação. Cerca de 2 mil empresas já foram suspensas pela CVM.

Desde 2001, tanto o Finor quanto o Finam estão fechados para investimentos em novos projetos. Depois de uma série de denúncias de fraudes, que culminou inclusive na criação da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Finor, uma medida provisória proibiu novos aportes dos fundos. Investigações também ocorreram em torno do Finam. Entre os envolvidos no escândalo estava o ex-deputado federal Jader Barbalho (PMDB-PA), cuja esposa supostamente possuía um ranário que, apesar de não chegar a sair do papel, recebeu recursos do Finam. Jader, que chegou a ter os bens bloqueados no ano passado pelas suspeitas, ainda enfrenta um processo correndo na Justiça sobre o caso.

A partir de um levantamento por amostra, a CPI levantou 653 casos de irregularidades nas empresas incentivadas. Porém, o relatório final concluiu que apenas 53 companhias deveriam devolver os recursos tomados. "Naquela época, por falta de dados não pudemos fazer uma avaliação mais ampla do Finor. Por isso, o resultado da CPI foi modesto", afirma José Thomaz Nonô (DEM-AL), que presidiu a CPI do Finor. "O que se sabe é que dinheiro de graça é um dinheiro perigoso. Ou há uma fiscalização muito intensa, ou se perde o recurso. E não se fiscalizava."

Encerrada a CPI em 2001, o saneamento dos fundos só foi retomado com maior intensidade em 2007, chegando ao valor de R$ 12 bilhões devidos pelas companhias incentivadas.

Mesmo assim, na avaliação do Ministério da Integração, a política foi exitosa. "A gente se defronta com casos escabrosos de fraude, mas, de 1975 a 2003, os fundos desembolsaram R$ 37 bilhões, e os empreendedores deram uma contrapartida de outros R$ 57 bilhões. Isso foi muito importante para o desenvolvimento do Norte e do Nordeste", afirma Domenech, que chegou ao ministério em 2007 para fazer a checagem das empresas. Até o fechamento desta edição, o Ministério da Integração não havia fornecido o número de projetos que fracassaram no Finor e na Finam.

O gestor cita como exemplo de projetos incentivados que, para o governo federal, promoveram o desenvolvimento da região, o polo têxtil do Ceará, cujo maior ícone é a Vicunha, o parque hoteleiro do litoral nordestino e o polo fruticultor do Vale do São Francisco. Empresas como Vale, Gerdau, Votorantim, Unilever, Alcoa, AmBev e Azaleia também foram atraídas à região pelos incentivos.

"O que ficou para o Nordeste foi maior do que as dívidas. As perdas foram menores do que os ganhos", avalia Tania Bacelar, ex-diretora da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene). Para Herodoto Moreira, ex-economista da Sudene, o papel dos fundos foi mudar a economia da região, trazendo indústrias principalmente de transformação. "Depois que algumas incentivadas vieram, outras correram atrás e já não precisaram mais de incentivos."