Título: Mais empresas na carteira
Autor: Ragazzi , Ana Paula
Fonte: Valor Econômico, 19/02/2009, EU & Investimentos, p. D1

Meses após o acirramento da crise financeira global, quem possuía recursos para investir fez suas escolhas e alguns gestores de fundos de investimentos passaram a pinçar novas ações ou aumentar a participação em empresas em que já tinham parcela dos papéis, construindo assim carteiras cada vez mais recheadas de companhias listadas na bolsa. O movimento é visível pelo crescente volume de comunicados de aquisições relevantes feitos ao mercado. Desde o ano passado, gestores como HSBC, Tarpon e Credit Suisse Hedging Griffo (CSHG), para citar alguns, estão entre os que mais aparecem nesses comunicados. Também Polo Capital, Leblon Equities, Fama e Dynamo estão entre os que lideram o movimento de compras.

Quando atingem fatias superiores a 5% em empresas abertas, os gestores precisam divulgar ao mercado. Desde janeiro de 2008, é possível identificar mais de 550 operações de alterações relevantes de participação acionária e que foram encaminhadas á Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Do total, 85 foram para redução de fatias e todas as outras, de fundos elevando posições. A lista reúne, como principais alvos, empresas de pequeno porte, algumas com liquidez mínima e muitas das novatas. Isso ocorre porque essas empresas têm quantidade menor de ações em circulação do que os carros-chefe da bolsa. Logo, é muito mais fácil alcançar fatia superior a 5% no capital dessas companhias do que no das grandes.

Em alguns casos, as escolhas estão atreladas a empresas com desempenho diretamente ligado à economia doméstica. Mas em outros o preço ficou tão baixo - às vezes menor que o valor patrimonial - que a compra se tornou irresistível para investidores com perfil de longo prazo.

Pedro Bastos, principal executivo da HSBC Global Asset Management, diz que as empresas de pequeno e médio porte, conhecidas como "small" e "middle caps", são as que possuem ainda histórias de crescimento e, no longo prazo, quando o cenário de crise se desanuviar, serão elas que apresentarão maior potencial de alta.

O HSBC aparece com certa constância na lista de instituições que adquirem participações relevantes em companhias listadas na bolsa, e, segundo Bastos, essa é uma estratégia adotada já há três anos, diante do crescimento dos fundos da casa no exterior e que possuem administração voltada para companhias com histórias de perspectiva de crescimento. "O HSBC é um banco de abrangência global, com distribuição de seus fundos em mais de 80 países. Isso nos proporciona uma imensa pulverização de cotistas e esse elevado número de investidores nos garante a possibilidade de fazer apostas, por vezes, em papéis de menor liquidez", diz.

Segundo ele, quando são oferecidas opções de investimento em empresas brasileiras, existem dois ângulos principais: companhias ligadas às commodities ou aquelas cuja atividade está ligada à pujança do mercado interno.

Bastos não comenta as aquisições por papel, mas diz que a orientação é por empresas ligadas ao cenário interno, de diversos ramos, como livraria, construção, além de varejo e diagnósticos. Pelos comunicados feitos pelas companhias, é possível ver que o HSBC atingiu 16,36% das ações preferenciais (PN, sem direito a voto) da Marcopolo e 23,55% de ações dessa mesma classe do Banco Indusval no início de fevereiro. Outros informe deste ano dão conta de que foram alcançados 15,38% das ações ordinárias (ON, com voto) da São Carlos; 13,05% das ONs da Metalfrio e 9,37% das ONs da Dasa.

O HSBC, diz Bastos, se desfaz das posições apenas quando há resgates nos fundos, situação comum em crises, quando o papel atinge o potencial de valorização estimado ou se há alguma decepção com os administradores da companhia. "Basicamente se eles tiverem proposto um caminho, mas em algum momento optado por outro."

A instituição mantém acompanhamento constante do dia-a-dia das companhias que escolheu para investir, mas não participa ativamente da administração, com um assento no conselho, por exemplo.

"Para todas as companhias que estão no nosso portfólio, o acompanhamento é ativo, com visitas e revisões de projeções frequentes. Mas o nosso negócio é a gestão de recursos, sempre visando o melhor para o cotista, não atuar em conjunto na administração de empresas", diz Bastos. "Nosso mandato não é o de um "private equity"", diz.

A escolha dos papéis passa por um processo de seleção comandado por um comitê interno que será responsável também pelo acompanhamento do investimento.

Outra instituição que aparece muito nas comunicações de compras relevantes é a CSGH. Porém, é preciso analisar os dados com cuidado, uma vez que, além de gestora de fundos próprios, a empresa administra carteiras e fundos de terceiros, em cuja gestão não tem influência. Ou seja, as participações comunicadas podem estar diluídas por diferentes fundos. No Brasil existe a figura do gestor, que escolhe os papéis e as estratégias das carteiras e o administrador, que é o representante legal.

Segundo os comunicados feitos ao mercado e as carteiras dos fundos de gestão própria, que ficam públicas por meio do site da CVM, os fundos da CSHG possuem parcela relevante da Cyrela Comercial Properties, na qual já atingiram mais de 10% das ações ON, da Contax (11,2% das PNs), Tecnisa (10%) e Cremer (7%), para citar algumas das posições visíveis nos fundos.

Importante observar que, apesar de possuir um naco mais gordo dessas companhias, isso não significa que essas sejam também as de maior peso dentro dos fundos. Isso porque algumas dessas empresas tiveram uma redução de valor de mercado tão forte que às vezes um investimento que é de porte menor dentro de um fundo pode significar um percentual alto da companhia. Em outros casos, porém, de fato a gestão aproveitou as oportunidades para comprar mais papéis a preços convidativos. Entre os comunicados recentes feitos pela CSHG está a participação em OHL, que chegou a 12,18% no total, mas dos quais apenas 5,8% estão nos fundos com gestão própria.

Com ativos de quase R$ 2,5 bilhões sob gestão, a Tarpon também intensificou as compras no momento de queda nos preços, mas sempre obedecendo a filosofia de destinar muito tempo para a apreciação e acompanhamento dos investimentos em poucas companhias. Por isso, não é de hoje que a gestora monta participações relevantes em algumas empresas. Os preços baixos, porém, facilitaram a estratégia, diz Eduardo Mufarej, sócio da Tarpon.

Por seu foco muito específico no mercado de ações com horizonte de longo prazo, mesmo antes da crise se agravar em setembro de 2008, a Tarpon já vinha aumentando as compras. Isso porque nos EUA e em outros mercados, a crise já começava a dar sinais mais claros desde 2007, o que reduziu os preços de alguns papéis no Brasil nos quais os estrangeiros investiam mais. Ontem, por exemplo, a Hering comunicou que a Tarpon atingiu 13,95% do total das ações ordinárias da companhia. Do Pão de Açúcar, uma das principais posições do fundo, a Tarpon tem cerca de 10% das ações preferenciais.

A Tarpon costuma acompanhar de perto as empresas, com cadeira no conselho de algumas delas. Da carteira atual, em posições como Gerdau, Porto Seguro, Comgás e Celesc a gestora não tem uma participação tão ativa. Mas em outras companhias, de menor porte, costuma seguir de perto as decisões. A carteira também reúne novatas, como Lojas Marisa e Cremer, além do Daycoval, da qual possui mais de 20% das ações preferenciais.