Título: Severino decide hoje processo contra Lula
Autor: Maria Lúcia Delgado e Raymundo Costa
Fonte: Valor Econômico, 02/03/2005, Política, p. A13
Dividido entre o discurso de independência em relação ao Palácio do Planalto e a sedução do poder, que pode dar espaço político ao PP no primeiro escalão, o presidente da Câmara, Severino Cavalcanti, pode anunciar hoje qual decisão tomará sobre o pedido do PSDB para abertura de processo contra o presidente Luiz Inácio Lula da Silva por crime de responsabilidade. Não pode haver meio termo: ou Severino arquiva o pedido do PSDB, ou acata. Há, no PP, parlamentares que defendem claramente o adiamento da decisão de Severino. Acham que o presidente da Câmara só deve se pronunciar depois que Lula anunciar a reforma ministerial. O pedido do PSDB foi protocolado na sexta-feira, um dia depois de Lula ter declarado, em discurso no Espírito Santo, que recomendou a um "alto companheiro" manter sigilo sobre denúncias de corrupção no governo de seu antecessor. Severino Cavalcanti bem que tentou descobrir uma saída honrosa, sem que parecesse estar submetido às orientações e clamores do governo. Passou o dia ontem reunido com seus aliados mais próximos, como o deputado Ciro Nogueira (PP-PI), 2º vice-presidente da Casa. "Eu não sei de nada", disse Severino à imprensa, ao chegar do almoço, assustado com o cerco de jornalistas e manifestações de vários grupos contra ou a favor a votação do projeto da política nacional de biossegurança. Para evitar questionamentos de repórteres sobre o pedido do PSDB, Severino entrou na Câmara por uma passagem alternativa, cercado por seguranças. O presidente da Câmara decidiu apelar até para a experiência do antecessor, João Paulo Cunha (PT-SP), e quis ouvir a opinião do ex-presidente. João Paulo ponderou, em reunião reservada, que durante os oito anos de mandato de Fernando Henrique Cardoso vários juristas rechaçaram as tentativas políticas de investigação contra o presidente da República, alegando que só um fato concreto justificaria tal medida. O próprio PT sentiu isso na pele. Pediu abertura de processo contra FHC e o viu arquivado pelas mãos do então presidente da Câmara, Michel Temer. A tendência é que Severino Cavalcanti mande arquivar o pedido do PSDB. Se isso ocorrer, o líder tucano pode apresentar um recurso em plenário que, para ser aprovado, precisa de no mínimo 171 votos. "Não vou ficar especulando sobre hipóteses. Se o presidente Severino indeferir nosso pedido, quero saber primeiro por quais razões. Ele não pode entrar no mérito, porque isso é tarefa para o plenário. Cabe ao presidente da Câmara só recomendar o arquivamento se houver erros formais no pedido", disse Goldman. O PSDB, segundo ele, vai assinar qualquer pedido de instalação de qualquer CPI para investigar supostas irregularidades no processo de privatização do sistema Telebrás. Uma coisa é o processo de privatização, e outra, segundo o líder, é o presidente prevaricar e acobertar denúncias de corrupção. O governo alega que a oposição age eleitoralmente, e que já há diversas frentes para investigar as denúncias referentes às privatizações. "Uma coisa não tem nada a ver com outra. O PSDB assina quantas CPIs o governo quiser, onde quiserem, quantas quiserem. E não é porque alguém tem carimbo de petista ou de tucano que nós vamos esconder", disse Goldman.