Título: Temer agiliza solução de impasses na Câmara e Sarney enfrenta conflitos
Autor: Costa , Raymundo
Fonte: Valor Econômico, 25/02/2009, Política, p. A5
Em pouco mais de 15 dias no comando do Congresso, o PMDB tem sido ágil na Câmara e lento no Senado. A explicação é mais política que pessoal. O deputado Michel Temer tem encontrado mais facilidade para resolver problemas intrincados, como convencer o deputado Edmar Moreira (DEM-MG) a renunciar ao cargo de corregedor, por ter sido eleito e governar, até agora, com o PT. Mas se Temer tem ampla maioria na Câmara, o mesmo não se pode dizer de José Sarney no Senado, que se elegeu contra um candidato do PT. Sob a nova direção e sem acordo, o Senado nem sequer conseguiu eleger os novos presidentes das comissões temáticas. Na prática, não começou a funcionar em 2009. Sergio Lima/Folha Imagem - 2/2/2009
Temer e Sarney: enquanto na Câmara as comissões já estão definidas, a MP das Filantrópicas equacionada e corregedoria pacificada, no Senado a disputa continua
A paralisia deve-se, em grande parte, às sequelas deixadas pela disputa entre os senadores José Sarney e Tião Viana pela presidência do Senado. Sarney não está conseguindo entregar todos os cargos prometidos por seus aliados durante a campanha, na caça por votos. Até porque entraram na barganha postos que não pertencem ao PMDB e, tradicionalmente, são ocupados com base no critério da proporcionalidade partidária.
As brigas concentram-se na base governista, para deleite da oposição e preocupação do Palácio do Planalto. Numa Casa onde há equilíbrio entre as forças governista e oposicionista, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não pode se dar ao luxo de perder apoios e, por isso, não quer melindrar aliados. O imbroglio que está impedindo a instalação das comissões permanentes envolve o PT (12 senadores) e o PTB, que tem sete senadores, dos quais um - Mozarildo Cavalcanti (RR) - já costuma votar contra o Planalto.
O problema começou quando o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) - agora novamente líder de sua bancada -, prometeu ao ex-presidente Fernando Collor de Mello (PTB-AL) a presidência da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CRE) em troca do apoio petebista a Sarney. Acontece que a tradição do Senado é a distribuição das presidências entre os partidos com base no critério do tamanho das bancadas. E por esse critério, do qual os líderes partidários não querem abrir mão, o PTB não teria a menor chance de ganhar a CRE. Uma das mais importantes da Casa, a comissão já foi escolhida pelo PSDB e o nome indicado para presidi-la é o de Eduardo Azeredo (MG).
Collor ameaçou disputar com Azeredo no voto, já que o presidente precisa ser eleito pelo plenário da comissão. Mas o ex-presidente viu que perderia para o tucano, que teria os votos do PSDB, do DEM e do PT. Por que o PT votaria no PSDB? Em retribuição ao apoio dos tucanos ao petista Tião Viana, que perdeu a eleição para Sarney, e para garantir o respeito à proporcionalidade. Fato, aliás, que melhorou muito o relacionamento entre os líderes dos dois partidos.
Diante da derrota iminente, Collor mudou de alvo. Passou a mirar na Comissão de Infraestrutura, cuja presidência já foi escolhida pelo PT. A indicada para o cargo é Ideli Salvatti (SC), ex-líder da bancada e soldada mais aguerrida do Planalto no Senado. Foi, inclusive, uma das principais defensoras de Renan Calheiros, durante os processos por quebra de decoro parlamentar que o pemedebista enfrentou em 2007. Enfrentar Ideli na CI foi a forma que o PTB escolheu para dar o troco ao PT, cujo líder, Aloizio Mercadante (SP), deixou clara a opção por Azeredo na CRE, caso houvesse disputa entre ele e o ex-presidente.
Para tentar evitar a disputa, já foi oferecida a Collor presidência de uma comissão que analisa as mudanças climáticas, tema ao qual o ex-presidente dedicou-se no início do mandato. Mas ele recusou. A Ideli foi oferecida a Comissão de Educação, mas o cargo - também da cota do PT - já tem dono: Flávio Arns (PT-PR). Tudo indica que haverá mesmo votação entre Collor e Ideli na CI, com chance para o petebista, já que o DEM - saboreando a briga na base - já anunciou apoio ao ex-presidente.
"Para o governo, tanto faz quem ganhe. Collor é um grande aliado e a Ideli é uma guerreira, do núcleo do governo. O problema é ter que administrar o desgaste. Essa disputa na base ninguém ganha", diz Jucá. "Se tiver disputa e a Ideli perder, racha a base, o clima fica muito ruim e o Senado vai paralisar", afirma o líder do PSB, Renato Casagrande (ES).
Jucá minimiza com desdém a agilidade da Câmara. "Aqui não tem palácio", diz, numa referência ao castelo do deputado Edmar Moreira. Nega, no entanto, que a não instalação das comissões esteja prejudicando o andamento dos trabalhos no Senado. Segundo ele, não há nada "emergencial" para ser examinado pelas comissões. Quanto ao plenário, há um projeto de conversão de uma medida provisória trancando a pauta, da qual ele próprio é relator, que está sendo objeto de negociações. E deve ser votado no dia 4, se o clima não estiver totalmente azedado pela partilha das comissões.
Pelo critério da proporcionalidade, o PMDB, que tem o maior número de senadores (20), é o primeiro a escolher qual das 11 comissões quer presidir. O DEM (14) faz a segunda escolha, seguido do PSDB (13) e do PT (12). Assim vai, sucessivamente. O PMDB já escolheu a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), para acomodar o ex-presidente do Senado Garibaldi Alves (RN). Foi oferecida a ele a comissão que trata do Desenvolvimento Regional, para abrir a poderosa CAE à negociação, mas Garibaldi não aceitou. O DEM ficará com a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), a ser comandada por Demóstenes Torres (GO). O PSDB ficará com a CRE, para Azeredo.
Eleito com mais de 300 votos, Michel Temer tomou rapidamente as rédeas no tapete verde da Câmara (o do Senado é azul), Casa que ele já comandou em duas ocasiões. Além de convencer Edmar Moreira a renunciar e evitar que a Câmara se desgastasse ainda mais, Temer deu uma solução para a medida provisória das entidades filantrópicas, que o antigo presidente do Senado, Garibaldi Alves (PMDB-RN), num rompante, se recusou a receber - a MP foi rejeitada, seus efeitos convalidados por um decreto legislativo e o tema volta à pauta na forma de projeto de lei. Garibaldi havia transformado a crítica ao excesso de edição de medidas provisórias numa cruzada pessoal. Uma discussão que Temer pretende retomar sob um prisma mais preciso: mudar a Constituição para "diminuir o campo material de incidência de medida provisória".
No campo dos bons costumes, Temer decidiu abrir as notas fiscais apresentadas pelos deputados para justificar despesas, tornou proporcional o pagamento do deputado titular que retoma o posto, passa alguns dias na Câmara e depois volta à secretaria que ocupa no Estado e, sobretudo, adiar a votação de um projeto para aumentar salário de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e dos próprios deputados. Alegou a crise. A dúvida é até quando ele suporta a pressão de ministros e deputados.