Título: A hora da verdade para os grandes bancos americanos
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 25/02/2009, Opinião, p. A8

A hora da verdade se aproxima para os grandes bancos americanos. Depois de mais uma semana de quedas implacáveis nas ações do sistema financeiro, o Tesouro americano, o Fed e os órgãos reguladores do mercado apontaram na segunda-feira que os testes de estresse dos bancos começarão a ser feitos hoje. Em uma tentativa de suavizar os boatos de nacionalização iminente do Bank of America e Citibank, elas deixaram claro que a alternativa privada de gestão das instituições ainda é a preferida do governo Obama e que não faltará apoio à capitalização se e quando houver necessidade dela.

O governo americano deve assumir uma fatia de 40% do capital do Citibank, a pedido de seus administradores. O Tesouro já auxiliou o banco com US$ 45 bilhões, um valor muito acima até mesmo de seu valor de mercado, de cerca de US$ 13 bilhões e é quase certo que converterá parte desse dinheiro para se tornar o maior acionista do banco. Os mercados apostam claramente em sua nacionalização.

O fato é que os mercados continuaram nervosos com o destino dos bancos mesmo depois do anúncio tímido e incompleto, pelo Tesouro, de um plano de socorro que pode passar dos US$ 2 trilhões. O anúncio deu a ideia de indecisão do governo e da falta de clareza dos rumos a tomar, o que levou os mercados a descarregarem seu pessimismo sobre os bancos. Na verdade, é possível que o governo Obama diga uma coisa - que não aposta na nacionalização - e seja pelas circunstâncias levado a fazer o seu contrário.

As autoridades reguladoras disseram, no mesmo comunicado, que as instituições estão bem capitalizadas, o que é um exagero de otimismo destinado a se contrapor ao absoluto pessimismo dos investidores. Os testes de estresse, ressaltaram, medirá qual a capacidade de resistência dos bancos a vários cenários de deterioração da economia no futuro próximo. Com os resultados, restará ao governo duas saídas. Uma delas é bancar a conta, o que ele já vem fazendo até agora, a um preço crescente e sem efeitos muito visíveis. A opção de que o banco em questão poderá levantar mais capital via investidores privados é mais uma concessão retórica ao poder da iniciativa privada. Nesta altura, e com todas as escoras colocadas para manter o sistema bancário de pé, qualquer instituição que precise de reforço financeiro não terá um só tostão de dinheiro privado.

Como não pode mais deixar nenhuma grande instituição financeira quebrar, a outra alternativa seria a nacionalização. O governo não fechou nenhuma porta nesta questão, mas tomar os bancos em suas mãos não conta com a sua simpatia. Mas a solução faz sentido e pode ser tão dispendiosa ou necessária - tanto faz o termo, eles se equivalem - quanto as outras. Há, porém, uma diferença importante: nas operações de socorro, os acionistas estão sendo beneficiados, algo que não deverá ocorrerá com a estatização. Mesmo economistas ortodoxos e políticos republicanos já não se opõem a essa solução, inimaginável há apenas dois anos.

Os testes de estresse podem não contar toda a história, pois dependem de alguns pressupostos que nesta altura podem se revelar razoáveis ou então convenientes. Qual o possível grau de deterioração da economia americana que o balanço dos bancos teriam de suportar? Ela não parou de afundar até agora e o índice de preços das casas Case-Schiller, divulgado ontem, mostrou uma queda anual de 18,5% em dezembro, com reduções de até 33% em algumas zonas metropolitanas (o índice pesquisa as 20 principais). E, com a recessão das principais economias do mundo desenvolvido, o avanço das exportações, um dos motores possíveis para a recuperação econômica, dificilmente se concretizará.

Além disso, como avaliar centenas de bilhões de dólares em ativos tóxicos que estão na carteira dos bancos em uma situação de piora da economia? Uma das possibilidades é de avaliá-los por um valor constante e baixo -quase perda total -, já que eles caíram tanto que agora parecem pouco sensíveis a uma recessão mais forte. Em depoimento ao Congresso, o presidente do Fed, Ben Bernanke, disse ontem que a economia poderá se recuperar ainda em 2009, mas para isso depende de um grande "se": se o plano de estímulo e o de socorro aos bancos estabilizar crédito e mercados. As duas coisas levam tempo e podem não acontecer.