Título: Ânimo com maior produção de aço na China em janeiro
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 25/02/2009, Empresas, p. B6

A recuperação da produção de aço na China em janeiro, que atingiu 41,5 milhões de toneladas ou 2,4% a mais que no primeiro mês de 2008, abre novas esperanças para a industria de minério de ferro. Na mesa de negociação com as siderúrgicas para fixar o preço de 2009, o novo cenário reforça a tendência de um reajuste entre zero e menos 20%. E afugenta ameaças de uma queda de 40% defendida pela indústria do aço.

O dado da World Steel Association (Worldsteel), divulgado na sexta-feira, aponta para uma produção anualizada da China de 500 milhões de toneladas em 2009, volume projetado por mineradoras e analistas e similar às 502 milhões de 2008. Caso se confirme, esse volume vai exigir 720 milhões de toneladas de minério de ferro nos altos-fornos das usinas chinesas. Disso, estima-se que 415 milhões seriam importadas.

A informação da Worldsteel é uma boa notícia para a Vale, maior produtora de minério de ferro do mundo, que retoma com força as vendas para a China depois da parada no final do ano passado. A companhia tem embarques previstos de 30 milhões de toneladas da matéria-prima para portos chineses no primeiro trimestre, um recorde, segundo José Carlos Martins, diretor-executivo de ferrosos.

No quarto trimestre de 2008, a mineradora enviou 11,6 milhões de toneladas de minério para usinas chinesas. No terceiro trimestre, antes da crise mundial, foram vendidas 26,8 milhões de toneladas ao mercado chinês. No ano passado, a Vale forneceu 85,1 milhões de toneladas à China, ante uma previsão de 100 milhões para o ano.

As primeiras estatísticas sobre a retomada do mercado de minério poderão contribuir para sacudir um pouco as negociações de preço que estão praticamente travadas nestes 20 dias de conversas entre Vale, BHPB e Rio Tinto e as siderúrgicas da Ásia, lideradas pela China, informou uma fonte que acompanha as conversas.

Além da queda-de-braço com as siderúrgicas por causa do preço, as três mineradoras também travam um jogo de empurra-empurra entre elas para ver quem irá liderar as negociações. Martins, da Vale, disse que neste ano a mineradora brasileira não vai ser a primeira a negociar o reajuste. "Em 2008, saímos na frente e nos desgastamos porque os australianos romperam com o "benchmark" e conseguiram aumentos maiores. Este ano, vamos deixar eles negociarem primeiro e ver o que vai dar". As australianas BHPB e Rio Tinto querem deixar a Vale liderar. Argumentam que ela tem mais força no confronto por ser a maior fornecedora e liderar o mercado transoceânico.

Essa parece ser uma boa estratégia para atrasar o processo de definição que, segundo fontes de mineradoras, só devem fechar por volta de maio. Quanto mais tarde fechar, melhor para os fornecedores de minério, já que as expectativas são de aquecimento do mercado de aço com o plano Obama e com o plano de obras de infra-estrutura na China. "Não tem sentido falar em queda de 20% na média de 12 meses a partir de 1º de abril se a tendência do mercado é esquentar", avalia um executivo do setor de mineração.

A discussão do sistema de preço que vai vigorar este ano também é outro imbróglio. No ano passado, as negociações foram subvertidas após mais de 30 anos de vigor do "benchmark" (contratos com reajustes anuais). Surgiu a ideia do Index, defendido pela BHPB, que não se sabe como vai funcionar no cenário atual de incertezas. "Está tudo no ar, pois a crise chegou quando o ambiente já era confuso devido ao desentendimento entre as mineradoras. Não se sabe que sistema vai prevalecer, depois que os australianos não seguiram a Vale em 2008. As regras já não são mais tão fortes quanto no passado. Virou bagunça", critica um executivo de mineradora que não quis ser citado. Para ele, é uma questão em aberto e difícil de se equacionar.

Do lado das siderúrgicas, os chineses surgem com novidades toda semana. Querem preço 40% menor, reajuste retroativo ao início de janeiro e insinuar fixar um teto de produção para a China de 500 milhões de toneladas/ano até 2011. A medida é difícil de ser posta em prática, avaliam analistas do setor, pois significaria estabilizar o consumo de aço nos níveis atuais, ou então a demanda chinesa ser atendida por importações de aço. O Credit Suisse estima alta anual de 7% no PIB da China até 2011. Se essa proposta vingasse, o país teria de de importar 150 milhões de toneladas ao ano ou mais. Dificilmente o mundo teria capacidade para suprir, avalia o banco.

"É mais uma tentativa dos chineses de embaralhar a negociação para revertê-la a seu favor, o que fica cada dia mais difícil", avalia um interlocutor do mercado financeiro. O que poderá pesar nesta balança a favor das siderúrgicas é a situação dos mercados de aço europeu e americano, hoje com índices de ociosidade acima de 50%. Se as mineradoras insistirem num percentual de queda abaixo de 10% ou um aumento pequeno que seja, elas podem "matar sua galinha dos ovos de ouro" - as usinas de aço -, que divulgaram prejuízos e ainda enfrentam uma fraca demanda.